Parte das 11 guarda-vidas que trabalham na temporada das praias paranaenses: rotina de salvamentos, orientações a banhistas e até cantadas| Foto: Hedeson Alves/Gazeta do Povo

Entre o mar, a terra e os admiradores

Cinto de salvamento aquático, nadadeiras, apito, pranchão de salvamento e posto móvel. Todos os dias, esse aparato vai e volta dos quartéis às praias do estado. E muitas vezes quem tem de carregá-lo são as mulheres. "Não é tão pesado, mas já ouvi gente reclamando dos guarda-vidas marmanjões que às vezes não ajudam a levar", brinca a soldado Melânia Giraldi.

Mais comuns são as cantadas durante o horário de trabalho. Todos os dias tem gente que finge estar se afogando e pede respiração boca a boca. Até pedidos de casamentos já aconteceram na areia. Apesar disso, os homens são discretos. "A mulherada é muito mais descarada", garante Melânia.

Sempre alertas

Mesmo em um dia de mar tranquilo, as guarda-vidas não podem se descuidar um minuto sequer. A regra é nunca ficar de costas para o mar. O trabalho delas, no entanto, não se limita a salvamentos. A cada instante, pessoas pedem informações, perguntam a previsão do tempo ou deixam chinelos e roupas junto do posto para serem devidamente cuidados.

Muitos banhistas e vendedores ambulantes acabam se tornando verdadeiros amigos. Cristina Zakalusme, que há sete anos vende água de coco e refrigerantes nas areias de Caiobá, faz questão de não esconder o orgulho pelas companheiras de temporada. "É mais um desafio vencido pelas mulheres. Minha filha, Maíra Gabriele, de 4 anos, só tem biquínis vermelhos porque quer ser guarda-vidas."

CARREGANDO :)

Elas são apenas 11 em um universo de 403 homens. E, por isso mesmo, as guarda-vidas militares que estão no Litoral do Paraná precisam mostrar serviço, literalmente, para conquistar espaço no Corpo de Bombeiros.

Mas não é por estarem em menor número que elas deixam de ser respeitadas. Sem qualquer tipo de privilégio, as guarda-vidas recebem o mesmo tratamento de todo o batalhão, uniformes e rotina de trabalho iguais. "Até porque, se tivéssemos regalias seria preconceito com eles", conta a soldado curitibana Simone Aparecida dos Santos, 25 anos, que serve em Caiobá durante a temporada e na capital trabalha como socorrista do Siate. "A ideia é de que elas realmente sejam capazes de executar o mesmo trabalho dos homens", confirma o tenente Murilo Nascimento, bombeiro há nove anos.

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Em 2005, Simone e outras dez mulheres, que hoje são guarda-vidas, prestaram concurso público para a primeira turma de bombeiras do estado. Depois da prova, foram nove meses na escola de formação de soldados, em Piraquara, região metropolitana de Curitiba, e mais quatro no curso de preparação para a profissão. Como em 90 anos a corporação só teve homens, a entrada delas foi um choque.

"Caímos de paraquedas e ficou aquela dúvida se daríamos conta", diz a soldado Gizele Aparecida da Silva, 29, também de Curitiba. "No começo era mesmo complicado. A gente teve de se adaptar e, principalmente, aprender a medir as palavras. Mas elas provaram que podem fazer o trabalho com a mesma eficiência dos homens", opina o cabo Renato Zimermann, 40 anos, com mais de 20 de expe­riên­cia na profissão.

Se por um lado as mulheres não têm a força masculina, elas utilizam mais a técnica para facilitar o trabalho. O judô aquático, usado para imobilizar vítimas de afogamento, é um exemplo. Já a abordagem e o poder de convencimento junto aos banhistas é muito mais eficiente que o dos homens. "Sem contar o instinto maternal, que ajuda muito no caso de crianças perdidas", explica Nascimento.

A rotina

Em Matinhos, Gizele, Simone e as soldadas Ângela Cristina Antunes, 30, Melânia Giraldi, 23, Juliana Zanello, 24, Julinéia dos Santos, 27, e a sargento Juliana Colares, 29, têm vida dura nas areias. Todos os dias durante a temporada, elas trabalham cerca de seis horas – faça chuva ou sol.

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Os turnos são sempre inversos: quem fica de plantão pela manhã num dia, trabalha na tarde do dia seguinte. Ao mesmo tempo, precisam administrar a casa onde dormem, separada do quartel. "É vida normal. Temos de ir ao mercado, pa­­­gar contas, limpar a casa", diz Simone. Isso sem falar na rotina de beleza. Além de protetor solar e de hidratantes, pequenos detalhes, como brincos discretos ou um leve batom, dão toques mais femininos a um trabalho ainda machista.

Ao todo, em três meses de trabalho, elas têm apenas cinco dias de folga. É o tempo para viajar e matar a saudade da família. Quem opta pela profissão, porém, sabe que dificilmente passará o período de festas de fim de ano com os parentes. "É triste ter de escutar a mãe chorar no telefone todo ano. Mas é o que eu amo fazer, não tem jeito", diz Gizele, que trabalha no caminhão de combate a incêndios fora da temporada. "Escutar um obrigado depois de um salvamento paga o nosso trabalho. Esse é o principal reconhecimento da profissão", emenda Simone.