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Há séculos se diz que não se pode ser servo de dois patrões ao mesmo tempo. O mo­­tivo é óbvio: os interesses dos dois podem entrar em conflito, e aí será necessário escolher um dos lados para favorecer. O que for preterido se sentirá traído, com justiça, e ficará a ver navios. A não ser que arranje outro mais fiel para servi-lo.

Nos últimos anos, esse tem sido justamente um dos maiores problemas da Câmara de Curitiba: querer agradar a dois lados com interesses conflitantes. De um lado, está o eleitor. Sem ele, o vereador não se elege, e portanto é preciso satisfazê-lo minimamente. Além disso, como é do eleitor que parte o mandato, cada vereador, se questionado, dirá que é ele seu único patrão.

De outro lado, os vereadores sabem que também há vantagens em agradar à prefeitura do município. É lá que estão as verbas, para começar. É a partir de lá que se gerencia o orçamento. E se o vereador quiser ter obras nos bairros, e mais ainda, se quiser ser chamado para a inauguração, quem sabe com uma plaquinha ou uma faixa indicando a sua participação no processo, é preciso agradar.

De uns tempos para cá, ficou mais do que claro qual patrão os vereadores preferiam atender. A ponto de a Câmara, que só faz sessões de segunda a quarta-feira, ter marcado uma extraordinária em pleno sábado para mudar o projeto do transporte coletivo, que não havia agradado ao prefeito Beto Richa (e sabe-se lá se a mais alguém). E há anos a prefeitura nunca sofre uma única derrota na Casa. Sem contar que tem uma maioria esmagadora (até recentemente, eram 33 contra 5. Nos últimos dias, alguns oposicionistas de última hora começaram a surgir, de olho na eleição).

Nesta segunda, a eleição de João do Suco (PSDB) para ocupar o cargo de João Cláudio Derosso (PSDB) marcou, pelo menos nesse sentido, uma continuidade. Derosso era o homem de confiança do prefeito – de todos os prefeitos, é preciso dizer. João do Suco também é. Tanto é que ocupava o posto de líder de Luciano Ducci (PSB) no plenário. Era ele quem comandava as votações (aliás, sabia mais sobre o que iria entrar na pauta do que o próprio Sabino Picolo, que ocupava interinamente a presidência).

Por sua lealdade, ganhou o cargo de presidente. Mas eis o problema: lealdade a quem? Ao patrão que mais cobra: o prefeito. O risco que se corre é de que a Câmara continue a ser um mero órgão consultivo da prefeitura, aprovador de todas as matérias. Não faz uma investigação, não questiona, não força a entrada em pauta de projetos que possam desagradar ao Executivo.

A população, que se mostrou inerte na derrocada de Derosso, sem apresentar qualquer poder de mobilização, continuará sem peso e sem controle sobre seus representantes. E, embora tenha havido troca de comando, um dos principais vícios da Casa – a ausência de separação de poderes – continuará imperando como sempre.

A não ser que o novo presidente surpreenda, claro. Por enquanto, ele é o líder do prefeito, eleito com votos da bancada do prefeito, numa eleição comandada pela prefeitura. É o João do Ducci. Caberá a ele mostrar que pode ser diferente.

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