Pouco mais de dois anos depois do lançamento da primeira Unidade Paraná Seguro (UPS), o programa considerado a principal política de segurança pública do estado vive tempos de incertezas. Oito das dez UPS de Curitiba não passam de uma base, dentro da qual um policial militar permanece, enquanto uma viatura patrulha os arredores. A estrutura enxuta tem provocado resultados aquém do esperado: após o impacto inicial do lançamento das unidades, os índices de criminalidade nas áreas de abrangência do programa voltaram a subir, a ponto de alarmar a própria Polícia Militar (PM).
Um memorando interno (n.° 91/14), expedido na última semana de maio pelo Subcomando da PM e obtido pela Gazeta do Povo, determina aos batalhões operacionais que realizem "operações pontuais de combate à criminalidade" nas áreas de UPS. Na justificativa, o subcomandante, coronel Péricles de Matos, ressalta que "indicadores apontam uma elevação nos crimes praticados nas áreas de UPS" e que há necessidade de "reavivar a sensação de segurança" nessas localidades. Oficialmente, os dados ainda não foram publicados.
A Gazeta do Povo visitou as dez UPS de Curitiba. Em seis delas, o panorama é o mesmo: as unidades funcionam em módulos brancos de chapas de aço revestidas que lembram contêineres. Dentro, a humildade da estrutura beira a precariedade. Na maioria dos casos, os poucos móveis foram levados dos batalhões, pelos próprios policiais ou ainda doados pela comunidade. Na UPS da Vila Osternak, por exemplo, não há sequer telefone. Os policiais se comunicam com a companhia exclusivamente por um rádio comunicador.
Outras quatro UPS até funcionam em prédios de alvenaria, mas duas delas sofrem com as mesmas condições simplórias e a falta de efetivo. Na Vila Trindade, o computador não está ligado ao sistema da PM. Só há conexão com a internet porque um soldado levou um modem 3G da própria casa.
Oficialmente, os policiais que trabalham no programa reproduzem o discurso oficial de que as UPS reforçaram o elo com a comunidade. Mas, sob a condição de não serem identificados, dizem o que realmente pensam do programa. Sem autorização para saírem da base, revelam que pouco podem fazer pela população.
"Se esfaquearem alguém aqui na frente, eu não posso sair para atender. Eu tenho que ligar para o 190 e acionar uma viatura. Eu fico frustrado de ter me formado pra atuar num programa de mentira", disse um soldado.
Desta forma, o trabalho policial se restringe à orientação. Os policiais também lançam dúvidas sobre o relacionamento com a comunidade, já que apenas uma viatura circula por uma área ocupada por dezenas de milhares de moradores. "Relação com a comunidade, só quando algum morador vem até aqui. Eles até vêm bastante, mas sabem que não tem muita coisa que a gente possa fazer", ponderou um soldado.
Muitos moradores sentem-se inseguros
A duas quadras da UPS da Vila Osternak, no Sítio Cercado, os moradores enumeram os assaltos ocorridos nos últimos dias. No domingo retrasado, adolescentes usaram um carro roubado para destruir a porta de uma loja de produtos eletrônicos. O estabelecimento foi saqueado. "Aqui, a gente tenta cuidar um do outro, mas os casos só aumentam. Anteontem foi a padaria. Semana passada, meteram a faca na minha mãe para levar o celular dela", conta o dono de uma loja de som automotivo.
Enquanto uns se queixam, outros avaliam que a sensação de segurança aumentou. Uma senhora evangélica diz que é possível ir ao culto à noite sem preocupação, na Vila Nossa Senhora da Luz. Uma funcionária de bar, na Vila Trindade, destaca que já não passa o cadeado no portão. Apesar disso, a população defende que outros serviços públicos também precisam chegar aos bairros.
"Se não tiver igualdade, só polícia não vai resolver. O pobre é tratado como cachorro, então, muitos acabam se revoltando e caindo para o lado errado. Quem subiu não pode se esquecer de quem está por baixo", diz a catadora de recicláveis, Geni Alves, 48 anos.
Para os moradores, o tráfico de drogas continua sendo o principal problema. Segundo eles, após a instalação das unidades, o "movimento" diminuiu, mas, com o passar do tempo, os criminosos voltaram à ativa, sob conivência das autoridades. "Sempre vai ter tráfico, porque a Duster [marca da viatura] só passa para arrecadar", conta um taxista aposentado. Policiais ouvidos negam quaisquer atos de corrupção.
Exceções, Uberaba e Parolin têm mais estrutura
Duas das dez UPS de Curitiba a do Uberaba e a do Parolin se destacam por estarem acima da média. Ambas têm melhores condições estruturais e com efetivo mais robusto.
Primeira unidade a ser implantada, a UPS do Uberaba mantém nas ruas sete viaturas e seis motos, patrulhando em tempo integral. Quando a reportagem visitou a sede em um prédio de dois andares, cedido pela prefeitura , havia nove policiais em atividade.
O sargento Rudson Lobo Pedreti diz que a equipe conseguiu baixar consideravelmente o número de homicídios e de roubos, ambos majoritariamente ligados ao tráfico de drogas. Em contrapartida, aumentaram as ocorrências relacionadas a furtos. "O trabalho dá resultado. Nosso principal termômetro é a própria comunidade, que apoia o que temos feito", assevera.
A outra exceção é a UPS do Parolin, que ocupa uma sede de alvenaria, na Praça Afonso Botelho. A unidade tem três viaturas em tempo integral e chega a prestar reforço no bairro Rebouças. Com isso, o sargento Edis Carlos Rodrigues afirma que foi possível estabelecer um vínculo, principalmente com moradores de áreas mais vulneráveis. "Está para haver um aumento de efetivo e de viaturas. Com isso, poderemos dar uma resposta mais imediata às demandas da população", observa.
Para você, a iniciativa funciona para conter a criminalidade nos lugares mais perigosos do estado?Deixe seu comentário abaixo e participe do debate.