Reajuste a servidores tem impacto eleitoral, dizem analistas
Não há consenso entre cientistas políticos consultados pela reportagem da Gazeta do Povo de que a redução do salário do prefeito Luciano Ducci (PSB) seja eleitoreira. "Neste momento, qualquer ação do prefeito, seja positiva ou negativa, vai influenciar a eleição", afirma a coordenadora da pós-graduação em Ciência Política da UFPR, Luciana Veiga. "Ele percebeu a rejeição do funcionalismo e tentou reverter esse processo. A poucos meses da eleição, é medida mais eleitoreira do que uma política salarial para o funcionalismo", diz o cientista político Ricardo Oliveira, também da UFPR.
O gestor do Observatório de Informações Municipais (OIM), François Bremaeker, com sede no Rio de Janeiro, tem um argumento semelhante ao de Luciana. "Se fosse por causa da eleição, ele daria o reajuste de 14% ou mais, e jogaria o custo da generosidade para o futuro."
Mas o professor Oliveira lembra que Ducci teve um desgaste com o funcionalismo recentemente, e a medida anunciada ontem ajudaria a diminuir a percepção negativa. Para ele, o aumento de 10% para os servidores enquanto a exigência era de 14% tenta corrigir a percepção de que o prefeito não estaria respeitando os servidores. "Ele sentiu o golpe, deu conta do prejuízo de imagem que estava sofrendo entre os servidores e está tentando mudar o panorama", diz Oliveira. Com a medida, Ducci busca diminuir a discrepância entre os salários dos comissionados e dos efetivos, uma situação que incomoda os servidores de carreira.
Para Luciana, o caráter supostamente eleitoreiro da medida depende da forma como se avalia a questão. "Essa é a estratégia dele, enquanto a da oposição é dizer que a administração não está boa e mostrar os pontos fracos", explica. Como prefeito que tenta a reeleição, Ducci tenta aumentar a satisfação do cidadão e, consequentemente, do eleitor. "Se for bem avaliado, leva a um aumento da chance de se reeleger. Mas esse reajuste orçamentário da mão de obra precisava ser feito."
De certa forma, o reajuste aos servidores alia o uso da máquina pública e o efeito simbólico da redução do próprio salário. "A diminuição é muito mais simbólica do que efetiva", diz Luciana. Para Oliveira, Ducci tenta desvincular sua imagem da dos parlamentares, pois a Câmara de Curitiba e a Assembleia Legislativa, que concederam reajustes recentes de salário e da verba de gabinete, respectivamente.
Vinicius Boreki e Rosana Félix
Pacotão
Confira os projetos que o prefeito Luciano Ducci (PSB) encaminhou ontem à Câmara de Curitiba:
- Redução de 30% do salário do prefeito de Curitiba de R$ 26.723,13 para R$ 18.706,19.
- Reajuste de 10% para todos os servidores municipais.
- Aumento do piso dos guardas municipais de R$ 1 mil para R$ 1,4 mil.
- Pagamento de gratificação para professores da rede municipal de educação.
A sete meses da eleição municipal, o prefeito de Curitiba, Luciano Ducci (PSB), encaminhou ontem à Câmara de Vereadores uma proposta de lei que reduz o próprio salário em 30% dos atuais R$ 26.723,13 (o teto do funcionalismo em todo o país) para R$ 18.706,16, o que representa uma diminuição de R$ 8.016,94 . Ducci que é pré-candidato à reeleição, também anunciou um "pacote de bondades" para os servidores públicos, que inclui um aumento de 10% para todos os 44 mil funcionários da prefeitura (veja os demais benefícios no quadro à direita). As medidas, porém, foram rejeitadas pelo funcionalismo municipal, que estuda entrar em greve a partir do dia 14 de março (leia mais na próxima página).
A oposição considerou que as medidas têm cunho eleitoreiro. Ducci contestou. Disse que a decisão de cortar o salário em 30%, por exemplo, apenas oficializa uma prática que ele já vinha adotando. "Simplesmente é a formalização do que venho fazendo desde que assumi a prefeitura [em março de 2010]."
Na ocasião, ao assumir a cadeira deixada por Beto Richa (PSDB), que renunciou para disputar o governo do estado, Ducci manteve a prática do antecessor de devolver aos cofres municipais parte de seus vencimentos mensais. Richa havia decidido fazer a devolução (que era de 20%) em 2007, quando a imprensa nacional divulgou que ele era o prefeito com o maior salário dentre as 26 capitais de estados.
À época, Richa enviou um projeto à Câmara para cortar o salário em 20% o que dispensaria a necessidade de fazer a devolução. Mas a proposta foi arquivada pelos vereadores sob a justificativa de que o salário do prefeito não poderia ser alterado durante o mandato situação igual à de Ducci. Além disso, argumentou-se que a redução dos vencimentos do prefeito poderia prejudicar os funcionários de carreira do município pois o teto do funcionalismo seria reduzido (o máximo que um servidor pode ganhar é o salário do prefeito).
Encarregada pelo projeto de redução do salário de Ducci, a procuradora-geral do município, Claudine Camargo Bettes, descartou qualquer prejuízo aos servidores de Curitiba e disse acreditar num desfecho positivo na Câmara. Segundo ela, alterações feitas ano passado na Lei Orgânica de Curitiba asseguram, hoje, a legalidade da redução salarial. Ela ainda disse que nenhum funcionário terá vencimentos diminuídos em função do novo teto. "Ninguém terá o salário reduzido porque nenhum servidor ganha próximo ao recebido pelo prefeito", disse ela.
O advogado Marcus Bittencourt, professor da Escola da Magistratura Federal do Paraná e membro da comissão de gestão pública da OAB do estado, diz que a diminuição de salários de servidores por causa do teto seria ilegal. A Constituição Federal garante a irredutibilidade dos vencimentos.
Apesar da redução do salário de Ducci, o prefeito de Curitiba ainda será o sétimo, dentre os dirigentes de 26 capitais, que mais ganha.
O "pacote de bondades" foi anunciado ontem pela manhã por Ducci em uma reunião com vereadores da base aliada. A intenção da prefeitura é que a Câmara Municipal aprove as propostas antes de 11 de abril, quando começa o período em que a legislação eleitoral proíbe reajuste a servidores.
"De 11 de abril até a posse dos eleitos [em 1.º de janeiro de 2013] não pode haver revisão geral da remuneração de servidores que vai além da recomposição da inflação", explicou o promotor eleitoral Armando Sobreiro. No caso do projeto de aumento aos servidores, o reajuste proposto (10%) está acima do índice inflacionário oficial do ano passado, que foi de 6,5%, segundo o IPCA.
Além do reajuste de 10% a todos os servidores, a prefeitura propõe pagar gratificações que variam de R$ 275 e R$ 550 aos professores. Já o piso salarial dos guardas municipais, pela proposta de Ducci, pode subir de R$ 1 mil para R$ 1,4 mil, reajustado gradativamente, até setembro.
O prefeito justificou os reajustes como uma forma de valorizar o funcionalismo. "Esse reajuste será o maior já concedido aos servidores de Curitiba desde a implementação do Plano Real no país [em 1994]."
Ducci ainda disse que o reajuste não vai comprometer investimentos na cidade nem as obras em andamento. O aumento proposto terá um impacto de R$ 90 milhões por ano na folha de pagamento da prefeitura. Segundo o município, o pagamento está sendo possível graças à redução de custos da administração.
Medidas do prefeito
Oposição critica; base defende
A oposição ao prefeito Luciano Ducci (PSB) na Câmara de Curitiba avaliou como eleitoreiros tanto o reajuste do funcionalismo quanto a diminuição do salário do prefeito. Mas a base aliada de Ducci defendeu as medidas.
"No ano passado, as discussões sobre os reajustes foram dificultadas ao máximo e, de repente, a prefeitura tem caixa para um aumento de 10%", disse o líder do PT na Câmara, o vereador Pedro Paulo (PT). Na avaliação dele, o prefeito faz uma tentativa de recuperar sua imagem com os servidores, que era bastante negativa. "Ele tem encontrado muitas dificuldades com os servidores. Essa decisão poderia ter sido tomada com antecedência."
O petista criticou ainda as projeções orçamentárias da administração municipal. "Nossos técnicos acertam com mais frequência do que a própria prefeitura os cálculos para saber qual a possibilidade de reajustes." Pedro Paulo disse ainda que não é papel do prefeito cortar o próprio salário.
Já o vereador Francisco Garcez (PSDB), da base aliada, afirma que a oposição defende o "quanto pior, melhor". "Eles [oposição] ficaram tristes com a medida porque perderam o discurso. É preferível corrigir as distorções do funcionalismo em vez de se preocupar com o viés eleitoral", afirmou.
Sobre a redução de 30% do salário do prefeito, Garcez alega que Ducci seguiu uma linha contrária à da maior parte dos políticos, inclusive os próprios vereadores de Curitiba que aumentaram o salário em 28% no ano passado. "A sociedade espera uma postura contrária aos aumentos", diz.
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