O impeachment de Dilma Rousseff tem peso muito maior do que teve o de Collor. O motivo é simples: Collor, ao cair, estava isolado. Ficou famoso o seu patético apelo para que não o deixassem só, mais patético ainda porque todos o ignoraram solenemente. O presidente pediu que todos saíssem às ruas de verde amarelo e a multidão respondeu saindo de preto. Seu partido, o PRN, era uma farsa, montada por encomenda para levá-lo a Brasília. Ninguém era militante de Collor, ninguém era filiado ao PRN.
Por mais impopular que seja e apesar de todos os erros, Dilma representa um projeto político. Goste-se ou não, um projeto político que venceu quatro eleições sucessivas, conta com a adesão de sindicatos, movimentos sociais e que, mesmo na crise, conseguiu 54 milhões de votos. É certo que o petismo não é mais o mesmo e que o próprio Lula anda descontente com a sucessora que inventou. Mas que ninguém se iluda: Dilma não está só.
Há um movimento nas oposições hoje para desqualificar qualquer um que não deseje o afastamento de Dilma ou que defenda o Partido dos Trabalhadores. A CUT e os sindicatos são vistos como partícipes de um projeto vil. Os manifestantes que pedem a permanência de Dilma fazem isso apenas por um sanduíche de mortadela. Os pobres que acreditaram no projeto só desejam bolsas para não trabalhar. E a intelectualidade de esquerda é desancada como se a mera adesão a uma ideologia fosse prova de falta de caráter.
A situação de 1992 e a de agora são incomparáveis. Collor foi simplesmente uma aberração, um ponto fora da curva que se elegeu num vácuo de nomes viáveis. Quando se mostrou um problema, foi fácil se livrar dele: ninguém tinha por que defendê-lo. Com Dilma, a história é absolutamente diferente: os defensores do projeto do PT certamente se desiludiram com a adesão do partido a tudo que de pior há na política nacional. Mas ninguém se desvencilha assim de uma ideologia – e certamente haverá quem defenda o petismo mesmo depois de sua queda, seja lá quando ela acontecer.
Collor, após a renúncia, não era oposição. Não era nada: mero fantasma incapaz de incomodar quem quer que fosse. Improvável que seja esse o caminho do PT. Fica cada vez mais fácil imaginar o partido fora do poder, mas ainda não parece possível imaginar o PT longe do Congresso, longe de governos estaduais e prefeituras. E Lula, como mostram as pesquisas de intenção de voto, parece longe de estar morto. O partido vai atormentar quem quer que seja seu sucessor.
No caso de Collor, também não houve qualquer ruptura ideológica. Agora, o plano do PMDB para caso Michel Temer assuma o poder é dar um cavalo de pau no país. A “ponte para o futuro” é a pá de cal do modelo que foi adotado nos últimos treze anos. E há mais: com Temer na Presidência (ou, ainda pior, com Eduardo Cunha), a Lava Jato segue no rastro do chefe do Executivo. E a tendência é de que haja munição para quem quer que ainda esteja na oposição.
Seja como for, o impeachment de Collor, perto do que está acontecendo agora, parece coisa de criança. O jogo de agora é mais bruto, simplesmente por haver dois times – ao contrário do W.O. de 1992.
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