A dimensão violenta dos protestos que ocorreram em diversas cidades na última semana e que em Curitiba culminou com uma onda de vandalismo no Centro Cívico, na noite de sexta-feira é uma ameaça à legitimidade buscada por movimentos que viram nas ruas o local para expressarem suas ideias e o sentimento de indignação com a política brasileira. Ao caminhar para a agressão, as manifestações afugentam pessoas que se sentiram motivadas a participar e causam prejuízo à administração pública e donos de estabelecimentos comerciais.
Somente em Curitiba, a conta da prefeitura é que houve um prejuízo de estimados R$ 1,5 milhão com a depredação de quatro estações-tubo, mobiliário urbano e do prédio da administração municipal. Ao longo da Avenida Cândido de Abreu, além da prefeitura, alguns órgãos do Judiciário tiveram vidros quebrados. Vários estabelecimentos comerciais foram pichados. Todos os bancos da região, uma lotérica, um salão de beleza, uma farmácia e a sede do Jornal do Estado foram atacados. Durante o confronto 31 pessoas foram presas e três policiais militares ficaram feridos.
A reação do prefeito Gustavo Fruet ao ver o resultado do protesto foi pedir uma punição dura para os detidos. "As manifestações, a cobrança, são algo legítimo, mas não podemos aceitar esse tipo de atitude. Curitiba não é assim. Sempre passamos uma imagem de respeito e civilidade para o mundo. Não podemos tolerar isso e vamos exigir uma punição dura para essas pessoas".
O governador Beto Richa criticou a participação de grupos violentos na passeata, alguns portando bombas de fabricação caseira e disse que a polícia vai investigar os autores do vandalismo. "Sempre fui favorável às manifestações ordeiras, pacíficas, que fazem parte da democracia. Mas não aceito atos violentos e vandalismo promovidos por uma minoria que tem outros objetivos", disse, ontem, em entrevista coletiva no Palácio Iguaçu.
Legitimidade
O risco da associação a um movimento que não consegue impedir o vandalismo é um fator que pode esvaziar as manifestações e afastá-las da construção de uma pauta de reivindicações que possa avançar. "A intervenção de pessoas mascaradas e usando lenços no rosto desvirtua todo o movimento. Quem quer um debate político sai de cara limpa", diz o sociólogo e cientista político Ricardo Oliveira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Oliveira argumenta que a escalada de violência está contribuindo para o esvaziamento das manifestações, já que as pessoas que querem paz se sentem ameaçadas. "Não apenas as autoridades, mas a sociedade civil precisa reagir. Ela precisa decidir se quer uma democracia definida por violência nas ruas ou pela participação cidadã, com instituições, tolerância e respeito", destaca Oliveira.
A falta de lideranças políticas e de foco na pauta de reivindicações dos protestos podem ser causas do agravamento da violência nos últimos dias, porque abre espaço para a expressão de radicais e dificulta a reação do poder público. Diz o cientista político Emerson Cervi, professor da UFPR: "Os governos estão perdidos, agindo o mínimo possível para não receberem críticas".