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A presidente Dilma em evento sobre transparência: 98% dos gastos do gabinete presidencial ainda são sigilosos | Roberto Stuckert Filho/Presidência da República
A presidente Dilma em evento sobre transparência: 98% dos gastos do gabinete presidencial ainda são sigilosos| Foto: Roberto Stuckert Filho/Presidência da República

76% dos municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes ainda não regulamentaram a Lei de Acesso à Informação, 24 meses depois da entrada em vigência da legislação. Ainda há sete estados que também não fizeram a regulamentação.

Garantia

Regra evita que gestores "escondam" dados públicos

A Lei de Acesso à Informação passou a valer em maio de 2012. A legislação foi criada com a intenção de promover maior transparência na relação entre cidadãos e órgãos públicos. A partir desta norma, a escolha por quais informações seriam divulgadas deixou de ser exclusividade dos gestores públicos e o cidadão interessado passou a poder exigir a divulgação de dados ou documentos públicos. Estão debaixo do "guarda-chuva" da LAI prefeituras, câmaras municipais, assembleias legislativas, tribunais de contas, universidades públicas, autarquias, empresas públicas, governos estaduais, governo federal e os órgãos que compõem o Judiciário.

Opinião

Burocratas resistem em dar ao público aquilo que é de direito

Rosiane Correia de Freitas, professora de Jornalismo da Universidade Positivo

A Lei de Acesso a Informações surgiu para evitar que políticos e burocratas possam filtrar o que a sociedade sabe. Antes da lei, o cidadão pedia e dependia da boa vontade de quem estava atrás do balcão: se quisesse dar a informação, ótimo; caso contrário, o único caminho era tomar o caminho da Cúria e reclamar ao bispo.

Pela nova lei, ninguém pode perguntar quem é você ou por que você quer a informação. Você é cidadão e isso basta para ter o direito de saber de coisas públicas. Ponto. Mas, claro, ainda há resistência a isso. Os burocratas continuam querendo ter a chave do cofre de informações. E quem faz solicitações sente isso na pele.

Recentemente, coordenando um trabalho de alunos de Jornalismo da Universidade Positivo, pedi dados à prefeitura de Curitiba sobre fiscalização da Vigilância Sanitária. Logo me ligaram querendo saber "quem eu era". Procedimento desnecessário e fora do que prevê a lei. Informei que era professora universitária e os dados vieram.

As informações eram relevantes e geraram uma reportagem que acabou sendo publicada aqui na Gazeta do Povo. Ao saber que a informação seria usada para fins jornalísticos (o que é absolutamente legal) funcionários da Secretaria Municipal da Saúde afirmaram às alunas que faziam a reportagem que as informações haviam sido liberadas porque se tratava de um trabalho acadêmico. Como se o fato de haver interesse jornalístico mudasse algo. Na verdade, os servidores nem poderiam perguntar para que serviria a informação. A obrigação era de fornecê-las independente do resto.

Ainda levará tempo para que os gestores se acostumem à nova realidade e a lei seja plenamente cumprida. Como está, porém, já é melhor do que o que havia antes.

A Lei de Acesso à Informação (LAI) completa dois anos de vigência neste mês. No entanto, a legislação, que é um passo adiante no caminho da transparência, ainda encontra muitos entraves para valer plenamente. Falta de regulamentação, sucessivos pedidos negados, aumento no sigilo das informações e problemas na gestão de documentos são alguns dos obstáculos enfrentados pelo cidadão que faz valer o direito de solicitar dados, documentos e estimativas de órgãos públicos.

INFOGRÁFICO: Veja como funciona a Lei de Acesso à Informação

Até agora, 19 estados e apenas 24% dos municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes regulamentaram a lei, de acordo com levantamento da Controladoria Geral da União (CGU). O mesmo órgão – responsável pela gestão de tudo que é relativo à LAI no âmbito federal – organizou um programa de assessoramento para estados e municípios na prestação de informações, mas até agora só 1.360 municípios dos mais de 5.500 aderiram ao plano, chamado Brasil Transparente.

Sem regulamentar a lei, ou seja, sem pormenorizar e detalhar a aplicação, cidadãos, jornalistas e ONGs ficam sem resposta ou sem saber a quem recorrer quando um pedido é negado, por exemplo. "A regulamentação é essencial porque a lei não entra nas miudezas. Um decreto ou uma nova lei que regulamenta a LAI é o que pode dar execução, mostrando qual é o fluxo. A lei aponta o princípio, mas cada órgão precisa de um encadeamento jurídico que vem logo depois para demonstrar como se dará", explica Moacir Rodrigues de Oliveira, Chefe da Controladoria Regional da União no Paraná.

A regulamentação da LAI é a peça-chave para a resolução dos outros entraves encontrados por quem busca informação dos órgãos públicos. Isso porque dessa forma é possível indicar as minúcias da lei: se haverá um funcionário específico para receber os pedidos e responder as demandas, como será o sistema on-line para pedir informação, determinação de sigilo das informações e como será a gestão documental.

"O principal problema que encontramos, e que gera todos os outros, é a efetiva implementação da LAI. Embora na esfera federal isso já exista, nos níveis estaduais e em municípios, isso é raro", comenta Marina Atoji, do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas.

Sigilo

A regulamentação é que indica a classificação dos documentos, que podem ser categorizados como público, sigiloso, secreto ou ultrassecreto. A mudança de status entre essas categorias é usada para minimizar o impacto com a divulgação dos gastos públicos em algumas entidades. Levantamento da revista IstoÉ mostrou, por exemplo, que 98% dos gastos pessoais do gabinete da presidência da República são sigilosos. Em 2008, antes das denúncias de uso indevido do cartão corporativo, 82% dos trâmites tinham essa classificação.

"Isso é reativo. É uma manobra que vemos comumente, principalmente em informações relativas à segurança pública e gastos de gabinetes. E mudou depois da vigência da lei", lamenta Marina.

Divulgação

Para o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, a simples divulgação da LAI em grande escala ajudaria a fazer com que o acesso aos dados públicos se efetivasse. "Na medida em que você gera a demanda, você terá a regulamentação", afirma.

No Paraná, ainda há muito para evoluir

Curitiba e o governo do Paraná têm decretos que especificam a lei desde 2012. O Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR) também possui resolução que edita a norma e normatiza o atendimento aos pedidos de acesso à informação amparados na lei.

A Assembleia Legislativa não possui um documento específico, mas diz que criou uma série de medidas internas para cumprir a lei que, no entendimento dos deputados, é "autoaplicável". Em 2012, a Assembleia designou um funcionário exclusivo para o atendimento aos pedidos, mas a pequena procura por informações fez com que esse aparato exclusivo para a LAI fosse desarticulado, de acordo com a assessoria de imprensa do órgão. A Assembleia recebe de 3 a 4 pedidos de informação por mês.

O Ministério Público também não tem documento específico, mas afirma que segue a regulamentação proposta pelo Conselho Nacional do Ministério Público. O Tribunal de Justiça (TJ-PR) não possui a regulamentação da Lei de Acesso.

A situação mais grave com relação à regulamentação está no interior, porque não há levantamentos sobre quais municípios tem algum tipo de implementação sobre isso.

No Paraná, das 17 cidades com mais de 100 mil habitantes, só três regulamentaram a lei. Não há nenhuma estimativa oficial sobre os municípios com menos de 100 mil habitantes no interior do estado. Das 399, 122 ingressaram no programa Brasil Transparente, da CGU, que promove capacitação e assessoramento para a implementação da lei.

De acordo com a CGU, o TCE-PR é o órgão responsável por acompanhar a transparência nos municípios e tem a atribuição, inclusive, de aplicar sanções caso sejam identificadas irregularidades. E é papel do Ministério Público instaurar um inquérito civil público contra o município, caso entenda que há omissão em relação à implementação das medidas obrigatórias.

Há um grupo de trabalho no TCE-PR, formado neste ano, que vai produzir o documento e promover a fiscalização da regulamentação nos municípios. O grupo deve atuar a partir de julho.

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