O gabinete número 426, no 4.º andar do Palácio do Planalto, virou o símbolo da agonia do governo Dilma Rousseff (PT). Dividida em módulos de madeira, a sala abriga a Casa Civil da Presidência da República, que desde 17 de março ficou à espera do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi ali também que Dilma trabalhou e despontou como sucessora de seu padrinho político.
PT busca bandeira pós-impeachment
A percepção dentro do governo é de que o PT precisa de uma bandeira para o período pós-impeachment. Para dirigentes do partido, a tese do “golpe” contra Dilma deve ser aliada urgentemente a uma proposta concreta, sob pena de a legenda ficar sem discurso. Nos bastidores, o comentário é que Lula não foi derrubado em 2005 pelo escândalo do mensalão e se reelegeu, no ano seguinte, porque o governo tinha vitrines para mostrar e a economia ia bem.
“Temos que recuperar a imagem do PT e construir uma nova utopia na cabeça dos jovens”, costuma dizer o ex-presidente. Na opinião de Lula, nem o governo nem o partido conseguiram entender o que desencadeou os protestos de junho de 2013. Naquela ocasião, Dilma propôs uma Assembleia Constituinte e um plebiscito sobre reforma política sem consultar Temer, um dos primeiros a dizer que a ideia não tinha respaldo jurídico e não poderia ser levada adiante.
Não foi a primeira vez que os dois se estranharam. O caminho de Dilma e Temer se cruzou pela primeira vez no fim de 2002, quando Lula, então presidente eleito, desfez na última hora um acordo para dar ao PMDB o Ministério de Minas e Energia, entre outros cargos. Quem entrou na vaga prometida ao PMDB foi justamente Dilma, que “atropelou” o grupo de Temer. No PT, há quem lembre essa história para dizer que, quase 14 anos depois, o vice dá o troco na petista com requintes de crueldade.
Com a posse no ministério suspensa pela Justiça, Lula nunca pôde despachar lá. Nos últimos dias, o gabinete - emoldurado com a foto de Dilma sorridente - foi mantido algumas vezes com a porta aberta.
A poucos metros, no mesmo andar, salas da Secretaria de Governo - comandada por Ricardo Berzoini - já começaram a ser desocupadas. O ambiente de despedida dos auxiliares de Dilma contrasta com o vaivém no anexo do Planalto, onde está o gabinete do vice Michel Temer (PMDB).
Antes relegado a segundo plano, o “anexo” que tem na entrada um tapete com a sigla VPR (Vice-Presidência da República) em letras garrafais se transformou em ponto de encontro do poder. O governo “em gestação” de Temer também tem uma sede mais espaçosa perto da VPR, no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice, onde carrões pretos lustrosos não param de entrar.
Derrocada
Em conversas reservadas, muitos petistas culpam a própria Dilma pelo agravamento da crise, que está fazendo o PT perder o governo 13 anos e quatro meses depois de Lula subir a rampa do Planalto pela primeira vez, em janeiro de 2003. Na época, o mantra do então presidente era: “Nós não podemos errar”.
A avaliação dentro do PT é de que Dilma “não soube fazer política” porque nunca ouviu o partido nem o próprio Lula e comprou muitas brigas ao mesmo tempo. No diagnóstico dos petistas, a Operação Lava Jato - que mirou em Lula, na cúpula do PT e no “núcleo duro” do Planalto - também lidera a lista dos “culpados” pelo fim do governo, ao lado dos erros na economia.
Ninguém do PT, porém, vai se indispor com Dilma agora, à beira do impeachment. A ordem é se solidarizar com a presidente até o fim. Poucos acreditam, no entanto, que ela consiga voltar após o iminente afastamento do cargo por até 180 dias, que deve ser aprovado nesta quarta-feira (11) pelo Senado.
Quem esteve com o ex-presidente, nos últimos dias, assegura que ele se arrependeu de não ter negociado com Dilma, em 2014, sua candidatura ao Planalto, quando o movimento “Volta, Lula” crescia dentro e fora do partido. A presidente, porém, nunca deu sinais de que pudesse desistir do segundo mandato, embora sua popularidade já estivesse muito baixa.
Agora, a cúpula petista aproveitará o período de isolamento de Dilma para construir uma narrativa que permita a sobrevivência de Lula, até hoje o único potencial candidato do partido às eleições de 2018, apesar de estar na mira da Lava Jato.
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