Entre nessa festa
Quem pensa que paranaense não gosta de carnaval está enganado. O Litoral recebe a cada ano mais gente que não está só interessada em praia e sossego. Pelo contrário. São pessoas que engrossam cada vez mais a multidão que vai atrás dos trios elétricos e brincam o carnaval nas cidades históricas.
O tipo de diversão corresponde ao perfil dos grupos sociais que compõem a população do estado. Nos balneários de Matinhos, Caiobá e Guaratuba, as bandas e trios elétricos concentram pessoas que podem tirar uma folga no carnaval e correr para a praia e, de quebra, arrastam as pessoas que moram nas cidades próximas. "Inclusive essas bandas começaram por incentivo de curitibanos que queriam curtir a folia no Litoral", diz a antropóloga da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Selma Baptista.
As cidades como Antonina, Paranaguá e Morretes, por exemplo, também entraram no roteiro de quem gosta de um carnaval cultural. "Ir para essas cidades nesta época tem virado um hábito. Os carnavais com tradição folclórica, feitos por comunidades locais, estão ganhando reforço de um público jovem", explica.
Desde o começo
- Em 1853, aconteceu o que oficialmente é considerado o primeiro baile carnavalesco da capital, com características das festas da capital francesa, Paris.
- De acordo com a historiadora Vanessa Rodrigues, mestre em antropologia social da UFPR, somente no século 20 que a tradição do carnaval começa a crescer na cidade, com o fortalecimento do chamado corso. "Era uma festa de rua, com passagem de carros enfeitados e charretes, onde as pessoas passeavam sentadas e jogavam confetes", conta.
- Junto do corso, que começou a declinar na década de 1940, também ganhavam as ruas da capital dos blocos carnavalescos, compostos por jovens pertencentes a clubes sociais. A organização dessas festas a partir dos anos 1950 fica cada vez mais forte e abrem espaço para o surgimento das escolas de samba.
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Amigos que fazem a diferença
Sucata era a matéria-prima que movia o Bloco dos Acidentados, comandado pelo carnavalesco Jocelito Xavier (foto à esquerda) 46 anos, em Paranaguá, desde 1981. Junto com a família e vizinhos, o grupo montava os batuques e as fantasias para desfilar na avenida. O nome do bloco era uma espécie de protesto contra a situação da saúde no Brasil nos anos 1980. "A nossa alegoria era uma ambulância feita com os restos de um sofá velho e os instrumentos eram feitos com latas de tinta revestidas com panos." Foi um bom tempo, mas, sabe como é, o próximo carnaval para quem vive dele é sempre o melhor.
A filha do carnavalesco, Tenile Xavier, se apaixonou pela festa ainda criança. E desde cedo aprendeu com o pai que a folia é melhor quando festejada ao lado dos amigos. "Sem eles, o bloco não vai para a avenida, não há dinheiro para colocar o carnaval na rua. Nós, que sempre fomos organizados, mas não tínhamos recursos, instituímos o livro de ouro, que passava de casa em casa para angariar contrinuições para o carnaval", diz.Aos 15 anos de bloco, em 1996, o grupo se tornou uma escola de samba: a Mocidade Unida do Jardim Santa Rosa.
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Lá vem ela de novo
Ao som dos primeiros tamborins, o segurança Aloizio de Lima Barbosa, 62 anos, tira do armário vestido, sapatos de salto alto e uma caixa de maquiagem, se produz, toma uma cervejinha e vai para a avenida. Há 31 anos ele cai no samba de Antonina na pele da sua pincipal personagem: a velha. A ideia de se travestir surgiu no início da década de 1980. "Eu até brincava o carnaval, mas era chato, as pessoas não respeitavam ninguém e assediavam todo mundo de um jeito que não é bacana. Foi então que decidi me vestir como senhora, para ser mais respeitado", diz. Com o tempo, a personagem ganhou fama e assanhamento. "Em 1989, fui a uma pensão em que amigos estavam hospedados no carnaval. No meio da conversa me deu calor e resolvi pular na piscina de figurino completo. O problema foi quando saí pela casa molhado, sujando tudo", diverte-se. Para este ano, ele planeja mais bagunça, uma velha mais provocante e brincalhona. "Preparem-se!
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Uma grande família
Brincar o carnaval pelas ruas de Caiobá era papo de família, aberto a alguns poucos agregados. Foi um susto quando o empresário aposentado Fabiano Campelo, 71 anos, viu a festa particular virar sensação entre os foliões. A Caiobanda é sucesso de público há 36 anos. "A ideia era emendar o baile infantil numa brincadeira pelas ruas, com o pessoal da família tocando os instrumentos de percussão. Isso tudo em 1975", conta o fundador. Aos poucos, segundo Campelo, as pessoas foram se juntando e aumentaram o grupo de foliões de Caiobá. "As famílias formaram blocos próprios, com camisetas deles e se juntavam em uma banda só", conta.
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Entre confetes e paetês
Para a designer Rosangela de Miranda, carnaval era passar horas grudada na tevê para assistir aos desfiles de fantasias nos hotéis e clubes cariocas. O que será que Clóvis Bornay aprontaria desta vez? "A mim restava sonhar um dia usar uma daquelas fantasias, virar um pássaro ou uma rainha. Quando tinha um baile para ir, colocava tesouras, cola e tecidos em ação para bolar alguma coisa", diz ela. Só que as fantasias não sobreviviam até o outro carnaval. "O baile de terça acabava invariavelmente com todo mundo na piscina ou tomando um banho de mar", lembra.
O tempo passou, os desfiles de fantasia na televisão acabaram, mas o gosto pelos tecidos vaporosos e lantejoulas permaneceu junto do samba no pé. "Quando meus filhos nasceram, a gente passou a frequentar nos anos 90 os bailes no Santa Mônica, na Praia de Leste, em Pontal do Paraná. Aí a festa voltou com tudo. A gente passou a decidir junto as fantasias e confeccioná-las com capricho", conta Rosangela, enquanto mostra as fotos dos pequenos Gabriel e Laura nos papéis de Aladim, cavaleiro do Zodíaco, odalisca, fadinha.