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Fernando Baiano, operador do PMDB: caminho até Eduardo Cunha. | Brunno Covello/Gazeta do Povo
Fernando Baiano, operador do PMDB: caminho até Eduardo Cunha.| Foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo

— O senhor tinha contas bancárias na Suíça? — quis saber o juiz. O réu se resguardou, exercendo o direito de não responder.

— Vou lhe mostrar um documento dessas contas que é um cartão de assinatura... Eu peço para o senhor dar uma olhadinha. É um documento datado de 23 de setembro de 2005...

Fernando Antonio Falcão Soares, alagoano de nascimento, Baiano para os amigos, acabara de completar 48 anos de idade, dos quais oito meses numa cela do Complexo Médico Penal, em Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, onde só vê a luz do dia pelo retângulo de barras de ferro incrustadas a dois metros do chão. Balbuciou um “Ok” enquanto recebia o documento bancário.

— Essa assinatura do lado do nome Fernando Antonio Falcão Soares é do senhor?

Absteve-se de explicar.

— Consta um débito nessa conta para uma outra, chamada Pentagram Energy Corporation. O senhor sabe quem que é o titular dessa conta Pentagram?

O simbolismo geométrico do pentagrama numa conta bancária suíça sob suspeita pode sugerir a dissimulação de cinco nomes, cinco sílabas ou apenas cinco letras de um nome. Sem resposta, seguiu-se outra relação de empresas, cujas denominações em inglês (Falcon, Hawk etc.) remetem à lembrança da ave de cabeça pequena, bico forte, curvo, e garras vigorosas.

Negociações

O acúmulo de evidências acabou estimulando Fernando Baiano a avaliar o futuro no presídio de Pinhais, no Paraná, já que ele está vinculado a outros processos por corrupção na Petrobras, um deles no Supremo Tribunal Federal. Na segunda quinzena de julho, Baiano começou a negociar um acordo de colaboração com os procuradores da Operação Lava Jato.

Mostra-se disposto a contar a história de um alagoano que, durante a década passada, trocou a parceria com operadores cariocas, como Jorge Luz, pela exclusividade no agenciamento de interesses obscuros de líderes do PMDB. As conversas entre Baiano, advogados e procuradores federais avançam, assim como as do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

Uma das condições apresentadas pelos advogados era uma significativa redução das penas. Acabou registrada por escrito pelo juiz na sentença da semana passada. Moro se referiu às gestões para o acordo: “Tem este juízo notícia de que Nestor Cerveró e Fernando Soares estariam negociando um acordo de colaboração com o Ministério Público Federal”.

Na sequência, disse ainda: “Esclareço que a presente sentença condenatória não impede essas negociações e a concessão de eventuais benefícios legais aos condenados, caso de fato se ultime algum acordo de colaboração (...). As normas legais são flexíveis o suficiente para permitir benefícios até amplos mesmo após uma condenação criminal.”

A lei da delação premiada abre a possibilidade até de perdão judicial, ainda que esse tipo de benefício não esteja previsto no acordo com o MPF. Na sentença, Moro fez questão de explicitar a garantia de que Baiano, como Cerveró, sequer precisaria se submeter a acareações com quem vier a denunciar.

O juiz não resistiu:

— O senhor tem alguma predileção por nomes de aves de rapina?

Falcão (ou Baiano) esboçou raro sorriso, e repetiu:

— Permaneço em silêncio.

Semana passada, dez dias depois desse interrogatório, ele recebeu uma sentença de 16 anos e quatro meses de prisão — similar à aplicada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) à empresária Katia Rabello, acionista do Banco Rural, por lavagem de dinheiro no caso do mensalão.

“A prova aqui é documental, clara como a luz do dia”, escreveu o juiz Sergio Moro, indicando a extensa documentação recebida da Justiça suíça sobre as transações de Fernando Baiano, reconhecido como operador financeiro de líderes do PMDB em negócios na Petrobras.

Baiano teve a pena agravada num dos processos porque até o último dia 17 não havia revelado o destino de metade do dinheiro embolsado como “consultor” num negócio de US$ 1,2 bilhão da Petrobras com os grupos Samsung Heavy Industries (Coreia do Sul) e Mitsui (Japão), para compra de dois navios-sonda. “A única consultoria efetivamente prestada foi a de negociar e pagar propina”, registrou Moro, indicando provas de que o custo da corrupção estava embutido no valor dos contratos.

O Ministério Público Federal segue o rastro deixado por Baiano nas praças financeiras de Estados Unidos, Grã-Bretanha, Espanha, França, Japão, China e Uruguai. Apenas pela operação de venda dos navios-sonda à Petrobras, Baiano recebeu cerca de US$ 30 milhões, que repassou para contas de diferentes empresas situadas em paraísos fiscais.

Suíça

Dividiu o dinheiro com o ex-diretor Internacional da Petrobras Nestor Cerveró e o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), segundo a denúncia já formulada pelo Ministério Público. Já foram localizados pouco mais de US$ 14 milhões, com auxílio das promotorias da Suíça e da França.

Estão em investigação no exterior outras contas usadas na lavagem da propina paga diretamente por Júlio Camargo, agente do estaleiro coreano Samsung, que construiu os navios para a Petrobras. Os documentos ainda não foram apresentados ao MP brasileiro.

Parte do dinheiro foi lavada em Nova York. Deverá resultar em processo criminal nos EUA. Júlio Camargo sacou US$ 3 milhões de uma conta que mantinha no banco Merrill Lynch.

Camargo estava numa “emergência”, confessou em juízo, para pagar subornos a Baiano e a Eduardo Cunha, que, nesse caso, eram parceiros do diretor da área Internacional da Petrobras.

Havia uma pendência de US$ 15 milhões. Baiano insistia na cobrança, enquanto o deputado Cunha pressionava na Câmara, induzindo órgãos públicos a investigar supostas irregularidades nas empresas que Camargo representava.

Em setembro de 2011, reuniram-se num escritório do Leblon: “Ele [Cunha], extremamente amistoso, dizia que ele não tinha nada pessoal contra mim, mas que havia um débito meu, e que isso estava atrapalhando”, contou Camargo, no tribunal.

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