A recente decisão do governo de tornar a vacinação contra a Covid-19 obrigatória para crianças trouxe à tona o medo do avanço do poder público sobre as relações familiares de pais e filhos. A determinação passou a valer no dia 1º de janeiro e prevê punição às famílias que não levarem a criança para ser imunizada, como multa e perda de benefícios sociais como o Bolsa Família.
A obrigatoriedade da vacinação foi defendida pela conselheira tutelar Fabiana Dallagnolo, que atua na cidade de Jaraguá do Sul (SC) sob a alegação de que a vacinação seria um direito das crianças e que, por isso, deveria ocorrer “independente do desejo do pai e da mãe”.
“Está expressamente descrito no artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de direito à vida e à saúde, em que aquela criança ou adolescente não é uma propriedade do pai e da mãe. Ele é um sujeito de direitos, e é nessa lógica que a gente entende que quando a vacina é obrigatória precisa ser feita independente do desejo do pai e da mãe”, disse a conselheira em entrevista a uma rádio da cidade na quinta (25).
A tentativa de criminalizar pais ou responsáveis pela recusa em vacinar crianças não é justificada pela ciência, segundo especialistas. Isso porque não há um consenso na comunidade médica da necessidade de vacinação contra a Covid-19 em crianças, já que são consideradas um grupo de baixo risco.
Fabiana Dallagnolo afirmou ainda que os órgãos de saúde têm o dever de informar ao Conselho Tutelar quando uma família se recusa a permitir a imunização dos filhos. Os conselheiros então entram em contato para entender o motivo e, posteriormente, apresentar uma representação ao Ministério Público e à Vara da Família.
A conselheira sustenta que embora os pais sejam os responsáveis pelos filhos até os 18 anos, não podem tomar decisões que afrontem determinações “coletivas” ou do governo. “[A criança] não é propriedade dos pais no sentido de que ‘eu tomo as decisões sobre ele acima de decisões que sejam, inclusive, coletivas como é o caso das vacinas. [O governo] pode tomar decisões, [a criança] é um sujeito de direitos alçado a esse status pelo ECA”, ressaltou.
A fala da conselheira foi bastante criticada nas redes sociais e por parlamentares em Brasília. A deputada federal Caroline de Toni (PL-SC), que prometeu propor um projeto de lei na volta do recesso parlamentar em fevereiro para sustar os efeitos do artigo do ECA. Para ela, os pais estão, sim, protegendo os filhos quando questionam os efeitos das vacinas.
“Com esse tipo de argumento é que este governo quer estabelecer a obrigatoriedade de uma vacina que não tem sequer eficácia comprovada. A Constituição delega aos pais a obrigação de assegurar como absoluta prioridade o direito à vida e a saúde. E quando os pais questionam a necessidade da vacina e demonstram preocupação estão justamente as protegendo”, disparou.
A obrigatoriedade das vacinas às crianças ganhou força no Congresso com a tramitação de um projeto de lei na Câmara dos Deputados que prevê até um ano de detenção, e no Senado, onde propostas com punições ainda maiores também estão sendo discutidas.
A tramitação das leis, no entanto, também escancarou a presença de profissionais ligados às grandes farmacêuticas em conversas com parlamentares. Apuração da Gazeta do Povo publicada em 2023 mostrou como as companhias investem recursos financeiros para tornar a interlocução mais próxima de deputados e senadores.
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