A então vereadora de primeiro mandato em Londrina, Elza Correia, eleita pelo PCdoB, já se destacava como uma das forças de oposição ao prefeito Antonio Belinati (à época no PDT) quando, no início de 1999, foi procurada por um servidor da Autarquia do Meio Ambiente (AMA) da cidade. Ele carregava planilhas rasuradas de serviços de capinagem e roçada – e também uma gravação em que era solicitado por seu superior a adulterar os documentos.
“Era apenas a pontinha de um novelo”, diz a vereadora, que è época não imaginava que o desenrolar da história iria mudar a trajetória da cidade. Já nas mãos do Ministério Público (MP), os documentos entregues à vereadora ajudaram a descobrir uma centena de licitações supostamente fraudulentas entre empresas ligadas a políticos, à AMA, e à Companhia Municipal de Urbanização (Comurb).
O dinheiro pago ilegalmente às empresas, segundo o MP, vinha da venda, em 1998, de 45% das ações da Sercomtel, empresa de telefonia de Londrina, para a Copel. O negócio engordou em R$ 200 milhões os cofres públicos – o que representava, na época, quase o orçamento anual do município. Para fisgar parte da verba, políticos locais, entre eles o prefeito Belinati e o então deputado federal José Janene (PP), atraíam empresas para contratar com o poder público e conferir legalidade aos serviços que, na verdade, nunca foram entregues.
Acórdãos publicados pelo Tribunal de Contas apontam que os desvios podem ter chegado a R$ 9,3 milhões. “O dinheiro retornava a esses políticos para financiar campanhas”, conta o promotor Claudio Esteves, que trabalhou no caso. Não demorou muito para o MP aumentar a lista de pessoas influentes da cidade que também teriam participado da “divisão dos lucros” do esquema, como André Vargas e Paulo Bernardo, ambos do PT, e o até então desconhecido doleiro Alberto Youssef, que figuram entre os quase 200 denunciados pelo MP no caso AMA/Comurb.
As acusações levaram à criação de um movimento popular de combate à corrupção em Londrina. Pressionados pelos integrantes do movimento “Pé Vermelho, Mãos Limpas” – nome conscientemente inspirado na megaoperação de combate à corrupção italiana que também serviu de base para a Operação Lava Jato –, os vereadores instalaram uma CPI para investigar as denúncias contra o então prefeito. Em meio a outra acusação de promoção pessoal na inauguração do Pronto Atendimento Infantil da cidade, Belinati foi cassado em junho de 2000.
Já os processos da AMA/Comurb inauguraram no Brasil uma ferramenta que viria a ser depois muito conhecida do público: a delação premiada, que beneficiou o ex-funcionário da Comurb Eduardo Alonso de Oliveira. Vargas foi absolvido da acusação de improbidade administrativa, mas condenado a devolver os R$ 10 mil que recebeu. Paulo Bernardo, também denunciado, foi excluído da ação. Os processos que envolvem Youssef, Belinati e o espólio de Janene, morto em 2010, se arrastam até hoje na Justiça.
“Na área criminal, a resposta é um fracasso [a maioria das ações prescreveu]. Na área de improbidade administrativa, as coisas estão acontecendo gradativamente”, explica Esteves. “Todos os governos municipais que se sucederam tiveram problemas em função do desvio desse dinheiro, que até hoje ninguém disse onde está. Ninguém sabe, ninguém viu”, resume Elza.
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