Shirin Ebadi: alerta de que o Irã pode se transformar na nova Líbia se nada for feito pela comunidade internacional| Foto: Fabrice Coffrini /AFP

Genebra - Pela primeira vez o governo brasileiro abriu as portas de sua diplomacia para a maior opositora do regime do presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad – a dissidente Shirin Ebadi, Prêmio Nobel da Paz em 2003, perseguida pelo governo do Irã e refugiada na Europa. A forma encontrada pela diplomacia do Brasil para tomar esse passo foi a realização de um almoço em homenagem à dissidente, ontem, em Genebra, na Suíça, pela missão do Brasil perante a Organização das Nações Unidas (ONU).

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O gesto político e diplomático foi interpretado como o fim da política de vistas grossas para a repressão no Irã. Também serviria para alertar Teerã de que o Brasil está finalmente disposto a escutar o que os dissidentes têm a dizer. O governo iraniano não escondeu a irritação e interpretou a atitude como um recado claro do Brasil de que, em direitos humanos, a lua de mel entre os dois países acabou.

Durante o almoço, Shirin Ebadi alertou para o risco de a repressão no Irã crescer: "Se a comunidade internacional não agir, o Irã em breve se transformará numa nova Líbia". "Se o Brasil e a comunidade internacional não querem mais uma Líbia, precisam começar a nos mover imediatamente para promover um novo diálogo com Ahmadinejad, antes que ele siga o caminho de Muamar Kadafi. O povo no Irã não vai silenciar e o governo, de outro lado, continuará com seu massacre", alertou.

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Também participaram do encontro embaixadores de países como Estados Unidos e de outras nações que defendem uma posição brasileira mais dura contra o Irã. A dissidente aproveitou a oportunidade para pedir ao Brasil e aos Estados Unidos que adotem sanções políticas contra membros do regime de Ahmadinejad, como a negação de vistos para políticos e congelamento de ativos financeiros de pessoas envolvidas na repressão.

A vencedora do Prêmio Nobel ainda defendeu a ideia de os EUA e a Europa de estabelecer na ONU um relator internacional que investigue as violações de direitos humanos no Irã. "Precisamos dessa investigação para abrir uma nova etapa do diálogo com o Irã. Isso seria um sinal importante para o povo iraniano que sofre com a repressão", disse ela.

A proposta vai à votação no dia 21 e o Brasil já indicou que poderá rever sua resistência a isso – algo impensável durante o governo Lula. A embaixadora do Brasil, Maria Nazareth Farani Azevedo, que promovia o almoço, declarou aos convidados que o país "apoiava" a posição da dissidente iraniana.

Mudança de rumo

Durante o governo de Lula, a opção do Itamaraty foi a de manter um diálogo apenas com o governo de Ahmadinejad e o brasileiro chegou a criticar a oposição iraniana, classificando seus integrantes de simples "perdedores" que não aceitavam o resultado das eleições – o presidente do Irã venceu um pleito no qual pairam fortes suspeitas de fraudes. Na ocasião, Shirin Ebadi alertou que Lula estava ofendendo o povo iraniano ao não atender aos apelos da oposição.

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Com a mudança de governo no Brasil, o Itamaraty decidiu rever a posição do país em matéria de direitos humanos. Ontem, ao serem informados da reunião entre a dissidente e o governo brasileiro, diplomatas iranianos admitiram que o almoço foi um recado duro do Brasil a Teerã. Segundo diplomatas iranianos, receber Shirin Ebadi teria a mesma repercussão política no Irã que a China aceitar que o dalai-lama seja recebido por governos estrangeiros.

Já as ONGs comemoraram a atitude do Brasil. "Não temos ainda garantia de que o Brasil apoiará a abertura da investigação contra o Irã. Mas abrir suas portas aos dissidentes já é um grande passo", afirmou a assessoria de imprensa da Federação Internacional de Direitos Humanos, uma das entidades envolvidas na organização do encontro.

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