Ilustração: Benett| Foto:

Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa. Há muita gente, por exemplo, comparando Trump a Hitler. Bobagem. Basta ver o discurso da vitória de um e de outro. Trump, embora seja um sujeito vil, falou em união. Hitler, ao vencer, falou da necessidade de os alemães se submeterem – a ele, claro.

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Comparar Trump com Temer também é insensato. Os dois fenômenos, ligados pelo conservadorismo, diferem primeiro no seguinte. A pauta de Trump foi escolhida pelos americanos. No Brasil, o número de pessoas que depositou seu voto em Dilma pensando em eleger um conservador equivale a zero.

O conservadorismo, aqui, não veio das urnas. Pastor Everaldo, Aécio e até Marina Silva foram derrotados. Dilma foi de fato a vencedora. Trump, por monstruoso que seja, tem uma imensa vantagem democrática sobre Temer: a população que o elegeu sabia em quem e no que estava votando.

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Mas embora as comparações sejam todas absurdas, há alguns fatores que sempre podem ser encontrados em comum em várias circunstâncias. E tanto no caso de Hitler quanto no de Trump como no de Temer é possível achar pelo menos um ponto de união. Não tem nada a ver com o perfil de governo nem com a personalidade. As diferenças entre os três, claro, são gigantes.

O que há em comum é que os três chegaram ao poder com uma espécie de discurso “antibaderna”, “antianarquia”, com uma espécie de grito pela volta do que seria considerado “normalidade” – um apelo ao passado. Todos chegaram ao cargo porque a população (ou parte dela) temia os rumos que governos menos conservadores estavam escolhendo.

Medo. Foi isso que elegeu Hitler: o medo dos judeus, do Estado liberal que o nazismo considerava anarquizante e a transformação de tudo em bens financeiros – inclusive a terra, símbolo da estabilidade. Foi o medo que elegeu Trump: medo do “obamacare”, dos mexicanos, das políticas supostamente socialistas (embora isso, claro, soe ridículo) de Obama.

O medo de Dilma e do PT levou Temer ao poder. Um medo diferente. O discurso que colou foi de que o petismo estaria levando o Brasil a um projeto socializante, uma espécie de bolivarianismo brando, em que a família tradicional seria destruída em nome de um projeto de poder que não reconhece o mundo como os verdadeiros brasileiros (conservadores, segundo o discurso) e a natureza (ou Deus) desejam.

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Foi para combater isso que Temer surgiu. Para isso foi “escolhido” pelos congressistas, que preferiam poupá-lo do impeachment e que trabalham para que ele não seja derrubado – apesar de as contas de sua campanha serem obviamente uma farsa. Fosse a corrupção o verdadeiro temor e haveria panelaços contra um presidente que mantém nos mais altos cargos gente investigada pela Lava Jato e que inclusive foi pega ao telefone prometendo impunidade aos colegas.

A guinada “antibaderna” no Brasil foi muito menos radical. Há quem já se sinta satisfeito com um governo que, embora impopular, coalhado de corruptos e de legitimidade duvidosa, tenha derrotado o petismo. Mas há gente apostando cada vez mais alto nesse discurso. Até para, quem sabe, em 2018, dar uma guinada ainda mais forte. Afinal, quem cria corvos pode apostar que eles comerão seus olhos. Aécio, Temer e os demais que agora ajudem a lidar com o monstro que eles (tanto quanto o PT) ajudaram a criar.