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Se eleito presidente da República este ano, a primeira medida econômica de José Serra à frente do cargo seria um profundo ajuste fiscal para dar mais poder de investimento ao Estado brasileiro.

De acordo com dois importantes interlocutores da campanha do pré-candidato do PSDB, o arranjo envolveria a renegociação de contratos e o corte de despesas da máquina pública, mas preservaria os gastos sociais.

A fonte, que pediu anonimato, não especificou que empreendimentos ou programas poderiam ser revistos, mas recorreu ao histórico do tucano na busca de melhor eficiência de gestão.

Quando assumiu a prefeitura de São Paulo (2005) das mãos do PT, realizou uma faxina e baixou os preços de uma lista de compromissos. Ao chegar ao comando do maior Estado brasileiro (2007), assinou dois decretos. O primeiro renegociava contratos de energia, construtoras e outros. O segundo eliminava 4.218 cargos de confiança. Com a revisão contratual daquele ano, sua administração economizou 602,3 milhões de reais, conforme dados oficiais.

Não por acaso, fez isso nos primeiros dias de trabalho.

"Ele vai entrar com medidas fiscais e até renegociação de alguns contratos. As despesas da máquina pública estão sob um controle muito frouxo... Fará isso preservando todos os gastos sociais como o Bolsa-Família", disse a fonte.

É crescente o volume de críticas ao pouco rigor fiscal do atual governo federal. A economia para pagamento da dívida do país caiu quase 40 por cento em 2009 frente o ano anterior. Foi o pior resultado da série histórica iniciada em 2001.

Os números foram afetados por aumento de despesas da máquina, queda da arrecadação em meio à crise mundial e sucessivas desonerações fiscais implementadas para dinamizar e conferir fôlego à atividade doméstica.

Apesar de declarações de integrantes da equipe do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no sentido de retomar a meta de superávit primário de 3,3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano, pouca coisa foi feita. Em 12 meses até fevereiro, a economia para pagar juros era de 2,21 por cento do PIB.

No público e no privado, Serra é famoso por suas posições fortes e renega a fama de controlador há tanto tempo alimentada. Mas nem mesmo o mais próximo dos amigos esconde uma máxima reveladora: "ele será o ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central de seu próprio governo".

Se vitorioso nas urnas em outubro contra o nome do PT para a disputa, Dilma Rousseff, o tripé meta de inflação/câmbio flutuante/superávit primário seria resguardado, entretanto com nuances diferentes do atual governo. O perfil da política econômica atualmente em discussão na campanha indica uma vigilância ativa sobre a cotação do real perante o dólar.

"Não acredito que Serra vai querer pegar a taxa de câmbio e levar a 2 reais. Em um primeiro momento, vai tentar jogar com as expectativas ao indicar que gostaria de uma cotação em determinado nível e deixar o jogo caminhar", acrescentou o interlocutor.

O papel dos bancos públicos --crucial para manter a oferta de crédito nos momentos mais agudos da crise financeira internacional-- seria relativizado.

Na opinião deste e de outro integrante da equipe tucana, a decisão de fortalecer essas instituições financeiras funcionou naquele período. Agora, porém, contribuem para aumentar a pressão inflacionária ao aquecer em demasia a atividade.

Seria, portanto, como um remédio que vira veneno pelo excesso da dosagem. "Não acho que os bancos públicos precisam ter uma política tão protagonista neste pós-crise", disse a fonte.

Uma atuação menos arrojada, inclusive, poderia ser um dos caminhos para evitar a alta da taxa de juros a fim de controlar a inflação e as expectativas de preços. Há na percepção desse time a avaliação de que outros mecanismos --como depósitos compulsórios, limite da oferta e do prazo de financiamentos e da elegibilidade de impostos-- podem ser usados a este fim.

Leia, a seguir, alguns dos posicionamentos de quem debate com Serra a política econômica caso vença as eleições.

Autonomia do Banco Central

Serra já considera o BC uma entidade independente e não pretende conferir autonomia operacional formal. Segundo interlocutores, são "muito difíceis" as chances de nomear um representante do mercado financeiro para presidir a instituição, mas poderia indicar diretores vindos dele.

Câmbio

Os sinais são de maior intervenção contra uma apreciação do real. Serra é um crítico das taxas de câmbio praticadas no atual governo. Chegou a defender controle cambial no passado, mas abandonou a ideia nos últimos anos.

"Não acredito que o Serra vai querer pegar a taxa de câmbio e levar a 2 reais... Também não vai deixar chegar a 1,50 real." Na última sexta-feira, o dólar fechou a 1,762 real.

Desde o início do governo Lula, o dólar caiu ao redor de 50 por cento, tendo a cotação mínima alcançado 1,56 real em julho de 2008.

Ainda assim, o governo manteve como política de intervenção leilões do Banco Central no mercado à vista e futuro. O aprofundamento da crise reverteu a trajetória de queda do dólar ante o real, com a cotação chegando a superar 2 reais, e o governo alterou alíquotas do recolhimento compulsório. Também realizou operações para facilitar o crédito ao exportador, mas não deixou de comprar dólares no segmento à vista. Em 2009, com as condições de crédito externo e o ambiente financeiro mundial melhorando, o dólar voltou a recuar.

Quando a cotação ameaçou cair abaixo de 1,70 real no fechamento, o governo adotou o IOF para aplicações de estrangeiros em ações e renda fixa no país. A criação do Fundo Soberano seria mais um instrumento para compra de dólar, mas ainda não se verificou operações para esse fim influenciando o preço da moeda.

Há simpatia na equipe de Serra para que Banco do Brasil, Banco Central e Tesouro Nacional (visando compor o Fundo Soberano) comprem dólares além do fluxo excedente para evitar uma apreciação expressiva do real. "Temos que fazer uma política de mesa de operação... para não deixar todo mundo esperando a mesma coisa."

As reservas, acima de 246 bilhões de dólares, estão em nível adequado e foram importantes para proteger o Brasil na crise, mas um eventual aumento delas para conter a valorização do real não é descartada. "Melhor ter um ônus fiscal de reservas do que ter o real apreciado."

Fluxo de capitais

Vê o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) como alternativa de política econômica, apesar de considerar que a taxação de 2 por cento aplicada pelo governo no ano passado para controlar a entrada de dólares no país teve uma eficácia muito restrita. Foi, porém, importante para sinalizar o patamar da taxa de câmbio desejado pelo Executivo.

Juros

Integrantes da equipe avaliam que se firmou durante o governo Lula uma supremacia da taxa de juros e ponderam que há outros mecanismos, como volume de crédito oferecido pelos bancos oficiais e nível de compulsório, que podem ser usados para conter a inflação. No atual cenário, uma taxa de 12 por cento para a Selic no fim do ano é realista.

"Crescer sem ter as bases colocadas para crescer é um grande problema... teria que ter um investimento expressivo em infraestrutura."

Bancos públicos

Na visão desses dois economistas, banco estatal é para cobrir nichos em que o mercado não entra ou para moderar o próprio mercado. "Bancos geridos pelo setor público têm determinadas tarefas a cumprir." Sobre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), defendem que a instituição de fomento tenha um papel forte, mas como indutora de investimentos. "Muitos recursos hoje vão para o exterior ou servem para a consolidação patrimonial (fusões e aquisições)", argumentou uma das fontes.

Desoneração

A equipe que acompanha Serra considera exagerados os estímulos fiscais dados pelo governo Lula durante a crise. "Não precisava dar para toda a linha branca e depois para móveis... No caso dos automóveis, poderia ter parado quando estabilizou."

Reformas

Discussões sobre as reformas estruturais estão em fase bastante inicial na equipe tucana e seus interlocutores apostam pouco na concretização de reformas como a tributária, a política e a previdenciária. Também não há definição de como a campanha se posicionará em relação ao marco legal das agências reguladoras.

Serra prefere gastar energia fazendo obras ou em grandes programas sociais do que apostar em matérias de difícil consenso. "Ele amaria ser o pai da reforma tributária, mas só tentaria se tivesse controle total do processo." Há, porém, mudanças que podem ser feitas sem implicar alterações constitucionais, como desonerar investimento e folha de pagamento.

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