O governo federal começa a avançar seu plano de promover a regulação da internet no Brasil, promessa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante a campanha eleitoral e o período de transição. Na semana passada, uma minuta de substitutivo do Executivo ao projeto da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet (2630/2020) – também conhecido como PL das Fake News – deu contornos mais definidos do que pretendem os petistas.
O Executivo fala em estabelecer uma "entidade autônoma de supervisão" dentro de sua própria estrutura, com poder de "solicitar, receber, obter e acessar dados e informações das plataformas digitais de conteúdo de terceiros". Ainda não há um nome definido para essa entidade, nem está claro o órgão do Executivo a que ela estaria subordinada.
O papel dessa entidade seria regulamentar os dispositivos da lei, fiscalizar se as plataformas digitais estão cumprindo o papel de vigiar conteúdos, além de instaurar processos administrativos e aplicar sanções para redes que não cumprirem suas novas responsabilidades previstas no substitutivo.
As plataformas estariam obrigadas a fornecer, "sempre que solicitado", acesso a dados que possibilitem a fiscalização da lei. Segundo a minuta, a entidade autônoma de supervisão deverá assegurar a proteção a esses dados.
A entidade proposta pelo governo Lula também avaliaria se as redes estão cumprindo seu "dever de cuidado", isto é, sua responsabilidade sobre a censura ativa de conteúdos, sem depender de ordem judicial. O órgão seria sustentado pelas próprias redes sociais, que pagariam uma taxa proporcional ao seu número médio mensal de usuários ativos e de receita.
Outra proposta da minuta é a criação de uma equipe composta por agências de checagem, membros do Congresso, executivos de plataformas e representantes de associações e ONGs para elaborar um conjunto de normas contra a disseminação de fake news no Brasil. O documento ficaria conhecido como Código de Conduta de Enfrentamento à Desinformação e orientaria ações para censurar conteúdos em redes sociais e identificar responsáveis por "estratégias coordenadas de desinformação".
Três vagas estariam reservadas a jornalistas e agências de checagem. Como já mostrou a Gazeta do Povo, jornalistas brasileiros têm forte viés de esquerda comprovado cientificamente, e as agências de checagem de fatos, que são alimentadas por jornalistas de grandes meios, estão longe de apresentar imparcialidade no tratamento da informação.
A minuta do governo Lula, que tem 34 páginas (veja na íntegra ao fim desta matéria), é bem mais extensa do que o projeto original, de autoria do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), com somente dez páginas.
Assim como STF, governo quer obrigar redes sociais a regular conteúdo
Um dos focos da minuta petista é ampliar o dever de cuidado das redes sociais, dando-lhes maior responsabilidade de monitorar seus conteúdos.
Esse foi um tema central da audiência pública sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet no Supremo Tribunal Federal (STF). A escolha do momento para divulgar a minuta, poucos dias depois da audiência, e a ênfase na transferência de responsabilidade para as redes sociais sugerem que governo e STF atuam de forma sincronizada e alinhada rumo à regulação da internet no Brasil.
O Estado brasileiro e as redes travam um jogo de empurra-empurra para definir de quem é a responsabilidade de vigiar e censurar conteúdos na internet brasileira. Governo e STF pretendem acelerar a remoção de certos conteúdos, especialmente aqueles relacionados com o que chamam de "desinformação" e "discurso de ódio/antidemocrático", e querem que as redes sociais sejam mais proativas nessa tarefa. A minuta do PT prevê responsabilização civil das redes caso elas não cumpram seu dever de cuidado.
Com a divulgação da minuta, o PT também aumenta a pressão sobre o Congresso para a votação do PL das Fake News, logo depois de o STF ter feito o mesmo. No fim da audiência sobre o Marco Civil, o ministro Dias Toffoli sinalizou que, se os parlamentares não agirem, a Corte precisará atuar para preencher a lacuna. "Eles têm o direito de não querer decidir. Nós aqui no Judiciário não temos esse direito. Temos que decidir, porque temos vidas, pessoas e partes que estão requerendo seus direitos ou seus pretensos direitos, e temos que julgar e decidir", afirmou.
"Desinformação", "ódio" e discurso "antidemocrático" são focos da regulação de Lula
A minuta de Lula alinha-se com a audiência do STF também nos principais focos de discussão. Há ênfase em questões que o Supremo vem atacando nos últimos anos e que motivaram a censura a direitistas, como o suposto aumento da desinformação e do discurso de ódio na internet.
A expressão "discurso de ódio" aparece quatro vezes no documento. Assim como o Judiciário, o Executivo não estabelece uma definição do termo.
Segundo o documento, as plataformas digitais de grande porte devem agir "de forma diligente" e em "prazo hábil e suficiente", para prevenir sete tipos de crimes, elencados nesta ordem:
1) crimes contra a democracia;
2) crimes de terrorismo;
3) crimes contra crianças e adolescentes;
4) racismo, homofobia, intolerância religiosa ou xenofobia;
5) crimes contra a saúde pública;
6) instigação ao suicídio ou automutilação;
7) violência de gênero.
Boa parte das censuras promovidas pelo STF nos últimos anos contra perfis de personalidades da direita foi justificada com base em alguns desses tipos criminais, principalmente os dos itens 1 e 5.
A minuta quer que as plataformas digitais também sejam obrigadas a apresentar periodicamente os impactos da moderação de conteúdo envolvendo "discurso de ódio, discriminatório, desinformação política e de saúde pública, conspirações terroristas, campanhas para minar a integridade eleitoral ou atacar os poderes constitucionais e o Estado Democrático de direito". As redes também precisarão fazer uma "avaliação da existência de vieses na moderação".
O mesmo relatório precisará dizer se as plataformas adotaram providências para, "ante crises e eventos de grande repercussão, preparar seus sistemas e recursos humanos de forma a promover e garantir os direitos humanos e a democracia".
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