Já há muito tempo que venho falando que o sistema de funcionamento do Estado brasileiro gera corrupção. É que há uma centralização excessiva do fluxo de impostos. Qualquer município e estado que desejar implantar políticas públicas nas áreas de educação, saúde, segurança ou infraestrutura, obrigatoriamente, precisará do apoiar o governante de plantão no Palácio do Planalto. Você não consegue recursos do Ministério do Planejamento, da Fazenda, do BNDES, dos bancos públicos, sem o aval do presidente ou de um ministro.

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Opinião de Marco Antonio Villa – A crise é do governo Dilma

A corrupção está pior, inegavelmente. Basta ver os valores envolvidos nas denúncias de corrupção. A corrupção existiu. Mas nessa quantidade, com esse número de envolvidos, nunca ocorreu. Isso diminui a qualidade das decisões políticas. A decisão passa a ter como referência os atos de corrupção.

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O governo de certo modo “vende” as políticas públicas para municípios e estados em troca de apoio. Isso já é uma fonte enorme de corrupção. Se você vai do município ao poder federal para conseguir essas obras, financiamentos, precisa de intermediários. Se não tem lobistas junto às instituições, não consegue nada.

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Os intermediários cobram seu preço. E se for um líder político, deputado federal e senador, obviamente vai cobrar em forma de dividendos e apoio para sua política regional, para sua eleição.

Por outro lado, o presidente da República, que é tão poderoso, com tanto poder e verba na mão, se ele não distribui esses recursos, se não atende aos pedidos de recurso, evidentemente tem sua aprovação de projetos dificultadas ou impedidas no Congresso. Tem que comprar duas vezes. Atendendo às reivindicações municipais e estaduais e no Parlamento. E não é por acaso que os parlamentares brasileiros são todos lobistas. Como é que você tem 11 projetos de lei dormitando nas vagas do Congresso de regulamentação do lobby? Porque, quando for regulamentado, não poderão mais exercer sua função de brokers. Tem a bancada ruralista, da bala, da Bíblia, do ensino universitário privado, que arrancou dinheiro para financiamento do Fies, apesar da crise deste ano. Você tem essa atividade de lobby acoplada ao mandato. Essa também é uma grande fonte de corrupção.

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Somado a isso, os partidos brasileiros têm que ter presença municipal, regional e nacional. A mediação se dá pelos oligarcas, que são donos dos partidos políticos. Esses donos de partidos vendem o apoio aos governos através de recursos para suas cidades. Então você tem um uma estrutura toda de Estado que só funciona, como disse Roberto Cardoso Alves, na base do “é dando que se recebe”.

O escândalo da corrupção é apenas uma exacerbação do exercício diário do poder no âmbito municipal, regional e nacional. Não é uma anomalia. É uma radicalização apenas desses procedimentos. Aí tem isso que aconteceu. A presidente Dilma Rousseff não tem treino para esse tipo de jogo, não foi formada para isso, nunca foi eleita, tem formação mais burocrática do que política. E esse sistema corrompido brasileiro pressupõe negociação constante do “é dando que se recebe”. O que aconteceu: ela desejou impor à economia e à marcha do Estado essa determinação política vertical, sem negociação. E aí ficou mal, porque foi perdendo cada vez mais a base. Nesse caso, Lula é muito mais esperto e hábil, sabendo manipular essa prática. Nesse momento, ela diz uma verdade muito grande. Ela não é desonesta, porque nem soube entrar nesse jogo de desonestidade.

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Agora que as condições de governabilidade ficaram tão ruins, Lula impôs a Dilma os nomes de Jacques Wagner e Ricardo Berzoini para compor a equipe ministerial e colaborar com a articulação política. O problema é que Eduardo Cunha já estava na iminência de ter suas irregularidades descobertas.

Essa última tentativa, de troca de votos no Conselho de Ética pelo não andamento do impeachment foi uma tentativa desesperada. Foi um ato de fraqueza do Cunha, não de força.

Agora, pessoalmente, não acho que esse processo de impeachment possa prosperar, ou prospere de maneira rápida. Não é certo que essa base aliada estaria disposta a perder esse filão de troca que ainda pode conseguir com Dilma. E você tem ainda a bancada do PT e toda a bancada de esquerda que certamente não vê com bons olhos o programa do PMDB, caso o Michel Temer chegue à Presidência. É algo que nem os neoliberais imaginaram. Um projeto muito drástico no corte de direitos sociais e civis. Além disso, tem que pensar que, por mais que o ministro do STF Teori Zavascki tenha apoiado e mantido iniciativas do Sergio Moro, o presidente do Supremo nesse processo é o Ricardo Lewandowski, que já disse que considera o impeachment um golpe. Então dificulta o andamento do processo.

A questão central é que a corrupção no Brasil é sistêmica. Não é ocasional. É permanente.