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Tradição

Pessoas simples mantêm viva a memória cultural de Paranaguá

Aos 85 anos, Milene Rosa Gomes preside a escola de samba Acadêmicos do Litoral Paranaense, que ajudou a fundar há mais de quatro décadas: “sou a baiana mais querida do carnaval de Paranaguᔠ| Henry Milleo/Gazeta do Povo
Aos 85 anos, Milene Rosa Gomes preside a escola de samba Acadêmicos do Litoral Paranaense, que ajudou a fundar há mais de quatro décadas: “sou a baiana mais querida do carnaval de Paranaguᔠ(Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo)
José Maria, estudioso do Instituto Histórico Geográfico de Paranaguá |

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José Maria, estudioso do Instituto Histórico Geográfico de Paranaguá

Romão Costa ensina os passos do fandango na Ilha de Valadares |

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Romão Costa ensina os passos do fandango na Ilha de Valadares

Além do que os livros, jornais e documentos relatam, a História de uma cidade, de um país ou de um povo é formada por um apanhado da biografia de seus moradores. E é simples resgatar um pouco das memórias culturais de uma cidade pequena, como Paranaguá, no Litoral do Paraná: bastam algumas horas de conversa com gente que tem histórias – e muitas! – para contar. É o caso de José Maria Faria de Freitas, tesoureiro e estudioso do Instituto Histórico Geo­­­gráfico de Paranaguá.

José Maria é um verdadeiro guardador das memórias da cidade, em todos os sentidos. Aos 73 anos de idade, o dentista conta que sua relação com a preservação da história começou por acaso, a partir de sua afinidade com associações e grupos de moradores da sociedade parnanguara, como Rotary, grupos de professores e de música e teatro.

Aos 40 anos, ao ser convidado para fazer parte do instituto pelo médico, poeta e historiador Anníbal Ribeiro Filho, José Maria questionou. "Na época lembro que perguntei a ele o que eu estava fazendo ali, porque não tinha jeito para a coisa, meu interesse era o carnaval, o futebol. Ao que ele me respondeu: ‘Um dia você vai ter mais coisas do que imagina’. E olha aí no que deu", conta, mostrando a sala de sua casa, que é praticamente uma extensão do instituto de tantos livros e documentos reunidos.

"Acabei me dedicando a juntar o conhecimento, a recuperar livros, jornais, e a pesquisar fontes. Tudo isso a gente ia fazendo e ia guardando no instituto e na sala de casa", relata. Todo esse trabalho de documentação era feito após o expediente, que ia das 8 às 21 horas, e virava a madrugada.

Além de documentar e digitalizar tudo, José Maria participava ativamente da vida cultural parnanguara. Presente quase sempre nos bastidores, ele levou teatro, música, cenografia e cultura para as escolas, participou dos blocos de carnaval, ajudou a bandinha da cidade, entre outras peripécias.

"Na medida que a idade foi chegando e eu não podia mais fazer as coisas com aquela vivacidade, pular de um carro alegórico para outro, passei a me dedicar a guardar documentos. A preocupação agora é com quem deixar tudo isso", desabafa.

A solução parece que está entre os amigos e colaboradores do instituto. Cada um deles tem o acervo documentado nesses anos todos em formato digital. "Se alguma coisa acontecer, pelo menos um dos arquivos tem de sobreviver", brinca José Maria.

A cultura de Paranaguá e de praticamente toda cidade litorânea também é traduzida fora dos documentos: na vida dos pescadores e em suas histórias com o mar. Janiro Fernandes Barbosa, o Teco, de 73 anos, Silvio Neves de Carva­lho Filho, 57 anos, e Salvador Cri­santo, 59 anos, têm muito em co­­mum, além dos mais de 40 anos de profissão. Todos aprenderam a pescar com os pais, tiraram a carteirinha profissional de pesca aos 17 anos e, hoje, têm a certeza de que os filhos não vão levar a tradição adiante. E eles nem querem que levem.

"Paguei o estudo que eu pude para que eles não precisassem pescar", conta Silvio. O posicionamento, segundo Teco, é resultado da própria experiência. "Vida de pescador não é fácil. Você trabalha duro e não vê nada na vida, se aposenta tarde e com um salário mínimo", afirma. Luiz Carlos dos Santos, de 47 anos, é mais otimista. "Tenho quatro filhos, três homens, e sei que pelo menos dois deles vão seguir a minha profissão. A vida não é fácil, mas é menos ainda para quem não quer trabalhar."

Na avenidaA rainha do carnaval parnanguara

Milene Rosa Gomes é a baiana mais querida do carnaval de Paranaguá. Aos 85 anos, ela preside a Escola de Samba Acadêmicos do Litoral Paranaense, que ajudou a fundar e é a mais antiga da cidade, com 45 anos de tradição. "Eu me considero uma relíquia da cidade. A rainha do carnaval sou eu, porque com essa idade ainda estou sambando, dançando e pulando. Obrigada, meu Deus, eu sou uma mulher muito feliz", diz, emocionada.

A baiana veio com os pais e quatro irmãos de Laguna, em Santa Catarina, quando tinha 14 anos, em busca de melhores condições de vida e emprego durante a safra de café. "Já nasci carnavalesca. Meus pais eram da folia. Minha mãe se vestia de homem, abraçava as mulheres dos amigos deles para brincar e quando o marido vinha para brigar e mostrava que era ela", conta.

Milene também é mãe de santo, e adotou 12 crianças da cidade, que criou junto com suas três filhas. Trabalhou como lavadeira no porto e como cozinheira. "Tive uma sorte muito maravilhosa. Sempre fui de coração muito bom, com força de vontade e espiritual, e fui subindo na vida em Paranaguá", diz.

"Eu viajei muito, estive em Porto Alegre, com o meu terreiro e com o carnaval, e no Paraguai, onde dancei de joelhos na avenida. Viajei esse mundo inteiro", conta ela. Na cidade, não tem quem não conheça a "Vó Milene", que hoje se prepara, com todo o fôlego do mundo, para dar show na avenida neste carnaval.

Veja mais imagens dos personagens:

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