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Imagens descontroem discurso de vereador Renato Freitas, que invadiu uma igreja no Paraná, mas diz não ter cometido crime.
Imagens descontroem discurso de vereador Renato Freitas, que invadiu uma igreja no Paraná, mas diz não ter cometido crime.| Foto: Malik Fotografia/Mandato Renato Freitas

O vereador Renato Freitas (PT) é alvo de ação na Câmara Municipal de Curitiba por quebra de decoro parlamentar. Ele é acusado de ter invadido a Igreja do Rosário, em fevereiro deste ano, durante uma manifestação contra o racismo. Dependendo da decisão dos vereadores que investigam o caso, ele poderá ter até seu mandato cassado. Em depoimento, Freitas insistiu que não cometeu nenhuma irregularidade, disse que não tinha poder sobre os manifestantes e que nem participou da organização do evento, embora tenha admitido que os manifestantes tenham se excedido. Ele ainda leu um pedido de desculpas “a quem se sentiu incomodado com o caso”. Mas os fatos desmentem a fala do vereador.

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Freitas é acusado de três atos em desacordo com o Código de Ética e Decoro Parlamentar: invadir a igreja, fazer manifestação política dentro do local e impedir ou perturbar cerimônia ou prática religiosa. Sobre o primeiro desses fatos, o vereador é veemente em negar que houve uma invasão de fato – ele insistiu que se tratou de uma “ocupação pacífica” em depoimento à Câmara.

Juridicamente, uma invasão se caracteriza pela entrada em um local, “clandestina ou astuciosamente, ou à revelia da vontade do ocupante”. Embora se refira normalmente a propriedades privadas, o termo pode ser aplicado a espaços de uso público restrito, como igrejas. Mesmo abertas a quem quer que seja, as igrejas não são públicas no sentido de estarem disponíveis para qualquer evento, como os de grupos políticos. Para isso, é necessário anuência prévia, o que não houve no caso em Curitiba, como deixou claro o padre Luiz Haas, da Igreja Nossa Senhora do Rosário.

Em entrevista ao Meio Dia Paraná, da RPC, o sacerdote contou que a missa começou às 17 horas, horário habitual da celebração, em que já havia manifestantes em frente da igreja. Por causa do som alto do protesto, fiéis – na maioria idosos – não conseguiam nem acompanhar a cerimônia. Alguns chegaram a sair e pedir que os manifestantes fizessem menos barulho. A resposta foi o aumento do volume e ainda mais palavras de ordem. Diante disso, conta o padre, a missa precisou ser “apressada”, terminando em 48 minutos - em geral, a cerimônia pode chegar a uma hora de duração.

Depois da missa, o padre foi até os manifestantes para entender o que estava acontecendo. Segundo ele, o grupo estava cada vez mais exaltado. Ao aparecer na porta, o religioso começou a ser xingado de racista e, com medo, os fiéis o puxaram de volta para dentro do templo e fecharam a porta principal. Os manifestantes correram então e conseguiram entrar pela entrada lateral do edifício, com bandeiras e gritando palavras de ordem.

O padre contou que permaneceu o tempo todo junto dos manifestantes dentro da igreja, pois havia o receio de que eles profanassem o altar - o que não ocorreu. “Nós temos todo o direito de ter a nossa paz e tranquilidade para fazer as nossas celebrações. Nenhum grupo até hoje atrapalhou a nossa missa aqui [na Igreja do Rosário]. É a primeira vez. Então, vai da consciência deles”, lamentou o padre na entrevista.

Imagens deixam claro invasão

Nas imagens feitas pelos próprios manifestantes é possível ver a entrada nada pacífica do grupo – uma voz fala em “dar porrada”. Também se pode ver o padre sendo chamado de racista por um coro de manifestantes, que repetem a frase “fascistas não passarão”. Já dentro da igreja, o vídeo mostra uma idosa tentando argumentar com um manifestante sem sucesso.

Mesmo tendo aparecido nas imagens discursando aos manifestantes, e em outro como um dos primeiros a entrar na igreja, o vereador alegou que não teria controle da situação, que não fazia parte da organização da manifestação, que não participava das conversas dos manifestantes com o padre ou outras pessoas ligadas à igreja do lado de fora do templo e que não teria tomado a decisão de entrar na igreja nem convocado os manifestantes a entrarem. “Vi a porta aberta e as pessoas entrando, decidi entrar também. Como vi que a entrada era pacífica e não havia ordem para que não entrasse e nem que saíssemos, achei que tinha o direito de entrar na igreja e me senti acolhido”, alegou. “Como eu não era o 'dono' da manifestação, eu não tinha condição de determinar normas de condução para quem estava participando, pois geraria conflito”, insistiu Freitas.

O argumento é o mesmo usado pela executiva do Partido dos Trabalhadores (PT) ao comentar o caso. Em nota, o partido afirmou que “não participou da decisão momentânea de adentrar o templo religioso, assim como não fazia parte da coordenação do ato”. Entretanto, o PT era um dos apoiadores da manifestação, que fazia parte de uma série de protestos em várias cidades brasileiras em razão da morte de Moïse Kabamgabe, jovem congolês assassinado em um quiosque na Barra da Tijuca (RJ). Na página institucional do PT, por exemplo, o partido divulgou previamente a agenda das manifestações em todo brasil, incluindo a de Curitiba, marcada para as 17 horas.

Crime contra a ordem religiosa

O vereador também disse que não desrespeitou a religião. Perguntado pelos vereadores se tinha participado ou testemunhado alguma manifestação contra a fé católica durante a manifestação, Freitas negou. “Pelo contrário, a igreja foi escolhida pela organização do movimento justamente por seu simbolismo, por ser a igreja dos pretos de Curitiba, construída pelos negros da cidade para que eles pudessem expressar sua fé”, disse ele.

Entretanto, esse tom respeitoso não corresponde à realidade. As imagens mostram o discurso de Freitas, no meio da igreja, dizendo que os católicos tinham apoiado um “policial que está no poder”. Para ele, os assassinatos de pessoas como Moïse Mugenyi teriam relação com a conivência das pessoas com fé católica a autoridades “fascistas”. Apesar de não estar provado que a principal causa da morte de Mugenyi seria a cor da pele, Freitas anunciou que eles teriam morrido pela existência de um suposto “racismo estrutural”.

Como já mostrou a Gazeta do Povo, é crime impedir ou perturbar cerimônia religiosa. Além disso, mesmo se não houvesse missa na igreja durante a invasão dos manifestantes, o crime permaneceria, uma vez que o culto religioso pode ser considerado tanto a prática comunitária, quanto o culto interior, feito individualmente.

Segundo o artigo 208 do Código Penal, “escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso” são crimes contra o sentimento religioso, com pena de detenção de um mês a um ano, ou ainda pagamento de multa. Quando há emprego de violência, a pena pode ser aumentada em um terço.

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