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De um jeito ou de outro, os taxistas iam reclamar do Uber. Faz parte: ninguém gosta de mais concorrência, ainda mais quando o seu competidor não precisa pagar as mesmas taxas, passar pelas mesmas burocracias e consegue com isso ser mais barato. Mas boa parte da culpa pelo clima hostil criado na cidade entre os motoristas dos dois serviços é do poder público.

A prefeitura de Curitiba sempre fez vistas grossas para o comércio de licenças de táxi. Qualquer um que converse cinco minutos com um taxista sabe que a maior parte das placas foi comprada – e não por qualquer dinheirinho. Muita gente investiu pesado para ter uma permissão, que na verdade deveria ser de graça.

Imagine qual seria a situação se os taxistas todos da cidade (são 3 mil carros com permissão para rodar) tivessem entrado no esquema gratuitamente, só comprando o carro. Chegando o Uber (caso ele venha a ser regularizado), bastaria o sujeito devolver sua licença à Urbs, fazer o cadastro no Uber (ou em algum outro concorrente) e tirar o alaranjado do carro. Sem prejuízo, estaria apto a escolher entre um sistema e outro.

A coisa toda muda – e muito – de figura quando o sujeito investiu a economia de uma vida na placa. E não é exagero: muita gente pagou mais de R$ 100 mil para ter o táxi – hoje, o preço está estimado em mais de R$ 140 mil (e, de novo, só a prefeitura parece não saber que as vendas continuam ocorrendo). Aí quando chega um concorrente, o que o sujeito vê é seu investimento ser ameaçado. Seu patrimônio. Seu capital.

Porque foi isso que os prefeitos deixaram que o táxi virasse. Em vez de um serviço, virou um ativo a ser vendido. Quando os taxistas ganharam as 750 novas placas na época da Copa, era comum ouvi-los dizer que ganharam uma aposentadoria. Estranho? Para a lógica que se deixou criar, não. O sujeito pode ficar em casa e deixar dois motoristas rodando, pagando a ele como se fosse dono de algo e não um permissionário.

A leniência com a “pequena corrupção” que é a venda das placas gerou um serviço mais caro do que o necessário, uma categoria de “proprietários” de licenças que se sente no direito de cobrar proteção ao seu patrimônio e milhares de usuários infelizes com o serviço. Agora, além de tudo, gerou uma rivalidade que muitas vezes é hostil e perigosa com os motoristas do Uber.

A prefeitura atual herdou o problema, e poderá dizer que ajudou a resolvê-lo, dificultando a venda. Vá lá: hoje a Urbs em tese só aceita uma transferência de cada permissão e deixa claro que ela precisa ser feita sem custos, sem que haja dinheiro envolvido. Ora, não sejamos ingênuos. Quem é que vai entregar de graça o que pagou caro para ter? Se fosse para ser de graça, devolveria à Urbs. E quem garante que não foi feito pagamento por fora?

Se a Urbs se interessasse pelo assunto, rapidamente descobriria o que acontece no setor. Assim como descobriria que há centenas de carros do Uber rodando sem licença, sem fiscalização e com uma lei da Câmara que exige multa pela infração. Mas, por enquanto, continuamos fechando os olhos para a realidade.

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