Cidade engolida
Erosão destruiu centro histórico em 1968
Em setembro de 1968, os moradores de Guaratuba perceberam algo estranho no chão, que tremia. Era a água do mar que aos poucos invadia o subsolo da cidade e causaria a erosão que destruiu a maioria dos imóveis do centro histórico da cidade. "Alguns dias antes, dava para ouvir estalos no assoalho e as lâmpadas piscavam, mas não imaginávamos que uma tragédia iria acontecer", conta a diretora de Cultura da cidade, Maria do Rocio Bevervanso, cuja família foi uma das 35 desabrigadas pela erosão que destruiu boa parte do município.
Na madrugada do dia 23 de setembro de 1968, o chão começou a se desfazer e as ruas e casas foram engolidas pela terra. A aposentada Luiza Fogaça Pikcius, 74 anos, presenciou o fato e conta que os postes e árvores foram se desfazendo. "Só deu tempo de fugir. Quem não perdeu tudo na erosão perdeu depois, porque as pessoas ficaram com medo de voltar para lá e de acontecer tudo de novo", conta a aposentada.
Não houve mortes na erosão, apenas desabrigados que foram para casa de parentes ou se abrigaram no Casarão do Porto. E, além dos moradores, uma das maiores vítimas foi a própria história de Guaratuba.
"Boa parte do registro do passado da cidade se perdeu neste episódio, como documentos e construções. Ficaram as memórias vivas das pessoas", ressalta Maria do Rocio. (RB)
Guaratuba hoje é uma das cidades do Litoral que mais recebe turistas, mas já foi um município discreto e com características coloniais. A principal testemunha de toda essa transformação está no centro histórico da cidade: uma edificação do fim do século 18, das poucas no estado de antes da chegada do imperador Dom João VI ao país, em 1808, e que atualmente abriga a Casa da Cultura.
Quem visita a construção também conhecida por Casarão do Porto, já que havia um pequeno atracadouro na frente do imóvel pode ver detalhes de técnicas construtivas que praticamente não são mais utilizadas. As paredes preservam pedaços de conchas, utilizadas na mistura para fazer a cal usada no sustento da estrutura. Segundo o superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Paraná (Iphan-PR), o arquiteto José La Pastina Filho, usar conchas em construções era comum no Litoral de todo o Brasil na época. "Esse material era fácil de se encontrar, além de permitir que o prédio ficasse sólido e resistente. Inclusive, quem olhar bem, pode ver algumas conchas nas paredes do casarão", explica o arquiteto.
Apesar de a casa ter perdido muitos detalhes da construção original a cada restauração, como a estrutura interna feita de madeira e barro, o prédio ainda preserva espaços muito típicos da arquitetura colonial. Como a disposição dos ambientes, com comércio no andar térreo e moradia no superior. "Isso pode ser notado pela estrutura interna, com salões grandes para abrigar alguma venda ou cômodos para moradia", comenta o superintendente do Iphan-PR.
Além de ter abrigado vários comércios, o Casarão do Porto também serviu de abrigo para as vítimas da erosão que destruiu a maior parte do centro histórico de Guaratuba no final da década de 1960 (ler texto ao lado). Entre os imóveis destruídos em setembro de 1968, estava a antiga sede da prefeitura, construída com os mesmos materiais do casarão.
Patrimônio histórico
Tombado pelo Patrimônio Cultural do Paraná em 1960, o prédio não possui registro preciso sobre a data exata em que foi construído, já que boa parte da documentação oficial da cidade foi destruída pela erosão. Sobre a manutenção do edifício, a diretora municipal de Cultura de Guaratuba, Maria do Rocio Bevervanso, afirma que os antigos donos pouco fizeram para mantê-lo preservado. "Com o tempo, o prédio foi se deteriorando e perdendo muitas características de sua criação, pois foi adaptado para vários comércios", aponta. O imóvel abribou estabelecimentos como armazéns, lojas de armarinhos e até uma escola.
A casa ainda é de propriedade particular e está alugada à prefeitura de Guaratuba. Mas, de acordo com a diretora de Cultura da prefeitura, há interesse do município em adquiri-lo pelo valor histórico que possui.
O dono do imóvel, o médico Ronaldo da Rocha Loures, colocou a casa à venda no início de 2011, mas pretende apresentar proposta à prefeitura. "Já alugo a propriedade para o município há um ano e meio. Por isso a prefeitura tem prioridade na compra", afirma Loures.
Serviço:
O Casarão do Porto, atual sede da Casa da Cultura de Guaratuba, abre espaço para visitação de exposições sobre a história da cidade. O endereço é Avenida Afonso Botelho, s/n, em frente à Praça dos Namorados. Telefone: (41) 3472-8642
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