Dados divulgados ontem pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que o Judiciário brasileiro ainda tem dificuldades para cumprir metas de produtividade. Ano passado, os juízes deixaram de julgar quase 1 milhão de processos iniciados em 2010, descumprindo a principal meta estabelecida. Esse total vai se somar aos mais de 86,5 milhões de processos acumulados. Outro ponto importante a ser cumprido era a diminuição em 2% de despesas de custeio, contudo, houve aumento de 17%. O Paraná aparece, de forma geral, abaixo da média.Os cerca de 700 juízes de primeiro grau do Paraná e os 120 desembargadores do Tribunal de Justiça (TJ) cumpriram apenas 85% da meta principal. Segundo o CNJ, no item 2 que previa o julgamento dos processos anteriores a 2007 e 2006 o estado cumpriu somente 38%, ficando na 19.ª posição do ranking nacional nesse quesito. Na meta que previa a publicação dos acórdãos em até 10 dias depois das sessões de julgamento, o estado alcançou apenas 15%. Além disso, os tribunais paranaenses não implantaram nenhum método de gestão de processos de trabalho.
Assim como no Paraná, a Justiça dos demais estados apresenta, em geral, problemas semelhantes em relação ao desempenho e ao volume de processos. De acordo com a pesquisa, os tribunais superiores foram os mais eficientes no julgamento dos processos em 2010, cumprindo 112,6% da meta, portanto, analisaram processos entregues no ano passado e em anos anteriores. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) teve o melhor desempenho, com 119,3%.
No julgamento de processos anteriores a 2007 e 2006, por exemplo, houve cumprimento médio nacional de 44%, mas nos tribunais superiores o índice chegou a 87%, enquanto na Justiça Estadual o porcentual foi de 39%.
Já o aumento de 17% nas despesas de energia elétrica, telefone, papel, água e combustível ao contrário da redução de 2% pre-estabelecida foi provocado, segundo o estudo, pela Justiça Eleitoral, responsável pelas eleições.
Outras metas
Entre os objetivos do CNJ também estavam a ampliação do acesso à internet, a realização das comunicações por meio eletrônico e a oferta de cursos de aperfeiçoamento profissional. Nenhuma delas foi cumprida integralmente. A Justiça do Trabalho e a Justiça Eleitoral foram as que melhor cumpriram os indicadores estabelecidos.
Durante apresentação dos dados, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, saiu em defesa do Judiciário. Argumentou que os números não podem ser analisados friamente e, indiretamente, também responsabilizou o Poder Executivo pelo desempenho da Justiça. "Não é possível considerar os números de modo absoluto. É preciso perceber como eles espelham um trabalho que eu diria extraordinário da magistratura brasileira e a tentativa de resolver problemas que são praticamente insolúveis em curto prazo, que não dependem apenas do esforço da magistratura, mas dependem de condições materiais nem sempre presentes e cuja responsabilidade não é do Poder Judiciário", disse.
Peluso ainda criticou a imprensa. "Não se pode ouvir passivamente aquilo que a opinião pública, mediante a mídia, pensa do Judiciário. É importante explicar para a opinião pública o que esses números significam no sentido de trabalho e dedicação." A corregedora nacional de Justiça e ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon, reforçou a crítica. "Nós precisamos calar a imprensa sobre o que vem se falando do Judiciário, mas, para isso, não bastam palavras, é preciso atitude."
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Paraná informou que o juiz auxiliar gestor das metas estava em Brasília no CNJ. A assessoria afirmou que, segundo o magistrado, alguns dados publicados pelo CNJ estão desatualizados.
Escolha de metas deve ser criteriosa
Para especialistas, as metas criadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) são positivas, mas o estabelecimento delas deve ser criterioso para que não haja uma oposição entre quantidade e qualidade. Boa parte dos magistrados reclama desse tipo de avaliação por desempenho porque, muitas vezes, o andamento dos processos não depende exclusivamente da vontade pessoal do juiz.
O presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Gil Xavier Fernandes Guerra, afirma que as metas acabam tendo uma finalidade populista. Ele acredita que a melhora no Judiciário ocorrerá com ampliação de orçamento e investimentos. "A responsabilidade pelo descumprimento é posta no juiz, mas a magistratura não aceita mais a culpa."
O cientista político Frederico de Almeida, professor da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, afirma que os indicadores foram estabelecidos há pouco tempo e, portanto, não se tinha clareza se eram alcançáveis. "É importante trabalhar com metas, mas o Judiciário não pode ser uma linha de montagem porque o que está em jogo é o direito das pessoas."
Segundo o professor da Escola da Magistratura do Paraná e doutor em Direito Fernando Knoerr, o próprio CNJ considera o cumprimento de algumas metas impossível. "Existem causas que fogem do controle do juiz e fazem com que o processo se estenda, como as provas periciais, por exemplo." Para ele, a não-realização dos indicadores não-significa que a Justiça está deixando de progredir. Knoerr acredita que o CNJ deve instituir metas, mas também precisa respeitar a autonomia do Judiciário.