Em casa
Pais não devem corrigir filhos de bate-pronto
Se o seu filho fala: "Pai, me empresta dois real", você não deve corrigi-lo imediatamente dizendo que ele falou errado ou que ele não sabe falar. "Isso não funciona. Quem faz isso, seja o professor ou o pai, simplesmente cala a boca da criança e não dá a ela chances de internalizar o porquê falou daquela maneira", explica o linguista Ataliba de Castilho.
O ideal, segundo ele, é pegar uma revista, livro ou jornal que tenha a escrita "dois reais" e levar para a criança e questioná-la sobre a diferença de ela dizer dois real e estar escrito dois reais. "Só assim, ela vai começar a entender as regras, porque ela mesma a constrói. Isso é formar cidadãos mais críticos e não pessoas que obedecem simplesmente porque alguém disse que era daquele jeito", explica Castilho.
Castilho acredita que as crianças dizem não gostar de português, de um modo geral, porque muitas vezes os adultos dão a elas respostas a perguntas que não fizeram. "O ideal é não deixá-las na posição defensiva, achando que serão sempre corrigidas, mas fazendo com que elas participem da discussão das regras." Ele lembra ainda que, por causa da internet, nunca se escreveu tanto como agora e que este é um bom momento para se explorar mais a língua.
"Ninguém vai chegar na Praça do Gaúcho [reduto de skatistas de Curitiba] dizendo colega, estou aqui para lhe propor..." É com esse tipo de exemplo que a professora de Língua Portuguesa Vera de Fátima Ferraz e Paula, do Colégio Estadual do Paraná, começa a trabalhar com os alunos a variação linguística. Para fazer com que os estudantes realmente se interessem em aprender a norma culta, Vera leva para a sala de aula o cotidiano deles, que frequentam a praça e dizem "cara, como vai as coisa, que irado." "Faço isso para que eles tenham consciência de si mesmos. É para perceberem o que falam e o que é norma culta. Assim eles aprendem a usar melhor a língua, dependendo da ocasião que estão", afirma.
Vera lembra que é importante se pensar a língua assim como quando se elege uma roupa a usada em uma formatura é diferente da que se escolhe para andar no parque ou ir no bar com os amigos. "O aluno não vai querer aprender o uso culto se isto parecer desimportante para ele. Por isso nós professores precisamos fazer as comparações para eles conseguirem perceber os erros. E, acredite, eles vão automaticamente se corrigindo."
Em um trabalho sobre o livro Inocência, de Visconde de Taunay, a professora lembra que os alunos tiveram dificuldades de entender o dialeto sertanejo. Assim como alguns não compreenderam que um palavrão, no meio de uma poesia, é licença poética. "Se você trabalhar só norma culta, unicamente, o aluno vai ter dificuldades para entender outros contextos. É preciso transitar pelas linguagens."
Por outro lado, Vera, que tem 26 anos de magistério diz acreditar que o professor, principalmente novo, pode ter dificuldades em ensinar as diferenças. "É claro que depende do trabalho que a escola faz."
Experiências
No Colégio Integral, de Curitiba, o professor do ensino médio Claudio Hess é conhecido como o "Claudião, 100% de gramática." Ele é o responsável por fazer com que os alunos gostem da norma culta e enfrenta desafios em uma turma onde cada um tem um jeito de se expressar. "Todo professor precisa contextualizar os usos da língua. Fazemos isso o tempo inteiro e, no primeiro ano do ensino médio, quando temos um conteúdo específico sobre isso, trabalhamos as variações. Mas, como cada aluno traz para a sala a sua norma, o professor tem que trabalhar a norma culta", explica.
Na hora de conversar com os alunos, Hess conta que eles falam muitas gírias, as quais ele não corrige nessa interação, contudo, nas aulas, sempre deixa bem claro o que é possível usar nas redes sociais, na conversa com o amigo e num texto formal. "Na prova, eles sabem que desconto erros de português. Por isso diferenciam muito bem a norma-padrão da linguagem coloquial. Nunca peguei um tá ligado na prova", diz.
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