Ninguém fora do governo do Paraná viu o tal projeto ainda. Mas ele pode ser a contribuição mais importante da atual gestão para a área de segurança pública. A ideia é boa e já funcionou em outros lugares: criar uma Divisão de Homicídios e de Proteção à Pessoa. Com isso, aumenta significativamente o número de policiais encarregados de investigar crimes contra a vida. Se for bem-sucedida, a proposta pode diminuir o terrível ciclo de assassinatos que marca a periferia de Curitiba.
Nos últimos dez anos, foram 5,8 mil vidas perdidas. Só dentro dos limites de Curitiba. E há apenas cinco delegados encarregados de resolver tudo isso. Impossível. O intervalo entre um homicídio e outro é tão pequeno que, quando o delegado chama a primeira testemunha de um crime, para começar a investigar, outro assassinato já ocorreu. Os casos mais antigos que não são resolvidos em flagrante vão sendo empilhados. Viram só isso: pilhas de papel. Até o dia em que, para cumprir a meta do Conselho Nacional de Justiça, a Polícia manda arquivar.
A Divisão de Homicídios, anunciada na semana passada pelo novo delegado-geral, Riad Braga Farhat, poderia mudar isso. Desde que tenha delegados suficientes, que não seja um engodo como são as Unidades Paraná Seguro um arremedo de pacificação em que dois policiais ficam, com uma viatura, num bairro inseguro da cidade. É preciso que dessa vez o governo aproveite a chance bem e monte uma estrutura que realmente resolva o problema. Não adianta trocar o nome, colocar placa nova na frente e designar mais um ou dois delegados.
A ideia da divisão é que os policiais tenham mais tempo para investigar cada caso. Que, com isso, diminua a impunidade na cidade: na atual situação, como mostrou esta Gazeta, há anos em que só 4% dos assassinatos têm condenação judicial. Uma situação que só faz perpetuar o ciclo de violência: a série Crime sem Castigo, publicada aqui, mostrou que há no mínimo 50 casos em que testemunhas de homicídios foram mortas nos últimos quatro anos. E que é mais comum o homicida ser assassinado do que ser condenado judicialmente.
O governo Beto Richa teve algumas oportunidades de mostrar que tem vontade de mudar a área de segurança. Deixou cair um secretário por ele dizer que não tinha dinheiro para fazer o necessário. Vieram denúncias graves contra agentes da Polícia Civil: desvio no uso de viaturas, uma mansão estourada no bairro Parolin, esquemas de propina, tortura. Quase sempre, o governo demorou a agir. Às vezes, nem mesmo agiu.
Essa é a nova oportunidade. Nunca esteve tão claro que é preciso reforçar uma estrutura dentro da polícia. A periferia de Curitiba está sendo dizimada. Outras cidades também sofrem e a Divisão teria o papel, inclusive, de ajudar as delegacias do interior. Se tudo for feito como se deve, peritos trabalharão dentro da Divisão, eliminando a espera inaceitável de quatro meses para que se receba um laudo de necropsia.
Se conseguir eliminar a sensação de impunidade, o governo estará colaborando para frear o dedo que hoje aperta o gatilho sem medo do que possa acontecer. Mas, para isso, é preciso que não se trate de uma peça de marketing. O trabalho tem de ser consistente, com aumento real de efetivo e de estrutura. Será assim?