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A polícia do Paraná recebeu carta branca da Justiça do estado para monitorar qualquer telefone do Brasil 24 horas por dia durante sete dias por semana. Em alguns casos, o rastreamento pode ocorrer de seis meses a até um ano. Não se trata de qualquer interceptação ilegal. Com ordem judicial, todas as operadoras de telefonia celular e fixa são obrigadas a fornecer senhas que permitam acesso aos dados cadastrais dos clientes em todo o território nacional. Essas senhas são solicitadas para fins investigatórios.

A reportagem da Gazeta do Povo apurou que pelo menos 18 autoridades policiais tiveram esse tipo de poder nas mãos no Paraná. De posse das senhas, esses "homens da lei" têm acesso aos dados cadastrais dos clientes de todas as operadoras de telefonia do país, à localização geográfica dos telefones interceptados e a um relatório de ligações (bilhetagem) feitas e recebidas por um determinado número de telefone. Dessa forma, é possível saber quem fez a ligação, quando, de onde e quanto tempo durou o telefonema. O teor das conversas, no entanto, permanece inviolável.

Fontes da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) afirmaram que a divulgação dessas senhas abre brecha para o grampo ilegal. "Trabalhamos sempre com o pensamento de que a utilização desses dados servirá para o combate ao crime organizado. Mas não podemos ser inocentes. Existe corrupção dentro da polícia e aqui no Paraná não é diferente", disse um delegado federal que pediu para não ser identificado.

Apesar de não ter acesso às conversas dos usuários, o setor jurídico da operadora Brasil Telecom considerou abusivas as diversas ordens da Justiça determinando a divulgação das senhas e ingressou com 11 habeas corpus preventivos no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ) – a maioria deles em 2008. Os advogados da Brasil Telecom alegaram que a ordem judicial é genérica; sem fundamentação concreta; inconstitucional; fere a intimidade dos usuários de telefonia; confere amplo poder às autoridades policiais para fins de utilização indistinta em investigações nem sequer informadas pela polícia; e o prazo para concessão das senhas é exorbitante (até um ano). Em todos os pedidos o TJ cassou a determinação da Justiça, concedendo o habeas corpus à concessionária de telefonia.

Em um dos despachos – concedido no dia 27 de março deste ano pela 2ª Câmara Criminal do TJ –, a desembargadora Lílian Romero reconheceu que a divulgação das senhas para autoridades policiais pode ser de extrema valia para identificar os integrantes de uma rede criminosa. Por outro, segundo ela, "possibilita também a identificação de todo o círculo de relações de qualquer cidadão, inclusive, por exemplo, o de um homem casado com mulheres solteiras, sujeitando-o a chantagens e extorsão em caso de vazamento da informação".

A desembargadora entendeu que a ordem judicial determinando o fornecimento das senhas carece de motivação e é extremamente genérica. "Não faz qualquer menção à necessidade da providência nem a vinculou a determinada investigação policial. Portanto, implicitamente, autorizou a quebra do sigilo em qualquer investigação – ou até sem a sua existência – e abrangeu a totalidade dos usuários de todas as concessionárias de telefonia", disse Lílian Romero. Em entrevista à Gazeta do Povo, a desembargadora comparou a concessão da senha a um cheque em branco. "Possibilita, em tese, que qualquer número de telefone no país seja monitorado. Isso é temerário." De acordo com ela, o que se questiona é a divulgação generalizada das senhas sem identificação dos donos dos telefones e por um tempo prolongado sem que sequer se mencione a investigação em curso.

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