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Personagem

Um estaleiro na sala de estar

Em 1781, a embarcação britânica HMS Agamemnon terminava de ser construída pelo engenheiro naval Henry Adams, na Inglaterra. Tinha cerca de 49 metros de comprimento. Mais de dois séculos depois, uma réplica perfeita do navio era concluída pelo comerciante – e artista – Franklin Delano Hojda, em Curitiba. Apesar de não ter mais de dois metros da popa à proa, o barco de Hojda é praticamente idêntico àquele comandado pelo capitão Horatio Nelson, maior herói inglês dos mares, nas batalhas contra as esquadras napoleônicas.

O paulista Hojda, de 59 anos (há 16 em Curitiba), não sabe dizer como começou sua paixão pela construção de modelos náuticos. Mas a primeira demonstração do talento ainda está conservada: uma réplica das caravelas portuguesas, feita durante uma aula de artes, em 1958, quando ele tinha 11 anos. Mais tarde, na adolescência, Hojda se interessou por barcos radiocontrolados, que projetava, construía e pilotava. Aos 39 anos, começou a velejar, o que fez até os 50, quando já construía as primeiras réplicas de fragatas, galeões e outras embarcações históricas.

Para chegar próximo à perfeição em seus modelos, Hojda fez cursos de arquitetura e desenho navais por correspondência, com material vindo do exterior. Graças ao conhecimento adquirido, ele consegue partir das plantas originais e fabrica cada uma das peças – que podem chegar a 6 mil, em um único barco. A imagem de Júpiter que decora a proa da réplica de uma fragata de 1760, por exemplo, foi criada a partir de um pé de cadeira. "Não é como um kit que vem com as partes prontas e é só montar", diz.

Hojda explica que, antigamente, eram os reis que tinham de aprovar o projeto da embarcação. Por isso, antes de se construir um navio, fazia-se uma maquete quase perfeita para merecer a sanção real. Muitas dessas maquetes centenárias ainda existem, nos seus países de origem. "Em minhas viagens ao exterior, sobretudo pela Europa e EUA, visito museus navais e compro livros e plantas dessas embarcações", conta.

Ao longo dos últimos dez anos, Hojda fez 17 réplicas de barcos, as quais não vende por preço nenhum. "Já me fizeram propostas, mas minhas peças são únicas. Considero-as obras de arte e, como tal, não têm preço", diz. Ele conta que os barcos demoram, em média, 12 meses para ficarem prontos, e consomem de 3 mil a 4 mil horas de trabalho. No exterior, réplicas menores que as feitas por Hojda chegam a valer cerca de US$ 50 mil. Cuidadoso, ele, que tem duas netas pequenas, mantém as crianças a uma certa distância dos barcos. "Criança olha com as mãos e isso é um perigo", diz.

A semelhança das réplicas feitas por Hojda com as embarcações de verdade impressiona e é impossível ficar indiferente aos detalhes, como os minúsculos nós nas cordas que prendem as velas, feitos de acordo com o estilo utilizado na época. "O pessoal que gosta desse tipo de coisa fica alucinado. Até eu, quando olho para os barcos, fico sem saber como fiz aquilo", conta.

Sobre o estilo de embarcações que faz, o artista diz preferir as dos séculos 17 a 19, de construção mais rebuscada. "Era a época de grandes batalhas, conquistas e heróis", justifica. Mas alguns vapores do início do século 20, como o Earl Sigurd, cuja réplica ele ostenta em sua sala de jantar, também são objetos de sua arte. "Mas só aqueles antigos, que soltam fumaça preta", conta, rindo.

Até pouco tempo, Hojda mantinha suas réplicas em uma sala de sua loja de discos e equipamentos de som antigos, no centro da capital paranaense. No entanto, a insegurança o fez levar seus barcos para casa. "Uma boate funciona em cima da minha loja. E se acontece um incêndio, por exemplo? O meu negócio eu reconstruo quantas vezes for preciso. Mas os meus barcos não", diz. Apenas uma embarcação continua na loja, em cima da mesa onde Hojda faz sua arte. Isso porque está há um ano parada. "Uma hora termino aquele", revela Hojda.

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