A presidente da Fundação Casa (ex-Febem), Berenice Giannella, disse na noite desta quarta-feira (2) que a fuga de R.A.A.C., o Champinha, de 20 anos, foi caso de facilitação ou negligência. "Se não houve facilitação, houve uma negligência absolutamente imperdoável".
Berenice está na unidade da Fundação Casa da Vila Maria, Zona Norte de São Paulo, para cuidar do afastamento dos 19 funcionários da segurança, além do diretor do complexo onde Champinha estava. Ele fugiu com outro adolescente: R.A., de 17 anos. De acordo com ela, a fundação abriu uma sindicância para apurar a responsabilidade pela fuga e ouvirá os funcionários de plantão em uma reunião nesta quinta-feira (3).
A presidente da fundação contou que Champinha ficava em um quarto na parte administrativa do complexo havia quase dois anos e que durante o dia costumava fazer atividades pelo pátio.
Para Berenice, a fuga só aconteceu porque havia uma escada deixada indevidamente após uma obra de manutenção. "Ele (Champinha) não teria conseguido fugir se não fosse o auxílio da escada", disse ela, salientando que as muralhas da unidade têm cerca de 7 metros de altura.
Roupas esquecidas
As roupas que Champinha e R.A. estariam usando no momento da fuga foram abandonadas na porta da frente da unidade. Um deles vestia uma bermuda bege e uma camiseta branca e o outro, uma calça de moletom cinza e uma camiseta azul. De acordo com a assessoria de imprensa da Fundação Casa, as roupas foram encontradas próximas ao local por onde eles pularam e foram levadas por funcionários para o outro lado do complexo, junto à entrada principal, onde foram esquecidas no chão.
Ainda segundo Berenice, a fuga não muda a situação de Champinha na Fundação Casa, já que ele só pode ficar internado até dezembro, quando completa 21 anos. Ela disse que, apesar de eles terem escapado, a unidade da Vila Maria "era um local adequado para abrigá-los". O jovem estava no "seguro", espaço de isolamento na unidade, desde sexta-feira (27), por ter agredido um funcionário da segurança. O complexo da Vila Maria abriga 160 adolescentes.
'Incompetência'
O secretário estadual da Justiça, Luiz Antonio Guimarães Marrey, considerou "gravíssimo" o fato de Champinha, de 20 anos, ter fugido da unidade da Febem de Vila Maria. Marrey esteve no local assim que foi informado da fuga. "Houve no mínimo absoluta incompetência", disse.
Ele contou que os adolescentes fugiram por uma escada que era usada em uma obra da unidade. No momento da fuga, segundo ele, o vigia de muralha não estava em seu posto. "Manifesto nossa absoluta revolta com esse fato", disse Marrey. Ele contou que pediu mais policiais na rua ao secretário de Segurança Pública, Ronaldo Marzagão.
Os funcionários que trabalhavam na unidade da Vila Maria no turno em que ocorreu a fuga foram afastados temporariamente. Há suspeitas de que a fuga tenha sido facilitada, já que uma escada foi encontrada no muro por onde os dois adolescentes escaparam. Foi aberta sindicância interna na Fundação Casa para investigar o caso.
A Polícia Militar foi chamada para tentar recapturar os fugitivos por volta das 18h30. O 5° Batalhão da PM participa das buscas. O policiamento na região também foi reforçado. De acordo com a Fundação Casa, Champinha estava em uma área separada dos outros jovens, conhecida como área do seguro.
Champinha ficou conhecido após ser internado na Febem pelo assassinato da adolescente Liane Friedenbach, de 16 anos, e pelo planejamento da morte do namorado da jovem, Felipe Silva Caffé, de 19 anos. O crime ocorreu em 2003 na cidade de Embu-Guaçu, na Grande São Paulo.
"Eu recebi (a notícia) com angústia, com preocupação, mas por outro lado já era absolutamente esperado, já que as fugas na Febem são rotineiras", afirmou o advogado Ari Friedenbach, pai de Liana, em entrevista ao G1. A auxiliar de enfermagem Lenice Silva Caffé, mãe de Felipe, também disse que já esperava que Champinha escapasse. "Demorou mais do que eu imaginava para isso acontecer. Na Febem só fica quem quer, e por quanto tempo quiser", afirmou.
Antes de ser morta, Liane foi violentada e torturada. Champinha, na época com 16 anos, foi apontado como líder do grupo de 3 pessoas que praticou o crime. Como era menor de idade, ele foi detido na antiga Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem, atual Fundação Casa).
O prazo legal de internação de Champinha - até três anos, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) -, venceu em 17 de novembro de 2006. Sem um local especializado para receber adolescentes com o perfil de Champinha, a Secretaria apresentou como alternativa sua permanência na Febem.
Uma liminar da juíza Alena Cotrim Bizzaro, de Embu-Guaçu, no entanto, determinou que ele ficasse na instituição até que a Secretaria Estadual de Saúde indicasse uma clínica para recebê-lo. Em outubro, o juiz ordenou que ele fosse para um manicômio com base em laudos do Instituto Médico Legal (IML), que atestam nele "altíssima possibilidade de reincidir no crime".