Lições
O estudo da London School of Economics apresenta os quatro principais pontos para a promoção do bem-estar dos habitantes de grandes metrópoles:
Saneamento básico
Pesquisas mostram que a existência de água potável e saneamento básico pode reduzir de 20% a 82% o índice de mortalidade infantil de uma cidade. Porém, políticas de saneamento devem levar em conta aspectos culturais, sociais e econômicos da população. Em Mumbai, Índia, uma ONG construiu 16 banheiros públicos em praças e ambientes coletivos e, ao redor desses espaços, implantou serviços voltados à população, como salas de recreação para crianças e cursos de computação. Isso fez com que os banheiros se mantivessem lugares seguros e fossem efetivamente usados pela população.
Ambiente urbano
O ambiente urbano tem potencial tanto para inibir quanto encorajar atividades físicas o que ajuda a combater obesidade, doenças do coração, diabete e câncer. Em metrópoles como Shangai e Berlim, que apresentam boas colocações no ranking de bem-estar da LSE, 25% e 8% da população, respectivamente, utilizam bicicletas para ir até o trabalho.
Habitação
Habitações inadequadas estão diretamente relacionadas a acidentes e doenças como pneumonia e bronquite. Programas habitacionais, porém, devem considerar as peculiaridades do público que pretendem atingir. O exemplo, dessa vez negativo, vem novamente de Mumbai. Famílias de um assentamento próximo a uma vila de pescadores, que viviam da venda de cestos feitos de varas de bambus, foram levadas para apartamentos novos. Lá elas não tinham espaço ou matéria-prima para criar seus produtos de sustento e estavam longe de possíveis compradores.
Espaço verde
Pessoas que vivem em grandes cidades são mais propensas a apresentar doenças psicológicas, como depressão e esquizofrenia, pela alta exposição ao estresse. Estudos comprovam que a convivência em áreas próximas à natureza reduzem significativamente esse estresse diário. Em Hong Kong, parques urbanos são muito frequentados por idosos, que os utilizam para praticar tai chi ou fazer caminhadas.
"Tivemos de urbanizar 150 milhões de habitantes em menos de 40 anos, sem os recursos de países desenvolvidos. Fizemos muitos improvisos."
Luiz Henrique Cavalcanti Fragomeni, urbanista e professor da Universidade Federal do Paraná
Apesar de estarem à frente das metrópoles de países como Bolívia, Índia e África do Sul, as grandes cidades brasileiras ainda amargam uma distância quilométrica em relação a centros urbanos desenvolvidos na Europa e na Ásia quando o assunto é bem-estar e qualidade de vida. O estudo Cities Health and Well-Being, produzido pelo projeto Urban Age, da London School of Economics (LSE), coloca pela primeira vez lado a lado 129 regiões metropolitanas de todo o mundo e evidencia as dificuldades de nações em desenvolvimento em aliar crescimento habitacional com bons indicadores de saúde.
No ranking produzido pela LSE, prestigiada instituição de ensino superior de Londres, nenhuma região metropolitana brasileira figura entre as 50 mais desenvolvidas do mundo, levando-se em conta índices como mortalidade infantil, expectativa de vida e número de médicos e leitos por habitante. Entraram no estudo as oito maiores regiões metropolitanas do Brasil em número de habitantes: Fortaleza, Belo Horizonte, Recife, Brasília, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba.
A capital paranaense, ao lado dos municípios vizinhos, aparece na 68ª colocação, com um índice de 0,59 (a escala varia de 0 a 1 e quanto mais próximo de 1, melhor a qualidade de vida da população na região). Em primeiro lugar estão as metrópoles da chamada Ásia rica: Hong Kong, Osaka e Tóquio.
O estudo discute uma dicotomia que hoje é típica nas grandes cidades: ao mesmo tempo em que concentram ambientes propícios ao bem-estar de sua população, podem ser o gatilho para uma série de problemas de saúde. Relação que, a cada década, precisará ser mais bem balanceada, em todo o globo. A previsão é que, em 2050, 70% da população mundial viva nas cidades, aumentando ainda mais a demanda por serviços e equipamentos urbanos. Hoje, 600 metrópoles são responsáveis por 60% do Produto Interno Bruto (PIB) global, embora concentrem apenas um quinto dos habitantes do planeta.
Fenômeno recente
Para o urbanista e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Luiz Henrique Cavalcanti Fragomeni, a má colocação das metrópoles brasileiras no ranking é fruto de um processo recente de urbanização, que ainda está em andamento. "Tivemos de urbanizar 150 milhões de habitantes em menos de 40 anos, sem os recursos de países desenvolvidos. Fizemos muitos improvisos", lembra Fragomeni.
A falta de políticas adequadas de planejamento para regiões metropolitanas, ainda hoje, cria um cenário comum em todo o país: a existência de uma "cidade-sede", que concentra investimentos, oferta de empregos e disponibilidade de serviços, ao lado das chamadas "cidades-dormitórios", onde vivem os trabalhadores desse município principal. "As políticas metropolitanas favorecem a cidade-sede, de maneira geral. No fim, as decisões são pouco deliberativas. E isso certamente ocorre tanto em Curitiba quanto em São Paulo ou Porto Alegre", afirma o professor do mestrado e doutorado em Gestão Urbana da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) Tomás Moreira.
Grande Curitiba tem cenários desiguais
Formada por 26 municípios, a Região Metropolitana de Curitiba (RMC) agrega hoje cerca de 3,1 milhão de habitantes, que se aglomeram em torno da capital do estado. A mistura, assim como em outras regiões metropolitanas do país, não é nada homogênea. Num mesmo espaço geográfico, a RMC integra cidades que estão tanto no topo quanto na base do ranking dos municípios mais desenvolvidos do estado, segundo o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFMD). Enquanto Araucária e São José dos Pinhais, por exemplo, figuram entre as cidades com maiores índices de desenvolvimento, Cerro Azul e Doutor Ulysses amargam as últimas colocações.
Esse cenário desigual parte, segundo especialistas, da incapacidade do poder público em atender de maneira organizada e uniforme à região. De fato, o órgão responsável por planejar a RMC, a Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec), pode fazer somente isso: planejar. Implantar, efetivamente, os projetos concebidos é outra história.
"A governabilidade da região é muito difícil. Hoje, temos de contar com a boa vontade dos prefeitos e aí entram questões políticas", reconhece o coordenador da Comec, Rui Hara. "É muito complicado fazer com que 26 municípios falem a mesma língua".
Para o professor de Planejamento Urbano Rivail Vanin de Andrade, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Positivo, o desenvolvimento da RMC e de outras regiões metropolitanas do país esbarra justamente na falta de um ente federativo que concentre a tomada de decisões. "Essa relação de força entre o município mais forte e o mais fraco acaba criando ilhas de qualidade de vida e concentração de renda", explica Andrade.
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