São Paulo Doença comum em países que passam por períodos de guerra, a síndrome da ansiedade disruptiva, desequilíbrio emocional causado pelo estado prolongado de alto estresse, começa a atingir os brasileiros. Nos consultórios médicos, ela é cada vez mais diagnosticada. "Estamos falando de pessoas submetidas a tanto estresse que se comportam como fios desencapados, ou seja, entram em curto circuito facilmente", diz o psiquiatra Eduardo Ferreira-Santos, que coordena o Grupo Interativo de Resgate da Integridade Psíquica (Gurip), do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. "E não é só nos consultórios que vejo isso. Em situações rotineiras, as pessoas explodem como num dia de fúria."
Um dos exemplos do cotidiano ocorreu no dia 18, em Suzano, na Grande São Paulo. Um aluno com baixo desempenho escolar socou sua professora de História por não tê-lo incluído numa atividade extraclasse, em que o critério de seleção era nota alta. Na quarta-feira (27), o professor de Educação Física Adair José Marcon, de 33 anos, foi morto diante dos alunos num ginásio em Biguaçu (SC), a 15 quilômetros de Florianópolis. O suspeito do crime, Robison Josué Noronha, de 23, estaria revoltado após o fim do namoro com uma secretária da escola onde Marcon trabalhava e ficou transtornado ao vê-la sentada ao lado do professor.
"Quem sofre de ansiedade disruptiva está no limite social, biológico e psíquico", diz Ferreira-Santos. Se já existe um transtorno de personalidade traços emocionais e de comportamento inflexíveis, que prejudicam a adaptação às novas situações e o limite é ultrapassado, o resultado são tiros, socos, entre outros tipos de agressões aparentemente gratuitas. E, para isso, a gota d'água pode ser um problema simples. "Quem tem personalidade mais flexível não sai batendo, mas pode sofrer colapso nervoso ou enfarte, por exemplo", afirma o psiquiatra.
A síndrome é desencadeada pelo sentimento constante de insegurança. A violência urbana já extrapolou a briga de trânsito e os pequenos furtos. "No país, ela ganhou contornos de guerrilha", diz Ferreira-Santos. Na quarta-feira, no conjunto de favelas do Alemão, na zona norte do Rio, o confronto entre a polícia e o tráfico deixou ao menos 19 mortos, número comparável ao saldo de um dia comum de ataques em Bagdá, no Iraque.
Vítimas
Depois de sofrer cinco assaltos à mão armada, a veterinária Neiva Souza, de 49 anos, foi vítima de um seqüestro relâmpago. "Fiquei três horas rodando de carro com os bandidos. Ele diziam que iam me jogar no Rio Pinheiros", conta Neiva, que deu R$ 2 mil aos criminosos.
Mãe de duas filhas, que moram fora do país, a mineira aposentada A.G., de 51 anos, foi vítima de uma agressão no trânsito há um ano. Levou um soco no olho de um motorista, que bateu no carro dela, e foi parar no hospital com fratura craniana.
Há um mês, ela caiu no golpe do falso seqüestro. A aposentada fez tudo ao contrário do que a polícia recomenda. Deu informação sobre sua vida aos supostos seqüestradores, não percebeu que a ligação vinha do Rio (de onde geralmente parte esse tipo de chamada) e, totalmente desesperada, depositou R$ 11 mil na conta dos bandidos. "Além do prejuízo, ainda tenho que conviver com a vergonha de cair numa história dessas."