O marchar de 73 pares de botas ecoam pelo batalhão da Polícia Militar na Zona Norte de Joinville a cidade mais atingida pelos atentados criminosos que assolam Santa Catarina desde o último dia 30. A tensão está nos olhos e nos gestos de cada um dos PMs. Agrupados, eles ouvem atentamente cada recomendação do comandante da operação, tenente Ruy Teixeira Júnior. "Usem o colete antibalístico. Temos que ter todo o cuidado para pôr um basta nesses atentados", brada o oficial.
Dos 83 ataques registrados no estado, 15 ocorreram na maior cidade catarinense, que tem aproximadamente 526 mil habitantes. São ônibus e outros veículos queimados, tiros disparados contra a casa de policiais e delegacias, e até pedras arremessadas contra os coletivos. A violência obrigou a adoção de um esquema especial de policiamento. O governo de Santa Catarina anunciou a transferência de 20 presos para penitenciárias federais.
Madrugada
Com os giroflex ligados, as viaturas enfileiradas em frente ao batalhão saem uma a uma para seus destinos. A operação começa todos os dias por volta das 20 horas e invade a madrugada. Ônibus são escoltados pela PM até as 7 horas do dia seguinte e os terminais rodoviários recebem atenção especial. "Também realizamos barreiras surpresas em diferentes pontos da cidade, para flagrar qualquer atitude suspeita", ressalta Ruy. Oficialmente as operações policiais devem seguir até Quarta-Feira de Cinzas, mas poderão ser prorrogadas caso a onda de violência continue.
Histórias de medo
A forte presença policial nas ruas leva um pouco mais de segurança para pessoas como o paranaense Elói Joaquim dos Santos, 52 anos, pai de nove filhos e natural de Campo Largo. Em Joinville há 20 anos, o empresário foi vítima direta dos ataques. Há três meses, deixou um dos seus seis caminhões estacionado na frente da casa onde mora, na Vila Nova. Sem bateria e necessitando de reparos, o veículo foi "encostado".
Na última semana, ele foi surpreendido com o caminhão em chamas. "Não pode ter sido um curto-circuito porque não tinha bateria", diz, sem esconder o medo de novos ataques. "A gente tem receio de que nossos outros caminhões possam ser alvos desses bandidos", comenta.
Prejuízo
No Jardim Iririú, um ônibus foi incendiado na semana passada e por pouco o fogo não atingiu uma mercearia e uma residência. Mas um carro que estava próximo não escapou. Dono do estabelecimento comercial, Marcos da Silva, 59 anos, lamenta o estrago em seu Fusca. "Estava consertando aos poucos. Agora perdi tudo", diz. As rodas e a pintura do veículo sofreram avarias que dificilmente serão revertidas. "Nunca vi a cidade tão violenta como agora."
Devido ao calor do fogo, a casa de Lindomar Mariotti teve os portões chamuscados e o forro da garagem chegou a ceder. Para evitar o pior, ele passou a madrugada jogando água na residência. "A sensação que temos é de insegurança e de medo", resume.
Atentados chegam à divisa com o Paraná
A 38 quilômetros de Joinville, na cidade de Garuva, um Santana Quantum foi incendiado na oitava noite de ataques. Segundo a proprietária Rosa Leandro, de 68 anos, o fogo começou após os criminosos terem quebrado o vidro do carro com uma pedra e lançado para dentro do veículo um recipiente de vidro com gasolina. "Os policiais recolheram esse material. Nunca imaginei que ia ver isso acontecer na cidade", diz. Para piorar a situação, dos R$ 18 mil financiados para pagar o automóvel, ainda restam quatro prestações de R$ 420. "Perdemos todo nosso investimento", lamenta Rosa. Esse foi o único atentado registrado em Garuva, município de 14 mil moradores que é passagem obrigatória de paranaenses que seguem para as praias de Guaratuba e Itapoá via BR-376. (DA)