No auge dos protestos, em 24 de junho, a presidente Dilma Rousseff propôs cinco pactos aos brasileiros como resposta às demandas das ruas. De lá para cá, as manifestações haviam esfriado na maior parte do país. No entanto, foram retomadas ontem, no Sete de Setembro, embora tenham tido em geral bem menos participantes do que em junho. E os pactos? Como ficaram? Na sexta-feira, Dilma convocou cadeia nacional de tevê para dizer que o povo tem o direito de ficar indignado, mas que os pactos estão sendo cumpridos e "aprofundados". A Gazeta do Povo avaliou o que aconteceu com os compromissos da presidente nos últimos meses. Em alguns casos, o governo federal colocou em prática suas propostas, mesmo sob fortes críticas como no caso do programa Mais Médicos. Outros pactos têm pouquíssima chance de sair do papel rapidamente, como a reforma política, que empacou no Congresso e dificilmente vai valer para as eleições de 2014. Na média, os pactos estão mesmo em processo lento de realização o famoso banho-maria.
1. Responsabilidade fiscal
O primeiro pacto proposto pela presidente Dilma Rousseff foi de responsabilidade fiscal. O principal motivo, segundo a presidente, seria garantir a estabilidade na economia diante da crise internacional e frear o aumento da inflação. Nos primeiros meses pós-protestos, o governo pôde anunciar duas boas notícias: o Produto Interno Bruto (PIB) subiu 1,5% no segundo trimestre, maior variação desde 2010, e a inflação ficou próximo do zero em julho o melhor resultado desde 2010, embora já tenha voltado a subir em agosto. Entretanto, esses resultados não estão ligados às manifestações especialmente o crescimento do PIB, que se refere aos meses de abril, maio e junho. Além disso, o governo continua sendo criticado pela "contabilidade criativa" e pelo desequilíbrio nas contas públicas.
2. Reforma política e combate à corrupção
O segundo pacto foi a reforma política e o combate à corrupção no poder público. O governo chegou a anunciar a convocação de um plebiscito e uma constituinte exclusiva para discutir e aprovar mudanças nas regras eleitorais até outubro, para que pudessem valer já em 2014. Após idas e vindas, com direito a derrapadas, a batata quente ficou para o Congresso. Desde então, o debate esfriou. Mas há uma certeza: uma reforma ampla não sai antes de outubro. No máximo, haverá alterações pontuais na Lei Eleitoral.
Já o pacto do combate à corrupção pode ser visto como um copo meio cheio ou meio vazio. O Congresso aprovou e a presidente sancionou, por exemplo, lei que endurece a punição para empresas corruptoras, considerada por especialistas como essencial no combate à corrupção. É possível dizer que o país não fez mais do que a obrigação, já que descumpria convenção internacional da qual era signatário ao não prever punições às empresas. Mas avançou. Por outro lado, ao manter o mandato do deputado-presidiário Natan Donadon (sem partido-RO), condenado por desvio de dinheiro público e formação de quadrilha, o Congresso deu um recado bastante claro à população: a tolerância dos políticos com a corrupção ainda é bem grande.
3. Saúde
A solução apontada pelo governo para a má qualidade do serviço público de saúde gerou a maior polêmica no país desde os protestos. Quando anunciou os pactos, Dilma mencionou que traria 6 mil médicos estrangeiros para atuar no interior do país e nas periferias das capitais. Após idas e vindas, o governo anunciou em agosto convênio com o governo de Cuba para trazer 4 mil profissionais de medicina. O plano, porém, não é exatamente uma resposta às ruas, pois a intenção de importar médicos é anterior aos protestos de junho. A decisão despertou um debate intenso entre os que defendem a medida e os que criticam, especialmente pelas condições de trabalho oferecidas aos médicos e pela forma como a vinda dos cubanos foi negociada com o governo de Raúl Castro. Além disso, boa ou ruim, trata-se de uma medida paliativa, já que os médicos estrangeiros devem ficar por apenas três anos no Brasil. E o governo ainda não se manifestou sobre a proposta dos médicos brasileiros de criar uma carreira de estado na saúde pública.
Já para promover um financiamento de longo prazo à saúde, o Congresso aprovou lei que destina 25% dos royalties do pré-sal para o setor (outros 75% irão para a educação). Mas deve-se destacar que no início o Planalto era contra os 25% para a saúde; queria 100% para o ensino. Teve de ceder à vontade dos parlamentares. Um problema nessa fonte de financiamento, porém, é que o dinheiro do petróleo só deve vir no médio prazo, quando a exploração do pré-sal estiver consolidada. E o simples aumento dos recursos não significa necessariamente mais qualidade no atendimento.
4. Educação
A principal proposta apresentada pela presidente Dilma no pacto por uma educação melhor já não era exatamente uma novidade: o uso dos royalties do pré-sal para financiar o ensino público. Um projeto já tinha sido apresentado pelo governo e contava com clima desfavorável no Congresso. Aproveitando a carona dos protestos, o Planalto recolocou a discussão em pauta. Foi aprovado, ao final da discussão, que 75% dos royalties irão para a educação. Além disso, 50% do Fundo Social do Pré-Sal serão destinados para educação e saúde (a parcela de cada área não foi definida). Com o dinheiro do petróleo, o governo espera cumprir a meta de o país investir 10% do PIB em educação até 2020. Essa meta consta do Plano Nacional de Educação (PNE), projeto de lei apresentado em 2010 e que deveria estar valendo desde 2011. A demora em aprovar o PNE se deve em grande parte ao próprio governo, que se colocava contrário aos 10%. Queria apenas 7%.
E os protestos não aceleraram a tramitação do plano.
5. Mobilidade urbana
A melhoria no transporte público foi o estopim dos protestos de julho, especialmente em São Paulo. Eram dois problemas principais: a tarifa alta e a qualidade baixa de ônibus e metrôs nas grandes metrópoles brasileiras. Como solução, o governo prometeu investir R$ 50 bilhões no setor. Além disso, prometeu ampliar as isenções fiscais sobre tarifas de ônibus, trens e metrôs. Oito capitais apresentaram projetos requisitando parte desse dinheiro entre elas Curitiba. A capital paranaense pediu cerca de R$ 6 bilhões por meio do governo do estado e da prefeitura. No fim de agosto, o governo sinalizou que investiria em quatro corredores de ônibus entre Curitiba e cidades da região metropolitana, projetos apresentados pelo estado. Já a prefeitura ainda aguarda uma resposta para seus projetos, que incluem entre o metrô e o veículo leve sobre pneus (VLP). O dinheiro para essas obras ainda não foi liberado e os efeitos desses projetos na mobilidade ainda são incertos. Entretanto, talvez esse seja o pacto mais avançado de todos. Além de oferecer uma resposta concreta para um problema levantado durante os protestos, a promessa mostra uma disposição do governo de colaborar com os outros níveis da federação para resolver um problema comum a todos. Resta saber quando os investimentos sairão do papel.