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"Com um salário desses, nem o Tio Patinhas entraria em uma fraude para ganhar algumas notas de mil", acusou o editorial do diário Gefle Dagblad, de Estocolmo. O texto tratava do deputado sueco Hakan Juholt, um liberal que em 2011 esteve prestes a virar primeiro-ministro. Não chegou em razão justamente da tal fraude. O escândalo surgiu quando se descobriu que Juholt vivia com a namorada em um apartamento em Estocolmo. Nada proibido, claro. Mas o deputado, segundo as regras, tinha de ter pedido reembolso de apenas metade do aluguel do Parlamento – e a namorada devia pagar a outra metade.

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Juholt caiu em desgraça. Um repórter perguntou a ele como aquilo podia ter ocorrido. O deputado afirmou que não sabia da regra. A próxima pergunta veio praticamente na forma de um sermão. "Você não acha lógico ter que dividir o valor do aluguel do apartamento funcional com sua companheira, uma vez que ela também mora lá?" O deputado, sem saída, capitula. "Certamente."

A história está contada em um interessante livro da repórter Cláudia Wallin (Um país sem excelências e mordomias, da editora Geração), em que ela conta como funciona o serviço público sueco. O caso dos apartamentos funcionais é um dos que mais chocam o leitor brasileiro. Até os anos 1990, os parlamentares de fora de Estocolmo dormiam em seus gabinetes (a não ser que quisessem alugar algo por conta). Hoje, têm direito a apartamentos funcionais de pouco mais de quarenta metros quadrados. Pouco maiores que as casas da Cohab curitibana.

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Neles não há máquina de lavar ou qualquer luxo. Boa parte não tem quarto: há sofá-cama. A explicação é que eles moram em suas cidades de origem, e na capital só ficam durante a semana. Os que são de Estocolmo não ganham qualquer ajuda (só em um sistema muito estranho as pessoas receberiam auxílio-moradia para morar onde já moram, certo?) e os que vêm de fora normalmente ficam em quitinetes.

Os que não ficam em apartamentos funcionais recebem até R$ 2,6 mil de reembolso (os aluguéis em Estocolmo não são os mesmos de Capitão Leônidas Marques, e a verba dá para um apartamento modesto). No caso de Juholt, ele conseguia pagar um apartamento no subúrbio. Mas nem uma "turnê do perdão" de dois meses livrou-o de ser considerado culpado pela opinião pública. O salário de um deputado, líquido, é de R$ 21 mil – cerca de 50% acima do que ganha um professor primário. Juholt ganhava mais ou menos o dobro por ser líder de seu partido.

Cláudia Wallin também fala sobre o Judiciário. Os integrantes da Suprema Corte, por exemplo, não têm direito a secretários particulares. Cuidam de sua própria agenda. E, claro, não têm direito a auxílio-moradia. Göran Lambertz, um dos ministros, deu entrevista sobre o tema. A pergunta era: "O que pensa sobre sistemas de países como o Brasil, em que políticos e juízes têm privilégios como gratificações extras e aviões à sua disposição?"

Vale transcrever a resposta: "Não consigo entender por que algum ser humano gostaria de ter tais privilégios. Só vivemos uma vez e, portanto, penso que a vida deve ser vivida com bons padrões éticos. Não posso compreender um ser humano que tenta obter privilégios com o dinheiro público. Luxo pago com o dinheiro do contribuinte é imoral e antiético. Porque significa usar recursos públicos apenas para o próprio bem".

Um juiz paranaense interessado em utilizar bem seu primeiro auxílio-moradia de R$ 3,2 mil poderia comprar cem cópias do livro, encontrado a R$ 31,90, e entregar a seus colegas de classe. Faria bom proveito do nosso dinheiro.

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