A simples conquista da vida longa não garante uma vida plena. Em qualquer que seja a idade, a felicidade se conquista a cada dia, a cada ato, de preferência conscientemente.
Não são poucas as pessoas que transferem para o destino e até mesmo para a Força Divina a consequência de seus atos, de suas opções. Ultrapassam os limites do suportável, como se corpos e mentes fossem indestrutíveis, como se a plenitude da juventude fosse eterna.
Engano. A capacidade adaptativa dos órgãos é inversamente proporcional à idade. O que parece tão pouco agressivo em determinadas fases da vida torna-se inconcebível em outras. Não se trata apenas da arte de saber poupar. Muito melhor que isto é saber utilizar, com parcimônia, para que não falte saúde.
Que vamos viver muito mais que as gerações passadas não há dúvida. A todo o momento, novas medidas preventivas são ofertadas: vacinas, medicações preventivas, ora para controle da pressão, do colesterol, da diabete, ora para diminuir o ritmo do processo de demência, da artrose. Medidas de suporte para controle da dor, terapias nutricionais, fisioterapia, cuidadores, um aparato de suporte para pessoas que já chegaram ou estão chegando à velhice com limitações, mas que lutam.
A reflexão que se quer aponta para uma velhice bem-sucedida: reflexo de uma vida de sabedoria, de respeito ao ciclo tão delicado que é a vida e o envelhecimento. Não se trata de algo que atingirá apenas o outro. Todos nós envelheceremos. Resta saber de que forma e se esta escolha será consciente ou inconsciente.
Difícil exercer o livre arbítrio e não ceder a todos os prazeres, por exemplo, da culinária. O que dizer das deliciosas sobremesas, tão elaboradas e tão ricas em gorduras e calorias? E a resistência em transformar a atividade física em rotina? E quanto a limitar jornada de trabalho e equacionar o consumo para que não se caia na armadilha do consumismo? E o que dizer da valorização do envelhecimento de aparência, apenas estético?
Sim. O estilo de vida ditará os limites e as potencialidades de uma melhoridade marcada pela possibilidade da realização de sonhos postergados por lutas consideradas, na época, mais importantes. Ou então, a melhoridade será um eufemismo odiado uma vez que a velhice trará uma fase de extremas dificuldades e limitações que não poderão ser taxadas de melhor em nada.
Àqueles que hoje integram o que se convencionou chamar de meia idade um alerta: antes tarde do que nunca! E cá, entre nós, nem será tarde. A tomada da consciência da vida, do amor a si próprio e àquilo que realmente importa não se mede através do tempo. Pode ser retomado a qualquer tempo. O que se quer evitar é a tomada de decisão pela qualidade de vida apenas depois do pior: de um infarto, um derrame. Mas algumas pessoas apenas funcionam assim. Primeiro conquistam a obesidade mórbida e somente depois procuram recursos. Primeiro esgotam seu pâncreas, esgotam sua possibilidade de produzir insulina e só então passam a fazer dieta e se preocupar com a saúde.
A Organização Mundial da Saúde já divulgou a fórmula ideal para a velhice bem-sucedida e é simples: autonomia física, autonomia mental, inserção social e projeto de vida. A simplicidade da fórmula é tentadora. Surgem imediatamente duas palavras de ordem: atitude e opção. Muito depende de como se viveu a vida, mas outro tanto depende da atitude receptiva perante as constantes mudanças do mundo ou a rigidez de pensamentos e atitudes que isolam, que deprimem e limitam. Habitar novos projetos de vida talvez seja, na velhice, um convite ao resgate daquilo que ficou lá trás, bem guardado como impossível ou como frustração pelo não realizado. A redescoberta, talvez simples, do compartilhar do mesmo amor que o tempo mudou, mas dele não retirou a beleza. O convite: vivam a plenitude e a beleza da vida. Ela é muito delicada e fugaz
* João Carlos Baracho é médico geriatra, vice-presidente da Associação Médica do Paraná e autor de três títulos sobre a terceira idade; o último desses, Antes que seja tarde, foi lançado em outubro deste ano, e está disponível nas Livrarias Curitiba.