O ministro Gilson Dipp, cercado de repórteres: problema dos cartórios do Paraná já é bem conhecido do CNJ| Foto: Albari Rosa/ Gazeta do Povo

A inspeção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no Paraná pode levantar casos pontuais de um problema muito sério no estado, que já é de conhecimento da alta cúpula do Judiciário nacional. "As serventias (cartórios) extrajudiciais constituem um dos graves problemas do Judiciário do Paraná", declarou ontem o ministro Gilson Dipp, corregedor nacional de Justiça.

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As declarações de Dipp foram feitas antes da audiência pública que o CNJ promoveu em Curitiba para ouvir reclamações da população sobre a Justiça do estado. Durante a audiência, o bacharel em Direito José Eduardo de Moraes fez uma grave denúncia contra um titular de cartório. Segundo Moraes, essa pessoa controla, direta ou indiretamente, cinco serventias extrajudiciais no Paraná. "Como alguém pode administrar cinco cartórios?", questionou na audiência, que reuniu cerca de 400 pessoas. Acumular mais de um cartório é proibido por lei. A vaga de titular da serventia deve ser ocupada por meio de concurso feito pelo TJ.

Dipp, antes de informado desse fato, disse que as questões relacionadas a cartórios no Paraná já são bem conhecidas do CNJ. "Isso não está sendo constatado na inspeção. Esse é um fato sedimentado e consolidado no conselho, devido ao grande número de impugnações a concursos e permutas de cartórios que correm lá (no Paraná)."

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O corregedor também criticou os cartórios judiciais privados do estado. "Esse é outro problema que vamos examinar com muito carinho. O ideal é que a serventia (cartório) seja estatizada. O Paraná deve ser o estado que mais tem cartórios judiciais privatizados", observou Dipp.

De acordo com o presidente da OAB-PR, Alberto de Paula Ma­­chado, o Judiciário precisa ter pleno controle da atividade cartorária. "Não podemos admitir que os procedimentos sejam definidos pelos titulares das serventias. É inaceitável que eles ditem as regras", disse. Durante a audiência pública, outros advogados reclamaram da falta de capacitação de parte dos trabalhadores dos cartórios.

O presidente do TJ, desembargador Carlos Hoffmann, disse que o Tribunal aguarda o resultado do mapeamento que o CNJ está fazendo dos cartórios de todo o Brasil para saber, exatamente, quantos pessoas ocupam cargos de serventuários indevidamente. A Constituição de 1988 determina que os titulares das serventias precisam passar por concurso público, mesmo quando são transferidos ou removidos – o que não ocorreu em vários casos no Paraná.

Já o procurador de Justiça Lineu Kirchner, do Ministério Público do Paraná, preferiu desvincular do Judiciário as críticas aos cartórios: "O sistema cartorial é sinônimo de vícios e mazelas em nosso país, mas que não se compare isso com o Judiciário".

Juízes reclamam que a audiência só mostrou o lado ruim

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Em uma audiência pública marcada por muitas reclamações, alguns desembargadores também quiseram se manifestar. Mas o protesto deles foi justamente contra a forma de o CNJ conduzir os trabalhos – desde que foi instalado, em 2005, o órgão tem exigido transparência e agilidade de todo o Poder Judiciário.

O presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Miguel Kfouri Neto, reclamou da divulgação de dados errados sobre o Judiciário paranaense pelo CNJ. A portaria do órgão que estabeleceu a inspeção no estado continha alguns números sobre acúmulos de processos que depois foram corrigidos.

O secretário-geral adjunto da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), desembargador Jorge Massad, também defendeu a atuação dos magistrados paranaenses. Ao fim da audiência, ele disse ver o evento com tristeza pelo fato de só ter ouvido críticas ao Judiciário, e nenhum elogio. "É inquestionável que o CNJ tem cumprido o seu papel nessas inspeções. Mas temo pelo constrangimento e desconforto que atos unilaterais podem causar. É preciso preservar a dignidade dos magistrados."

"Não sejamos ingênuos. Vem em uma audiência pública quem está com o espinho na garganta. Mas nós não estamos acostumados a críticas", rebateu o corregedor-geral do CNJ, ministro Gilson Dipp. Antes disso Dipp havia elogiado a celeridade do TJ do Paraná para julgar os processos anteriores a 2005.

O presidente do TJ, desembargador Carlos Hoffmann, reconheceu as deficiências do Judiciário paranaense, mas atribuiu parte dos problemas à diminuição do repasse feito pelo governo estadual, devido à queda na arrecadação. "Perdemos neste ano R$ 42 milhões com a crise mundial, mas temos nos empenhado e nos esforçado para a melhoria do nosso Judiciário."

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