Pela primeira vez, uma pesquisa científica confirmou aquilo que médicos e pais já sabem há algum tempo: o acesso de jovens a websites que promovem desordens alimentares, como a anorexia, como se fossem um "estilo de vida" agravam a doença. Outro estudo também mostrou que, além de ser capaz de destruir a vida de adolescentes e adultos, o problema aparece -- e de forma especialmente grave -- em crianças.
As duas pesquisas foram feitas pelo mesmo grupo de cientistas, da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e publicadas neste mês em duas revistas científicas diferentes. O primeiro, no "Journal of Pediatrics." O segundo, no "Journal of Adolescent Health." Os pesquisadores alertam que é preciso prestar especial atenção nesses dois pontos-chave: o uso da Internet de jovens com sinais de problemas alimentares e uma perda de peso em crianças que parecem ser completamente saudáveis.
No primeiro estudo, 76 pacientes diagnosticados com transtornos alimentares entre 1997 e 2004 , com idades entre 10 e 22 anos, e 106 familiares responderam um questionário anônimo sobre o uso da web em suas casas.
Cerca de metade dos pacientes afirmou que já tinha visitado sites sobre problemas alimentares. Dos que freqüentaram páginas a favor dos transtornos, 96% afirmaram que aprenderam novas técnicas para fazer dieta e vomitar. Em comparação com as demais, essas pessoas também tinham a doença por um período de tempo mais longo, passavam menos tempo em atividades escolares e cada vez mais tempo online.
Embora o impacto dos sites "pró-transtornos" já fosse esperado, os cientistas se surpreenderam ao ver que mesmo páginas dedicadas a ajudar pacientes a se recuperarem acabavam atrapalhando. Das pessoas que visitavam esses sites, quase 50% afirmaram que acabaram aprendendo também ali novos métodos para perder peso.
Entre os pais, cerca de metade sabia da existência de sites a favor de doenças como anorexia e bulimia. No entanto, apenas 28% já tinham discutido o assunto com os filhos. E só 20% deles afirmaram que impunham limites ou no tempo que o jovem passava online ou no conteúdo dos sites que visitava.
Segundo uma das autoras do estudo, a pediatra Rebeca Peebles, da mesma maneira que os pais não costumam permitir que os filhos saiam com desconhecidos, não deveriam deixá-los livres para fazer o que bem entendem na Internet. Ela aponta que adolescentes não vêem muita diferença entre amigos do "mundo real" e pessoas que eles conhecem apenas virtualmente.
No segundo estudo, a mesma equipe de cientistas descobriu que crianças com transtornos alimentares perdem peso muito mais facilmente e rapidamente do que adolescentes. E, para piorar, nelas, a doença acaba adquirindo características próprias, o que dificulta o diagnóstico.
Segundo os pesquisadores, os critérios para a verificação da presença de anorexia ou bulimia não se aplicam às crianças e aos pré-adolescentes, porque se concentram em informações como o índice de massa corporal. A falta de comida, nessa idade, pode afetar a altura que a criança tem, o que torna impossível a aplicação dessas técnicas de diagnóstico. Mesmo que a criança pareça estar em um peso adequado, é possível que, sem o transtorno alimentar, ela fosse mais alta e mais pesada.
Outra diferença é que, enquanto adolescentes e adultos tem problemas alimentares porque querem perder peso e se acham gordos, as crianças com transtornos dificilmente conseguem explicar porque não comem. Segundo Peebles, na maioria dos casos, elas nem sequer sabem. A doença pode ser, nesse caso, uma forma da criança demonstrar que simplesmente não quer crescer. E, quando é assim, a maioria dos casos ocorre entre meninos, e não entre meninas, ao contrário do que acontece com pacientes de mais idade.
Para a equipe, perda de peso na infância precisa ser levada à sério. Crianças, por estarem em fase de crescimento, estão sempre ganhando peso. Se elas manifestam desejo de emagrecer, é um sinal de alerta.