Transferências de detentos e prisões de líderes da quadrilha podem ser apenas a ponta visível do 'iceberg' que incomoda o crime organizado em São Paulo. A CPI do Tráfico de Armas está indo mais longe do que se imaginava e pôs o dedo na ferida: pediu ao Banco Central para rastrear a movimentação financeira de 30 contas de suspeitos de administrar dinheiro do crime organizado no estado e de negociarem armas e drogas. Entre os suspeitos, estão 14 advogados e quatro deles já estão presos. A CPI descobriu que boa parte do dinheiro movimentado vêm do aluguel de um arsenal de armas a quadrilhas. Os criminosos pagam o 'aluguel' com o valor obtido em assaltos a seqüestros.
- A negociação de armas e drogas é feita pelos advogados. O celular é usado só pelos bagrinhos, para conversa miúda. Já descobrimos que, em mais de uma circunstância, os advogados levaram aos presos fotos de armamento tiradas com câmeras de celular para que eles encomendassem o armamento. Agora, estamos no rastro do dinheiro da quadrilha - disse o deputado Paulo Pimenta, relator da CPI.
O presidente da CPI, deputado Moroni Torgan, disse à rádio CBN que o trabalho da CPI de identificar as contas bancárias pode ter contribuído para nova onda de ataques desta quarta-feira, assim como o objetivo de transferir líderes da facção para o presídio federal de Catanduvas, no Paraná.
Para o pesquisador Paulo de Mesquita Neto, do Núcleo de Estudos de Violência da USP, só quebrando a espinha financeira do crime organizado é que se começará a resolver a crise da segurança pública em São Paulo.
- O governo federal deveria atuar combatendo o crime organizado, indo atrás do dinheiro que circula nas mãos dos líderes do crime. O envio de tropas a São Paulo não ajuda muito, aliás cria até mais confusão - afirma.
Além de rastrear o dinheiro dos criminosos, a CPI das Armas mexeu com mais pilares da estrutura do crime organizado. Foi revelado, por exemplo, o envolvimento de advogados da facção e policiais. A advogada de Marcos Camacho, o Marcola, Maria Cristina Rachado, é mulher de um delegado, que acabou sendo afastado da polícia paulista depois que se descobriu o parentesco.
Também saiu da CPI a lista com nomes de advogados que fizeram mais de uma dezena visitas, num mesmo dia, a mais de um integrante do bando. Tanto Maria Cristina quanto o advogado Sérgio Wesley, acusados de obter por meio de suborno um depoimento sigiloso prestado à CPI, estão tendo suas movimentações financeiras rastreadas.
Nesta quarta-feira, a CPI ouviu o empresário Eduardo Diamante, dono de uma empresa de bolas confeccionadas dentro de presídios paulistas. Ele admitiu que é sócio de Bruno Pascini, condenado há 13 anos por homicídio. Segundo a CPI, eram fabricadas 30 mil bolas por mês e pelo menos 500 voltavam com supostos defeitos. Cada uma delas sai com uma numeração que identifica a penitenciária e o número do preso que a fabricou. Ao retornar, de acordo com Pimenta, essas bolas podem entregar ao preso armas e drogas em seu interior, já que entram sem vistoria.
Diamante foi flagrado negociando dinheiro por celular com um detento.
Também está sendo ouvido nesta quarta-feira o advogado Nelson Roberto Vinhas, preso no mês passado em Mauá, na Grande São Paulo, ao tentar entrar com seis celulares num presídio de Mauá.
Pascini, o sócio da fábrica de bolas, cumpre pena semi-aberta por ter mandado matar a mulher e exercido cargo ilegal de médico. A mulher dele foi morta em 1993 com 11 tiros, disparados por dois ex-policiais. Segundo o Ministério Público, Diamante e Pascini fazem parte da facção criminosa e implantaram o mesmo esquema em vários presídios da região de Presidente Prudente.
O MP quer que a Secretaria de Administração Penitenciária explique como foi feito o contrato com a empresa. A promotoria desconfia de que se trata de um contrato informal.
O MP denunciou ainda as advogadas as advogadas Valéria Dammous e Libânia Costa por envolvimento com o crime. Elas são acusadas de levar ordens de promover rebeliões em presídios. Por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a advogada Libânia Costa o direito de permanecer em silêncio durante depoimento à CPI.
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