Depoimento: Questão cultural

Como um hábito tão simples pode ser tão diferente em outras cidades e outros países? Foi isso que me perguntei ao retornar para o Brasil depois de um período de dois anos na Europa. Para mim, a resposta também é simples: trata-se da cultura do povo. Boa parte desse tempo, estive em Portugal. Fiquei intrigado ao ver como os motoristas respeitam os pedestres que pisam na faixa de segurança. Parece automático. É só encostar o pé nas listras brancas e, pronto, os carros param. Em boa parte das cidades, nem semáforos são necessários.

Cheguei a ficar incomodado, pensando que estaria atrapalhando o trânsito. Sensação que foi desaparecendo com o tempo e que me levou, imprudentemente, a atravessar ruas sem sequer olhar para os lados (contrariando o que meus pais ensinaram). O respeito não ficava restrito aos condutores lusitanos. Raramente, eu vi alguém atravessar fora da faixa ou antes de o sinal ficar verde para os pedestres. Já na Alemanha, atravessar fora da faixa pode render multa de 50 euros!

Desacostumado, desde que voltei para cá, tive de correr algumas vezes para não ser atropelado enquanto atravessava na faixa. Agora, procuro me monitorar para manter o hábito de respeitar a faixa. Confesso: é difícil!

Jorge Olavo, repórter de Vida e Cidadania

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Atravessar ruas fora da faixa de pedestre é uma questão cultural e de educação. Diante disso, aponte o dedo quem nunca aproveitou a rua vazia ou aquele momento de pressa para cruzar o asfalto sem se preocupar com o local de passagem. E você? Quantas vias atravessou fora da faixa na última vez que andou pela cidade? Às vezes, trata-se de uma ação tão inconsciente que chega a ser difícil evitá-la. Por mais que o risco pareça estar distante, situações semelhantes provocaram 344 atropelamentos em Curitiba nos primeiros cinco meses de 2010.

Ao todo, segundo o Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran), 400 pessoas ficaram feridas e cinco morreram nesses acidentes. No ano passado, foram 896 atropelamentos, com 884 feridos e 12 mortes. Fora da faixa, quase que a diarista Lucineia Fabizak também entrou para as estatísticas na última terça-feira. Por um triz ela não foi atropelada por um motociclista na Rua José Loureiro, no Centro. "Ai que susto. Meu Deus, foi por pouco. É a pressa para chegar em casa", disse, aliviada. A pressa, a ausência de carros na rua e a vontade de cortar o caminho são as principais desculpas dos pedestres para não usar a faixa.

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O ranking de atropelamentos na capital é liderado pelas avenidas Sete de Setembro e República Argentina e pela Rua Mateus Leme. O BPTran não informou quantos acidentes aconteceram em cada uma. "São ruas extensas que têm um fluxo muito grande de ônibus, veículos e pedestres. A travessia de pessoas é constante, mesmo fora da faixa, o que aca­­ba pegando os condutores desprevenidos", afirma o tenente do BPTran Silvio Cordeiro.

Campanha

Para inibir a travessia errada, diminuir as estatísticas e conscientizar a população, o BPTran lançou, nesta semana, uma campanha que vai passar por 50 pontos de Curitiba nos próximos dois meses. O objetivo é fazer com que motoristas e pedestres respeitem a faixa de segurança e a sinalização. "É importante que o pedestre use a faixa. Infeliz­­mente as pessoas insistem em atravessar ao longo da via, o que geralmente resulta em atropelamentos", conta Cordeiro.

A presidente da Associação Paranaense de Vítimas de Trân­­sito (Apavitran), Shenia Samira Nassin, aprova a campanha. "Isso é necessário. Atra­­vessar fora da faixa é uma questão de educação. É cultural. Eu penso que para reverter isso o início deve partir de campanhas educativas", avalia. Ela afirma que, além de ações como essa, é preciso investir em um observatório de acidentes que contabilize e acompanhe todos os casos para que se tenham dados e estatísticas concretos para alertar a população.

Para a psicóloga Iara Thielen, coordenadora do Núcleo de Psicologia do Trânsito da Uni­­ver­­sidade Federal do Paraná (UFPR), a campanha é um começo para solucionar um problema que envolve vários fatores. Além da cultura e da educação, ela lembra que há carência de semáforos e sinais para pedestres em muitas vias, o que aumenta a insegurança do pedestre. "Começar esse tipo de campanha sem dúvida é im­­portante. Para mudar um hábito é preciso um conjunto de ações. Precisamos preparar as pessoas para conviver no trânsito", afirma.

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Interatividade

Como educar pedestres e motoristas para uma melhor convivência no trânsito, favorecendo a diminuição dos acidentes?

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