Depois de dois anos e sete meses de embates, negociações e intensos lobbys, a Câmara Federal começou a votar na noite desta terça-feria (25) o texto principal do Marco Civil da Internet. A proposta é uma espécie de Constituição, estabelecendo princípios, garantias, direitos e deveres na rede. Ao longo do dia, o governo e os líderes partidários reforçaram os debates e indicam que devem aprovar o projeto sem grandes alterações. A sugestão de mudança sobre a liberdade de expressão foi retirada, mantendo a previsão para que os provedores sejam responsabilizados por conteúdo de terceiros caso ignorem decisão judicial e não uma mera notificação para retirá-lo do ar. Isso vale, por exemplo, em casos de vídeos de trechos de programas de televisão e filmes.
O Marco Civil da Internet se tornou polêmico uma vez que eram contrários os interesses do Planalto, das empresas de telecomunicações, sites de internet, Polícia Federal e Ministério Público, além das entidades de defesa do consumidor.Com tantas frentes envolvidas e longe de um consenso, a matéria chegou bloquear por cinco meses a votação de outras propostas na Câmara dos Deputados.
Nas últimas semanas, o governo cedeu em pontos prioritários e negociou cargos, liberação de recursos para obras apadrinhadas por congressistas no orçamento numa tentativa de esvaziar a rebelião de aliados na Câmara e avançar com a discussão da matéria, considerada vital para reforçar o discurso de Dilma Rousseff contra a espionagem.
Em abril, o Brasil sediará conferência internacional sobre governança na internet, e o governo quer apresentar a nova lei durante o evento. A maior resistência ao texto foi puxada pelo PMDB que defendia mudanças nos termos da neutralidade da rede jargão utilizado para determinar que a velocidade de conexão contratada não pode variar de acordo com o site ou serviço acessado pelo usuário.
Trata-se de uma medida popular para os usuários, mas contestada pelas empresas de telefonia, que gostariam de comercializar pacotes de acordo com o consumo de cada usuário. O governo flexibilizou a regulamentação da medida para atender o PMDB e destravar a votação. O Planalto aceitou ajustar as normas para regulamentação da neutralidade e estabeleceu que um decreto presidencial detalhará o conceito da neutralidade, sem inovar no conteúdo.
Nos bastidores, a medida foi interpretada como uma saída honrosa para o PMDB.A regulamentação será feita após consulta à Anatel e ao Comitê Gestar da Internet.Outra modificação patrocinada pelo governo para evitar uma derrota na Câmara foi a retirada da exigência de nacionalização dos centros de armazenamento dos dados dos usuários.
Essa era uma das medidas defendidas pela presidente Dilma Rousseff como forma de responder às notícias de espionagem dos EUA contra autoridades brasileiras. A versão inicial determinava que um decreto do Executivo regulamentaria a obrigação de empresas como Google e Facebook manterem no país estrutura de armazenamento de dados de usuários. Para isso, elas teriam de replicar no país uma estrutura semelhante às que mantém em outros países, como os EUA. Segundo o governo, a medida daria maior proteção aos dados do país. Ficou definido, porém, que os dados ficam submetidos à legislação brasileira.
Há meses, empresas de tecnologia patrocinam lobby nos gabinetes do Congresso para derrubar a exigência, sob argumento de que representaria gastos exorbitantes.
Andamento
Mesmo sem garantir a implementação de data centers no país, a presidente quer usar o marco como bandeira internacional, para a defesa da comunicação na rede, confrontando as denúncias de violações de suas comunicações eletrônicas e telefônicas por parte da agência americana de segurança.
O governo vai trabalhar para acelerar a votação da proposta no Senado já que o projeto é vital para reforçar o discurso de Dilma Rousseff contra a espionagem. Em abril, o Brasil sediará conferência internacional sobre governança na internet, e o governo quer apresentar a nova lei durante o evento. O senador Walter Pinheiro (PT-BA) deve ser o relator do projeto.