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"Precisamos fazer a nossa escolha. Podemos ter democracia, ou podemos ter riqueza concentrada nas mãos de uns poucos, mas não podemos ter ambos." Quem disse isso foi Louis Brandeis, juiz da Suprema Corte americana no início do século passado. Além de grande magistrado, ficou famoso como autor de frases de efeito. A mais famosa é aquela que diz que a luz do sol é o melhor desinfetante – defendendo a transparência cem anos antes de isso virar moda.

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O Brasil ainda não tem um Estado transparente. Os governos divulgam seletivamente as informações, seguindo a Lei de Ricupero: o que é ruim a gente esconde. No quesito igualdade, o país também está longe de conseguir os avanços de que precisa. Curiosamente, um dos lugares em que mais fica clara a desigualdade é o Judiciário: o lugar de onde falava Brandeis. E nem se está falando aqui de decisões desiguais conforme o réu.

No julgamento do mensalão, por exemplo, os brasileiros descobriram os "capinhas", indivíduos pagos para pajear os ministros nas suas mais banais necessidades. Dizem que governantes desaprendem a abrir portas girando a maçaneta – sempre há alguém para fazer isso antes que ele chegue à porta. Nos casos do STF, a coisa vai mais longe: eles desaprendem a sentar sem que alguém lhes puxe e empurre a cadeira.

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A descrição do magistrado brasileiro típico – e não só nas Cortes superiores – lembra às vezes a história de Hailé Selassié, o imperador que dominou a Etiópia durante 44 anos. Na biografia que escreveu dele, o polonês Ryszard Kapuscinski mostrava que um dos funcionários que Salassié mantinha era o "colocador de almofadas", encarregado de fazer com que ele sempre se sentasse sobre algo macio. Seria o capinha atuando no chifre da África?

Em países civilizados, não há tantas mordomias. O premiê britânico lava a própria louça do jantar. Na Suprema Corte americana, revelou Elio Gaspari, apenas o presidente tem direito a carro com motorista. O próprio papa Francisco carrega a sua mala em viagens e fez questão de voltar ao hotel onde se hospedou antes do conclave para pagar a conta. Por aqui, a ficha ainda não caiu.

Em terras brasileiras, os desembargadores paranaenses conseguiram que cada um tenha o próprio Renault com motorista, sob alegação de que de outro modo estariam inseguros. Na semana que passou, a cúpula do Judiciário paranaense anunciou que pretende gastar até R$ 79 milhões para reformar sua sede. Também criará mais 25 vagas de desembargadores, apesar de o CNJ dizer que isso é desnecessário. Todos terão, certamente, direito a carro, motorista e o que mais se considerar necessário.

Ex-presidente do TJ local, o desembargador Miguel Kfouri defendia a vida boa dos seus pares: julgar é uma atividade sem igual e era preciso que os magistrados tivessem essas condições. Lembra demais a fábula de George Orwell sobre os porquinhos que fazem a revolução numa fazenda. O objetivo da expulsão dos humanos, dizem eles, foi criar uma sociedade ideal em que todos os animais são iguais aos outros. Aos poucos, os porcos se tornam a classe dirigente e ganham direitos especiais: dormem em camas, têm comida diferente e passam a andar em duas patas. A lei é emendada para sua forma mais célebre: todos são iguais, mas alguns são mais iguais do que os outros.

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