Brasília O corregedor do Senado, Romeu Tuma (PMDB- SP), vai investigar as denúncias da revista Veja de que o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) teria utilizado recursos da construtora Mendes Júnior para pagar parte de suas despesas pessoais. Tuma já pediu que o discurso de defesa de Renan e os documentos apresentados pelo senador na tribuna do Senado sejam encaminhados para análise da Corregedoria.
Ao fim das investigações, Tuma pode arquivar o caso ou encaminhar as denúncias à Mesa Diretora do Senado. A partir daí, a denúncia segue para análise do Conselho de Ética da Casa. "Vou ter que ouvir pessoas citadas na matéria. O depoimento dele (Renan) foi correto, buscou responder a todas as acusações", disse.
Além das investigações na Corregedoria, o Conselho de Ética pode iniciar uma investigação contra Renan se for provocado por um partido político ou parlamentar. Nenhum dos senadores sinalizou, no entanto, qualquer disposição de ingressar no conselho com representação contra Renan.
O deputado Chico Alencar (PSol- RJ) disse que o partido estuda ingressar com representação contra Renan no Conselho. Alencar adiantou que a ex-senadora Heloísa Helena (PSol-AL) vai discutir essa possibilidade nesta semana, durante passagem por Brasília.
Emoção
O presidente do Senado apelou ontem para a emoção ao rebater as acusações de que receberia R$ 16,5 mil mensais de um lobista para pagar despesas particulares com uma filha de um relacionamento extraconjugal. "Estou me defendendo de um pseudo-escândalo sobre a minha vida pessoal", afirmou. Munido de diversos documentos, ele foi ao plenário acompanhado pela mulher Verônica Calheiros e durante todo o discurso de defesa alegou que as denúncias tratavam apenas de questões privadas.
As suspeitas contra o senador foram levantadas na última sexta-feira pela revista Veja. A reportagem aponta que o peemedebista recebia dinheiro do assessor da diretoria de Desenvolvimento da Área de Tecnologia da construtora Mendes Júnior, Cláudio Gontijo. O lobista seria o responsável pelas despesas de R$ 4,5 mil com o aluguel de um apartamento de quatro quartos em Brasília para a jornalista Mônica Veloso, mais R$ 12 mil de pensão para a filha que Calheiros teve com ela.
De cara, o senador admitiu a relação com a jornalista e pediu desculpas à mulher Verônica e aos filhos. Ele lamentou ter de tratar o fato publicamente. "É algo que só se deveria fazer no confessionário, para pedir perdão e fazer penitência. Infelizmente minha defesa será aqui."
Calheiros admitiu a amizade com Gontijo, que teria começado há mais de 20 anos, antes que ele trabalhasse para a Mendes Júnior. "Peço desculpas pela exposição de seu nome", declarou. O senador afirmou que o amigo ajudou na negociação sobre os valores de pensão com a amante Mônica.
Gontijo teria sido escolhido como interlocutor porque também era amigo da jornalista. O presidente do Senado frisou que o dinheiro saía apenas do seu bolso. "Não misturo público com privado. Não tenho nenhuma relação com a construtora Mendes Júnior. Não tenho relação com os administradores desta empresa, mas lamento o constrangimento."
Calheiros apresentou documentos, principalmente de comprovação de renda, que teoricamente mostram que ele tem condições de arcar com as despesas. Segundo a reportagem, seria quase impossível pagar os R$ 16,5 mil mensais, já que o salário de senador é de R$ 12,7 mil. "Honrei com meus próprios recursos as despesas. Minhas declarações de renda são entregues anualmente ao Senado Federal, tudo compatível com minha renda", justificou.
O senador acrescentou ainda outros dados à polêmica. "Prestei assistência à gestante no valor de R$ 8.000 até o reconhecimento da paternidade." Além desses gastos, ele teria dado à amante R$ 100 mil como uma espécie de fundo de despesas futuras com a criança, principalmente com educação. Os dados dos documentos, no entanto, não batem com os que foram apresentados pela reportagem da revista. E ainda deixam em aberto outras questões envolvendo sua relação com alguns dos presos no escândalo da máfia das obras.
Nos documentos apresentados ontem por Renan, nenhum valor diz respeito ao período pré-reconhecimento da filha do início de 2004 até novembro de 2005. O senador não entregou nenhum documento que garanta que os recursos que foram repassados à jornalista nesse período tenham sido, de fato, pagos com recursos próprios. O advogado de Mônica Veloso, Pedro Calmon, disse que antes do reconhecimento da paternidade, em dezembro de 2005, a jornalista recebeu o valor da pensão e do aluguel em dinheiro, entregue por Gontijo. Mônica negou ser amiga do empresário.
Particular
Ao fim do discurso, Calheiros voltou a lamentar o uso de um problema particular como denúncia política. "Regredimos. Há 2 mil anos a política era feita de casos pessoais, quando os senadores de Roma tinham seus supostos crimes pichados pelas paredes da cidade."
O senador falou por pouco mais de 30 minutos e, quando terminou as declarações, teve de suspender a sessão para poder receber os cumprimentos dos colegas. Entre os primeiros a saudá-lo estava o também senador alagoano Fernando Collor de Mello (PTB), adversário regional de Calheiros.
Depois de aproximadamente 10 minutos de apertos de mão e abraços, o presidente do Senado deixou o plenário confiante de que o assunto seria encerrado. E, simbolicamente, abraçado à mulher Verônica.
Alívio
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou aliviado com o discurso feito ontem pelo presidente do Senado, de acordo com informações de assessores do Palácio do Planalto. Entre uma reunião com representantes de empresas aéreas e um encontro com a comissão organizadora da unificação das centrais sindicais, em São Paulo, Lula quis saber de auxiliares como tinha sido o desempenho de Renan.
Informado de que o senador fizera um discurso emocionado, com pedido de perdão para a mulher e filhos e reconhecimento de que tem uma filha de três anos fora do casamento, que Renan distribuíra dezenas de documentos a respeito da menina e de sua declaração de Imposto de Renda, Lula teria dito "muito bem", de acordo com assessores do Planalto.