Dilma e suas ministras: aumento de participação não fez com que a presidente atingisse “cota” de 30% desejada em 2010| Foto: Gustavo Miranda/ Agência O Globo

A opção da presidente Dilma Rousseff por um núcleo de poder feminino durante a maior parte do mandato gerou "estranheza" aos políticos tradicionais e influiu no relacionamento com o Congresso Nacional. A avaliação é da ex-ministra da Casa Civil e senadora paranaense Gleisi Hoffmann (PT). "São questões que parecem pequenas, mas vão se somando", diz a petista, em um balanço sobre a atuação das mulheres no governo.

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INFOGRÁFICO: Conheça as atuais ministras de Dilma

O choque, segundo ela, está no "jeito". Em um ambiente masculinizado como o de Brasília, na avaliação da parlamentar, prevalece a tradição de que as conversas políticas precisam passar por lugares informais, como bares e restaurantes, em horários fora do expediente normal. Ao escalar três ministras – além de Gleisi, Ideli Salvati (Relações Institucionais) e Helena Chagas (Comunicação Social) – para o escalão mais próximo a ela no Planalto, Dilma fugiu desse ambiente e "institucionalizou" o diálogo.

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"Como o homem está presente na vida pública há mais tempo, ele estende esse espaço de trabalho para fora do espaço formal", diz. "Nós [mulheres] temos uma jornada diferenciada, podemos até não executar serviços domésticos, mas temos o comando das relações da casa, principalmente das relações afetivas. Aí para você conseguir, como se diz no jargão político, tomar um uísque para articular, é uma coisa muito mais difícil."

Gleisi avalia que a etiqueta do relacionamento em Brasília, além dos horários, segue os modos masculinos. "Não tenho dúvidas que o fato de ser mulher gera um desconforto de relação. Você não tem tanta abertura. Homem com homem é diferente, chega, bate nas costas, fala uma besteira, quebra um clima mais pesado", diz a senadora, frisando que "Dilma não é o Lula" – o ex-presidente é sempre lembrado pela facilidade de relacionamento.

A senadora admite que a mudança de perfil teve efeitos na imagem da presidente, principalmente no Congresso. "Talvez por conta disso se fale que houve dificuldade de relação, ou que a Dilma e nós não gostávamos de política. Mas não tem nada disso: nós gostamos de política. A verdade é que a forma como a gente faz e pratica a política é que é diferente."

Apesar de falar que essa "forma" veio para ficar, as saídas de Gleisi e de Helena Chagas do governo, no mês passado, marcaram uma nova transformação no eixo de poder do Planalto. A vaga de Helena foi ocupada pelo jornalista paranaense Thomas Traumann. No lugar da senadora, entrou Aloizio Mercadante, que tem uma trajetória política bem mais longa que a antecessora – foi candidato a vice na chapa de Lula (1994), ao governo de São Paulo (2010), além de líder do PT no Senado (2008-2010) e ministro da Educação (2012-2014).

Para Gleisi, as trocas não são um retrocesso para a participação feminina no governo. "Infelizmente tem algumas questões de conjuntura, em que você não tem a governabilidade total sobre isso [a escolha de mulheres]. Mas não quer dizer que ela não continue persistindo em ter uma meta de participação feminina mais elevada. É um compromisso que a presidenta tem."

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Presidente não atingiu "cota" feminina de 30%

O número de mulheres no ministério bateu recorde durante a gestão Dilma Rousseff, mas não atingiu a meta de 30% das vagas planejada pela presidente em 2010. Das 39 pastas de primeiro escalão, 10 (26%) eram ocupadas ministras até o mês passado. O número caiu para oito (21%) com as substituições de Gleisi Hoffmann (Casa Civil) e Helena Chagas (Comunicação Social).

Lula chegou a contar com cinco ministras ao mesmo tempo; Fernando Henrique Cardoso, três; Fernando Collor, duas; e Itamar Franco e José Sarney, uma. Dilma também distribuiu ministérios de maior peso político a mulheres, como Casa Civil, Planejamento e Desenvolvimento Social (responsável pelo Bolsa Família).

"O problema está muito mais relacionado com a dificuldade para encontrar mulheres dentro de um determinado perfil que caiba nesses cargos", diz a cientista política Maria do Socorro Braga, da Universidade Federal de São Carlos (SP). Segundo ela, um dos motivos que atrapalha a autonomia da presidente na escolha de mulheres é o loteamento partidário.

Das atuais oito ministras, sete são petistas e uma não tem vínculo com legendas. Nenhum dos sete partidos aliados que ocupam atualmente 11 ministérios indicou mulheres.

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Coordenadora-adjunta da bancada de 45 deputadas federais, a paranaense Rosane Ferreira (PV) diz que há um "olhar mais feminino" na forma de governar de Dilma, mas que isso não implica necessariamente na melhoria de vida das mulheres brasileiras. "Nossos números de violência contra a mulher, por exemplo, ainda são assustadores", diz a parlamentar. Segundo ela, também houve dificuldades de interlocução da bancada feminina com a presidente. "Só tivemos um encontro."

É importante que haja maior participação feminina em postos de primeiro escalão? Por quê?Deixe seu comentário abaixo e participe do debate.