Faltando praticamente um mês para a decisão final dos senadores sobre o impeachment ou não da presidente da República afastada Dilma Rousseff, o cenário é favorável à permanência de Michel Temer. A opinião é de especialistas ouvidos pela reportagem da Gazeta do Povo.
Dentro do próprio Partido dos Trabalhadores (PT), alertam eles, já há um olhar mais voltado às eleições de 2018 do que aos planos de “resgate” da presidente Dilma.
“É claro que, na política, tudo é possível. Até mesmo ela conseguir os votos no Senado para retomar o mandato. Mas há um desinteresse [do PT] em salvar a presidente Dilma, o que é pior do que a impossibilidade de salvá-la”, responde o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), ao ser questionado sobre se a petista teria chances de reverter o quadro desfavorável.
“O campo majoritário do PT já entendeu que o segundo governo Dilma foi ruim e não quer ter o partido associado a isso, a desequilíbrio fiscal, a problemas de governabilidade. Brigar pelo retorno dela é como brigar pela recontratação do técnico Felipão após o 7 a 1”, compara ele.
A estratégia agora da legenda seria seguir para oposição ao governo Temer e apostar no fracasso da gestão peemedebista para disputar as eleições de 2018 com chance de vitória. “O PT está pensando no futuro do partido. Preferiram assimilar a derrota para não inviabilizar o partido”, reforça Caldas.
O cientista político Frederico Normanha, da Universidade de Campinas (Unicamp), tem visão semelhante. Para ele, um sinal de que o retorno da presidente afastada pode ser considerado um problema para o próprio PT é a ausência, até agora, da apresentação de uma agenda pós-impeachment, em um eventual governo Dilma.
“O complicado não é tanto convencer os seis senadores que faltam [para evitar o impeachment]. O complicado é o dia seguinte. O PT não chegou a explicar como seria a continuação do governo Dilma. Apenas disse que ela poderia chamar um plebiscito sobre novas eleições, mas isso não prosperou”, destaca ele.
Para o cientista político da Unicamp, uma eleição agora seria incerta “para todo mundo”. “Com a Lava Jato, com o ex-presidente Lula sendo investigado, o próprio PT não sabe se uma nova eleição agora seria a melhor saída. Resolveram deixar para 2018. É um tempo para as coisas se resolverem”, afirma Normanha.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve em Brasília recentemente para conversar com senadores. Ao mesmo tempo, a presidente afastada já foi vista levando parte de seus objetos pessoais para Porto Alegre (RS), onde deve morar se de fato deixar o Palácio do Alvorada.
Enquanto isso, um grupo de senadores – Gleisi Hoffmann (PT-PR), Lindbergh Farias (PT-RJ), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Fátima Bezerra (PT-RN) –, ao lado do ex-advogado geral da União José Eduardo Cardozo, seguem na linha de frente em defesa da presidente Dilma, na comissão especial do impeachment, em curso no Senado.
Placar
Para que a presidente Dilma seja afastada definitivamente é preciso que 54 dos 81 senadores votem a favor do impeachment. Em levantamentos realizados pela imprensa, 38 senadores já declararam que votarão a favor do impeachment e 18 confirmaram que são contra. O restante (25) prefere não divulgar o voto ou se diz indeciso.
Considerando a votação que resultou no afastamento temporário da presidente Dilma, em 12 de maio, o placar seria desfavorável à petista, mas dentro de uma margem pequena. Naquele dia, dos 78 senadores que estavam presentes, 55 votaram a favor do acolhimento do pedido de impeachment.
Desde então, ao assumir o governo federal de forma interina, Michel Temer vem acomodando indicações políticas na Esplanada dos Ministérios, o que leva senadores a calcularem informalmente que a presidente Dilma precisaria convencer ainda seis senadores a mudarem o voto, até o final de agosto, para impedir o impeachment.
Para analistas, política e economia vão pesar mais que critérios técnicos na decisão final
Especialistas entrevistados pela Gazeta do Povo afirmam que a política e a economia, mais do que critérios técnicos, é que vão determinar a decisão final sobre o impeachment de Dilma Rousseff. E, nesses dois aspectos, o cenário é desfavorável à petista.
Os analistas afirmam que Dilma obteve recentemente argumentos favoráveis a ela na discussão sobre as pedaladas fiscais e a edição de decretos orçamentários sem autorização do Legislativo – os dois objetos do pedido de impeachment por crimes de responsabilidade. Eles citam a perícia do Senado, a posição do Ministério Público Federal, e até novos entendimentos do Tribunal de Contas da União. Ainda assim, eles não acreditam que haja senadores capazes de mudar o voto pelo “convencimento técnico”.
“Era um julgamento que deveria ser jurídico e político, mas que só está sendo político. Os trabalhos da comissão especial do impeachment no Senado parecem mera formalidade”, aponta Antônio Augusto de Queiroz, analista político do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar). “Os senadores que não declararam voto ainda estão só valorizando o passe. Não estão realmente estudando o assunto”, completa ele.
Governo Temer
Para Antônio Augusto de Queiroz, do Diap, a disputa entre Dilma e Temer é desigual. “O afastamento dela atende em grande medida uma aspiração do mercado. O governo Temer tem agradado o mercado. Os senadores têm relação próxima com agentes econômicos. Se não surgir um fato novo, que abale a estrutura do governo interino, a tendência é que o impeachment seja confirmado”, acredita ele.
O cientista político Frederico Normanha, da Unicamp, também afirma que, “tecnicamente”, há um quadro mais favorável à presidente Dilma. “Mas, para afastar o impeachment, ela precisaria de aliados. E o governo Temer não está sendo um sucesso, mas ele tem aliados, e tem uma blindagem de parte da imprensa”, afirma ele.
A questão econômica também é um ponto observado pelo cientista político Ricardo Caldas, da UnB. “O governo Temer já lançou medidas. A volta do governo Dilma traria uma insegurança ao mercado, uma instabilidade política, que não interessa a mais ninguém”, avalia ele.
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