A condenação na Justiça do delegado da Polícia Federal (PF) Protógenes Queiroz, na última terça-feira, reabriu a discussão sobre excessos nas investigações policiais, que muitas vezes prejudicam os processos judiciais e beneficiam os próprios acusados dos crimes. Para especialistas consultados pela Gazeta do Povo, a decisão da Justiça Federal de São Paulo também pode representar um freio nas ilegalidades cometidas em investigações policiais em nome da justiça. E forçar um debate sobre a cobertura jornalística de ações da polícia.
Protógenes foi condenado por vazar informações à imprensa e forjar provas enquanto chefiava a Operação Satiagraha. A investigação resultou na condenação do banqueiro Daniel Dantas, do Opportunnity, por corrupção ativa. Mas, segundo a própria Justiça, houve excessos.
A condenação é de 3 anos e 11 meses de prisão, mas deverá ser revertida em prestação de serviços comunitários em hospitais públicos ou privados. Ainda cabe recurso e a defesa do delegado já anunciou que irá recorrer. Mas, se a sentença for mantida nas instâncias superiores, ele pederá o recém-conquistado mandato de deputado federal pelo PCdoB de São Paulo e ficará proibido de exercer cargos públicos inclusive de continuar atuando como delegado da PF.
Marco
Para o advogado criminal Juliano Breda, o caso pode ser considerado um marco na Justiça brasileira por estabelecer limites na atuação policial. "É preciso diferenciar possíveis excessos em investigação de condutas criminosas de policiais. Esse caso é exemplar porque a Justiça demonstrou que é preciso submeter às condutas dos investigadores às regras de legalidade", disse Breda.
Breda afirma que a condenação do delegado não deve ser encarada como uma maneira de coibir investigações da polícia contra "ricos e poderosos" já que a Operação investigava um banqueiro. "Pelo contrário. As irregularidades na investigação viciam o processo e dificultam o julgamento e eventuais condenações [dos investigados]."
O mestre em Direito Penal Dante D'Aquino, professor da Universidade Tuiuti, concorda com Breda Ele diz que o caso traz à tona a antiga discussão de que os fins justificariam os meios. D'Aquino explica que o Direito não pode contemplar a contradição de uma investigação que use métodos contrários à lei.
"A finalidade de um inquérito criminal é a pacificação social. Busca-se evidenciar práticas supostamente delituosas que interferem no bem-estar coletivo", diz D'Aquino. "A polícia, portanto, não pode querer alcançar este resultado com o uso de práticas também criminosas."
Acusações
Segundo a sentença proferida pelo juiz Ali Mazloum, da 7.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, o delegado Protógenes foi condenado por dois crimes: violação de sigilo funcional e fraude processual.
O primeiro delito ocorreu quando Protógenes vazou a realização de suas atividades da investigação para jornalistas da Rede Globo. A primeira foi uma reunião, em junho de 2008, no Restaurante El Tranvia, em São Paulo, entre os executivos Humberto Braz e Hugo Chicaroni e o delegado Victor Hugo, em que teria ocorrido uma tentativa de subornar o policial, registrada pela tevê.
O outro vazamento foi dos locais onde a Operação Satiagraha seria deflagrada, em 8 de julho de 2008, possibilitando que jornalistas registrassem imagens dos acusados entre eles o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta (já falecido) e o empresário Naji Nahas.
Já o crime de fraude processual ficou configurado com a edição da fita com a filmagem feita no restaurante El Tranvía. Essa edição teria sido feita por Protógenes para ocultar a participação dos jornalistas da TV Globo. Depois disso, a fita foi inserida nos autos da investigação, como prova.
Tiririca
Protógenes deve sua vaga na Câmara dos Deputados ao palhaço Tiririca (PR-SP). Com a votação expressiva de 1,35 milhão votos, o palhaço conseguiu "puxar" três candidatos que não tiveram votação suficiente para se elegerem sozinhos, entre eles o delegado (dono de quase 95 mil votos).