Julgamento de policiais prossegue hoje no Fórum da Barra Funda, em São Paulo| Foto: Marcelo Camargo /ABR

Réus

Os dois primeiros ex-detentos a depor ontem pediram para que os 24 policiais militares presentes (dois estavam doentes e não compareceram), acusados de participarem do massacre, fossem retirados da sala. As outras duas testemunhas permitiram a presença dos réus. Nenhum dos 24 réus usava gravatas. Todos vestiam camisas sociais, calças jeans ou social.

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Em depoimento ontem no julgamento de 26 dos 79 acusados pelo massacre do Carandiru, Moacir dos Santos, que era diretor da Divisão de Segurança e Disciplina da Casa de Detenção do Carandiru, disse que os policiais que chegaram naquele dia para conter a rebelião no Pavilhão 9, já "chegaram metralhando". As informações são da Agência Brasil.

"A Tropa de Choque entrou invadindo, não respeitando nem o Ubiratan [coronel Ubiratan Guimarães, comandante da Polícia Militar na época em que ocorreu o massacre do Carandiru]", lembrou Santos, em depoimento no Fórum da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo.

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O maior massacre do sistema penitenciário brasileiro ocorreu no dia 2 de outubro de 1992, quando 111 detentos foram mortos e 87 ficaram feridos durante a invasão policial para reprimir uma rebelião no Pavilhão 9 do Presídio do Carandiru (como ficou conhecida a Casa de Detenção), na capital paulista. A rebelião teria começado após uma briga entre dois detentos.

Etapas

O processo foi dividido em etapas devido ao grande número de réus. Na primeira etapa, 26 policiais estão sendo julgados por participação no massacre.

Ao juiz José Augusto Nardy Marzagão, o ex-diretor do Carandiru disse não acreditar que os presos estivessem armados na ocasião, apesar de, no final da operação, os policiais terem lhe mostrado algumas armas de fogo que disseram, naquele dia, estar no poder dos presos. "Acho improvável que aquilo fosse dos presos. Se eles tivessem (armas de fogo), eles as teriam usado", afirmou Moacir.

Depoimentos

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Também prestou depoimento ontem o preso Luiz Alexandre de Freitas, que cumpre pena há 23 anos e presenciou a ação policial. Freitas, que está em uma cadeira de rodas, disse ter escapado da morte no dia do massacre porque se escondeu embaixo de uma pilha de cadáveres. Ele também identificou, entre os réus, um policial que teria participado da ocupação do presídio.

Outro detento foi a primeira testemunha a depor ontem. Antônio Carlos Dias, que também sobreviveu ao massacre, relatou as circunstâncias em que os policiais militares invadiram o presídio e como abordaram os presos. "Se olhasse na cara do policial, eles atiravam. Eu presenciei isso", disse.

Os sete jurados que vão decidir o futuro dos PMs foram escolhidos no início da manhã. São seis homens e apenas uma mulher. Dos 26 réus, 24 estão presentes no julgamento. Na semana passada, quando o julgamento foi adiado, também faltaram dois. O júri prossegue hoje.

Policiais teriam mudado cena do crime

O agente penitenciário Moacir dos Santos, diretor da Divisão de Segurança e Disciplina da Casa de Detenção do Carandiru na época do massacre, disse no primeiro dia do julgamento que a cena do crime foi modificada pelas autoridades e que ele e outros agentes chegaram a ser ameaçados com revólveres para não testemunharem as atrocidades contra os detentos.

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Segundo contou, durante as quatro horas depois da chacina, autoridades policiais se organizaram para remover os corpos fuzilados de dentro das celas. Dessa maneira, seria mais difícil para a perícia investigar e colher provas na cena do crime. "As autoridades queriam despistar jornalistas e familiares de presos porque era véspera de eleição", disse o diretor.

O perito Osvaldo Negrini Neto, que também prestou depoimento ontem, contou que precisou entrar escondido na cena do crime, no carro de um delegado. "Os militares disseram que não havia campo para a perícia." Depois, quando passou a fazer o trabalho da perícia, o "local dava nítida sensação de ter sido violado", desse o perito.

Nos depoimentos das testemunhas, os promotores Fernando Pereira da Silva e Márcio Friggi tentaram mostrar aos jurados que os PMs não agiram em legítima defesa nem cumpriram o estrito dever legal ao longo da operação. Por outro lado, a advogada de defesa dos policiais, Ieda Ribeiro de Souza, vai tentar desqualificar a apuração das provas feitas no processo e apontar a impossibilidade de individualizar as ações. Segundo ela, como não foi feita perícia das armas, não se pode apontar as autorias dos disparos.