Desde sempre o Brasil esteve nas mãos dos latifundiários. No Império, o Senado era constituído basicamente pelos grandes senhores de terra da nação. Mesmo depois, no começo da República, os grandes fazendeiros de Minas Gerais e de São Paulo se reuniam a cada quatro anos para decidir quem seria seu representante na presidência. Os cidadãos votavam mesmo só para confirmar o resultado da escolha deles.

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Por essas e por outras, a escravidão durou aqui mais do que em quase todos os outros países do mundo. Os fazendeiros eram os poderosos. E como queriam ter escravos, havia a escravidão. Os direitos de todos os outros acabavam onde tinham início os direitos do latifúndio. Porém, pior do que saber que nosso passado foi assim é ver que, no presente, o país continua atrelado aos mesmos interesses mesquinhos.

Nos últimos dias, os senadores brasileiros mostraram mais uma vez que a República continua na mão dos senhores de engenho. O Ministério do Trabalho havia feito uma investigação em uma fazenda do Pará. Com todas as provas dos absurdos que ocorriam por lá, pôs em liberdade mais de mil cida-dãos que ainda hoje trabalhavam como escravos. Não tinham direito a água limpa. Dormiam em lugares insalubres. Usavam banheiros sem descarga. Tinham de comprar de tudo na própria fazenda, a preços exorbitantes. Muitas vezes o camarada recebia no fim do mês um contracheque zerado – tantos eram os descontos.

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Depois de tudo isso, uma comissão de cinco senadores teve a coragem de ir à fazenda e dizer que as reclamações eram exageradas. Não havia, disseram eles, motivo para chamar de "escravo" aquele trabalho. Fizeram tanta pressão que o Ministério do Trabalho resolveu suspender temporariamente as atividades do grupo que combate a escravidão. Há medo de que os fiscais, de tão criticados que foram, corram risco de vida reassumindo suas funções.

Os senadores deveriam ser representantes do povo. Mas, como acontece desde sempre, representam a elite. Com raras exceções, comportam-se ainda hoje como senhores de engenho. São moradores de uma casa grande. E não querem jamais ver esvaziada a sua senzala.

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O quinhão de cada um – Todo governador de estado ganha homenagens depois que vai dessa para uma melhor. Aqui em Curitiba, por exemplo, há ruas importantes dedicadas à memória de Carlos Cavalcanti, Manoel Ribas, Vicente Machado e Affonso Camargo, só para citar alguns. É de se imaginar que os atuais governantes também venham a ganhar um mimozinho no futuro: uma avenida, um prédio público, um parque de exposições, sabe-se lá.

É engraçado ficar imaginando quem vai virar o quê – sem nenhum pensamento mórbido, é óbvio. Jaime Lerner, por exemplo, deve ganhar alguma coisa ligada à arquitetura. Um museu, talvez. Ou uma via do expresso. Alvaro Dias podia virar nome de hidrelétrica. E no caso do governador Requião teria de ser alguma coisa bem de esquerda, tipo um grêmio estudantil. Mas para Requião já se sabe que algumas homenagens jamais serão feitas:

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– nome de rodovia pedagiada;

– sede do Ministério Público do Paraná;

– fazenda experimental de transgênicos.

Mas ainda acho, mantida a atual programação, que a TV Educativa é que devia mudar de nome para homenagear o governador. O futuro dirá.

Sugestões – Aliás, como por esses dias a moda é interatividade, vamos a ela. Quem tiver sugestões pode mandar por e-mail idéias sobre a homenagem que vão receber os nossos governantes: de Lerner a Requião, de Taniguchi a Beto Richa. Se houver palpites realmente bons, a coluna promete publicar. Só não vale baixaria.

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Dica – Quem gosta de saber mais sobre as mordomias do poder público não pode deixar de acessar o site Contas Abertas. A cada fim de semana, a página, especializada em acompanhar gastos públicos, publica uma seção chamada "Carrinho de Compras". Ao invés de falar de grandes mutretas, a idéia é mostrar os pequenos ralos por onde nosso dinheiro escoa. São tevês de plasma de 42 polegadas para cá, cadeiras de luxo para lá. E todo mês há milhares de reais em atendimentos odontológicos para senadores. Vale ver: www.uol.com.br/contasabertas.

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"De tanto ver prosperar as nulidades, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."

Rui Barbosa, o presidente que o país nunca teve.