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A repórter Anna Simas apresentou no domingo, nesta Gazeta, um daqueles números aterradores que deveriam assombrar o sono de qualquer prefeito, governador ou presidente que estivesse minimamente preocupado com seu legado. Com base nos números da Prova Brasil, a reportagem mostrava que 34% dos professores brasileiros afirmam que nunca leem livros. Não é que leem poucos livros. Nessa categoria entram outros 21% dos professores. Os 34% (um terço do total) não leem livros nunca.

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A culpa pode ser colocada também nos próprios professores, claro. Afinal, a iniciativa de ler, de querer saber sobre o mundo em que vivem, deve ser deles. Apesar de que, é claro, sempre surgirá quem acredite que tudo deve recair sobre o governo – havendo até especialistas entrevistados recomendando que o governo crie horas atividade a mais para que os professores possam ler literatura. A bolsa-livro, porém, não é a solução.

A parte do governo deveria ser outra. Deveria ser a de oferecer salários minimamente atraentes para fazer com que os professores paguem as contas com apenas um emprego. Isso, por si só, liberaria tempo para a formação. Mas há mais: seria preciso oferecer salários ainda maiores, para atrair pessoas com formação cada vez melhor já na porta de entrada. Foi assim que outros países conseguiram de verdade chegar a algum lugar.

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Veja-se o exemplo da Finlândia. Lá, para dar aulas o sujeito tem de ter, no mínimo, mestrado. Não estamos falando de dar aulas na universidade. É preciso ter mestrado para dar aula em qualquer série. E mesmo havendo essa restrição, há disputa séria pelas vagas na carreira. De cada 10 pessoas com a qualificação exigida que tentam entrar nas vagas de docente, apenas uma consegue.

Aqui, vê-se o nível da discussão sobre educação pela campanha eleitoral do ano passado. O ex-prefeito de Curitiba, para mostrar o quanto os colégios locais eram bons, resolveu filmar uma instituição particular, disfarçadamente, sem avisar à plateia sobre o truque. Um de seus principais adversários – que talvez pela ideia brilhante acaba de ganhar o posto de secretário de Estado – achava que a coisa mais importante era dar uniformes para a garotada. O vencedor acabou sendo o que prometeu 30% do orçamento para a área – o que ainda é pouco e parece que pode não ser cumprido ainda por alguns anos.

Ler é parte fundamental da formação de qualquer professor. Sem leitura, o sujeito não tem como formar pensamento crítico, não tem cultura geral para passar aos alunos, não sabe o que de mais importante acontece à sua volta. Não é perfumaria. É a base da profissão. Alguém já descreveu uma universidade como sendo uma biblioteca com salas de aula em volta. Um colégio, pelo menos a partir do momento em que as crianças são alfabetizadas, não deveria ser muito diferente.

A escola brasileira acaba sendo um lugar com professores mal pagos, que têm de ter dois empregos para se manter vivos e que não têm tempo (nem disposição, nas poucas horas vagas) para fazer o que seria necessário para se formar. E todos nós encaramos isso com naturalidade. O resultado é que daqui a 20 anos estaremos novamente protestando contra o corrupto que tiver sido eleito para a presidência do Senado.

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