Um lembrete ao pai cioso que vê o filho adolescente passar horas seguidas com o controle do videogame na mão: seu próprio pai via a mesma inutilidade enquanto você ouvia seus discos de rock. Obviamente ele estava errado, assim como você está hoje. Analistas do mundo digital têm construído um consenso sobre as potencialidades do jogo eletrônico para o comportamento humano. A tarefa, porém, é tão árdua quanto atravessar os mundos do Super Mario sem perder nenhuma vida.
O maior segmento da indústria do entretenimento, com R$ 105 bilhões de faturamento em 2012, ainda não conquistou o mesmo glamour do cinema ou da literatura como forma de arte ou como instrumento de desenvolvimento humano. A designer de games norte-americana Jane McGonigal, em seu livro A Realidade em Jogo Por que os games nos tornam melhores e como eles podem mudar o mundo (Editora Best Seller), qualifica o seu produto no segundo grupo. Ela argumenta que os games contribuem para desenvolver uma atitude positiva em relação à vida. "Não existe a frase eu não consigo no mundo dos games", lembra.
Estímulos
Um jogador vive momentos extensos de alta concentração, em que precisa aliar raciocínio rápido a habilidades manuais. É forçado a manter o controle ante a adversidade. Tem a capacidade de identificar sentido em todas as suas ações, e é imediatamente recompensado pelo esforço (pontos, vidas, mudanças de fase). Um comportamento que, segundo a autora, pode ser transferido para o mundo real. Ao desenvolver pesquisas práticas transformando problemas reais em games, ela percebeu estímulo constante dos usuários e grande capacidade colaborativa.
O desenvolvedor de jogos Rafael Dubiela, professor das universidades Positivo e Federal do Paraná, lembra que a estratégia é usada para criar materiais didáticos mais envolventes, com resultados positivos comprovados. "O jogo é uma atividade humana que busca simular a realidade, e tem o caráter de responsabilidade social que for dado a eles", defende. Mas pesquisadores como Jane McGonigal vão além das transposições pedagógicas, e acreditam que mesmo os títulos comerciais, dedicados basicamente ao entretenimento, são uma influência positiva.
O mecanismo que torna os games tão viciantes é chamado pelos desenvolvedores como "level design". É a capacidade do programa em oferecer desafios estimulantes em todas as etapas a partir de cálculos sobre o desenvolvimento da habilidade do jogador. "Sempre existe algo importante e específico para ser feito. O jogador sempre está prestes a salvar o mundo. Por isso, ele é mais feliz se esforçando em algo do que relaxando", acentua McGonigal.
Luiz Augusto Pelisson, professor do Departamento de Informática da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, percebe semelhanças entre o ambiente virtual e o profissional. "O jogador aprende com o erro. É instigado a voltar e refazer, percebendo onde pode melhorar e qual a melhor forma de vencer o obstáculo. Algo semelhante nos é exigido no mundo do trabalho."