A prática de pagar bolsas-auxílio para magistrados se alastrou pela Justiça Estadual nos últimos anos. Em 2009, o Judiciário dos estados destinava 3,4% das despesas totais para pagamento de benefícios. Em 2014, o porcentual passou a 5,9%. No Paraná, a escalada foi ainda maior. A parcela destinada às vantagens eventuais no Tribunal de Justiça (TJ-PR) passou de 0,03% do orçamento para 6,2% no ano passado, conforme o estudo Justiça em Números, divulgado na semana passada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Tendência é de ampliação
A depender das discussões travadas no Supremo Tribunal Federal (STF), o pagamento de benefícios será institucionalizado e até ampliado. O projeto da nova Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman) prevê uma série de vantagens, como reembolso de despesas médicas e odontológicas não cobertas pelo plano de saúde. O texto ainda está em discussão no STF e só depois será enviado ao Congresso. A atual Loman prevê simetria entre as carreiras da Justiça e do Ministério Público. Assim, qualquer ampliação de benefícios acarretaria num efeito cascata sobre outras categorias.
Altos salários desestimulam a corrupção, diz analista
Ricardo Caldas, economista e cientista político, afirma que o pagamento de bons salários desestimula a corrupção. “Quanto mais bem pago for o juiz, menos propenso ele estará a cometer ilegalidades. Isso é bastante claro nos estudos sobre corrupção”, diz ele, que é professor na Universidade de Brasília (UnB). Para ele, o ideal seria que o salário cobrisse todos os benefícios, de forma transparente. “A sociedade acha ruim salário de R$ 30 mil. Então aparece um salário de R$ 20 mil mais R$ 2 mil de auxílio-moradia, mais R$ 1 mil para comprar toga e assim vai”, explica.
Segundo Caldas, o Judiciário está se valendo de um momento de fragilidade do Executivo para impor sua agenda. A pesquisa de confiança nas instituições, por exemplo, mostrava que o governo federal tinha índice de 53 em 2009, e o Judiciário, de 52. Agora, em 2015, esses indicadores caíram para 30 e 46, respectivamente, mostrando que a imagem da Justiça está melhor.
Sem preço
Fernando de Castro Fontainha, da UERJ, não concorda com a discussão sobre salário e suscetibilidade à corrupção. Para ele, não é possível determinar um “preço” para a honestidade. (RF)
Infográfico: confira o plus nos salários
Em 2009, o pagamento de benefícios consumiu apenas R$ 280 mil das despesas totais do TJ-PR: R$ 777,4 milhões. Em 2014, foram R$ 116,1 milhões com auxílio-moradia, alimentação, transporte, pré-escola, saúde, natalidade, ajuda de custo e outros, de um orçamento total de R$ R$ 1,8 bilhão.
O relatório Justiça em Números dá destaque à participação dos gastos com benefícios nas despesas com pessoal. Em 2014, os tribunais estaduais que mais gastaram com pagamento de vantagens foram o da Paraíba (14,1%); Roraima (12,7%); e Maranhão (12,5%).
Mas o CNJ faz uma divisão de acordo com o porte das instituições. Entre os cinco tribunais estaduais de grande porte, o Paraná foi o segundo que mais pagou benefícios em 2014, atrás apenas do Rio de Janeiro, que tem algumas particularidades. Segundo uma fonte do TJ-RJ que pediu anonimato, os auxílios são garantidos pela arrecadação com a administração dos depósitos judiciais. Os depósitos, que ficam no Banco do Brasil, rendem cerca de R$ 48 milhões ao mês, além de R$ 5 milhões de receitas com aplicações financeiras.
Nessa comparação do CNJ entre os tribunais de grande porte, o do Rio gasta 10,6% das despesas de recursos humanos em vantagens eventuais, seguido pelo Paraná (6,8%), São Paulo (5,9%), Minas Gerais (5%) e Rio Grande do Sul (1,7%).
Privilégios
Professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Fernando de Castro Fontainha critica a proliferação de “penduricalhos” em salários de desembargadores. “Se forem benefícios exclusivos de juízes, representam, basicamente, privilégios”, diz. Ele afirma que, legalmente, não há o que falar sobre a situação. “Não tenho interesse em discutir a constitucionalidade do pagamento ao Judiciário uma vez que é o próprio Judiciário que decide o que é legal e o que não. Mas se trata de imoralidade”, acrescenta.
Fontainha avalia que a manutenção desses benefícios depende de negociações com Legislativo e Executivo, e que isso fragiliza o Judiciário. “Quando precisar julgar um político, e isso acontece diariamente, com que independência o juiz vai agir?”, questiona.
Outro lado
O TJ-PR foi procurado desde quarta-feira (23), mas até o fechamento desta edição não se pronunciou a respeito dos questionamentos feitos.
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