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Olho vivo

Casual 1

Esta coluna antecipou dia desses que a Câmara Municipal de Curitiba se preparava para emendar a Lei Orgânica do Município – uma espécie de constituição da cidade – para atender um caso único e muito específico. Era o caso do vereador Omar Sabbag Filho, que, nomeado para um cargo no âmbito do governo estadual, teria de renunciar ao seu mandato. A Lei Orgânica só prevê a possibilidade de licença da Câmara quando a nomeação de vereador for para ocupar postos de secretário, de ministro ou em estatais.

Casual 2

Não era o caso de Sabbag, indicado pelo governador Beto Richa para dirigir o Lactec, uma oscip – instituição não-governamental que não consta das exceções. Como, no entanto, o vereador não pretendia tomar a drástica, mas obrigatória, providência de renunciar ao mandato, apareceu o "jeitinho" – a solução mágica e casuística de mudar a lei, patrocinada pelo presidente da Câmara, João Cláudio Derosso.

Casual 3

Na última sexta-feira, o vereador Algaci Túlio, relator da emenda que inclui oscips entre os cargos que não exigem renúncia, apresentou parecer favorável. A emenda agora vai à votação em plenário e – tudo indica – terá aprovação unânime. Sabbag poderá, então, pedir licença para presidir o Lactec – cargo que já ocupa desde janeiro. Finalmente, então, o suplente Jorge Yamawaki será convocado para assumir a cadeira vaga há quase três meses.

"No Brasil, tudo dá em nada, ninguém é punido." A frase é, inevitavelmente, repetida tantas vezes quanto são as notícias que dão conta de grossas maracutaias no setor público. Aliás, quanto mais grossas, maior a descrença da opinião pública de que seus autores acabem um dia pagando por seus malfeitos. Há casos emblemáticos na história que justificam esta visão. Diante de uma pergunta à queima-roupa, quem não incluiria Paulo Maluf e o "mensalão" entre os exemplos que se tornaram clássicos da impunidade imperante?

Esse mesmo descrédito povo­ou as mentes de muitos dos que acompanharam pelas páginas desta Gazeta e dos demais veículos da RPC, a série "Diários Secretos" – reportagens invesgativas que desnudaram a antiga e vasta rede de corrupção na Assembleia Legislativa do Paraná. A série, de grande repercussão e que mereceu um Prêmio Esso, está completando um ano – período grande o bastante para que crescesse a incredulidade quanto a seus resultados.

Na sexta-feira passada, no entanto, surgiu o primeiro, concreto e mais formal passo para entregar à Justiça os fatos apurados por nossos repórteres e comprovados pelas investigações do Ministério Público Estadual. Trata-se da ação civil pública proposta pela Promo­toria de Justiça de Proteção ao Patrimônio Público de Curitiba, em que acusa dois ex-presidentes e dois ex-primeiros-secretários do Legislativo por atos de improbidade administrativa. Incursos na ação aparecem também ex-diretores e funcionários da Casa.

Falta de transparência, manipulação de dados, adulterações, falsificação de datas, informações inverídicas ou omitidas, publicação de atos com atraso injustificável, contratações irregulares, pagamentos de salários a servidores fantasmas e desvio de recursos públicos são alguns dos delitos apontados pelo Ministério Público, conforme noticiado amplamente pelo jornal nas edições de ontem e deste domingo. Farta documentação instrui a ação, que passa, agora, a tramitar no Judiciário.

Os ex-presidentes Nelson Justus e Hermas Brandão e os ex-secretários Nereu Moura e Alexandre Curi; o ex-diretor geral Abib Miguel e ex-diretores de pessoal são os principais acusados – cada qual com uma soma de responsabilidades proporcional ao eventos irregulares registrados sob sua gestão.

No que vai dar tudo isso é a pergunta que agora cabe e que deve ser dirigida à Justiça. Aceita a denúncia, passa-se ao exame das provas, ao exercício do contraditório e à defesa dos réus e a todos os demais trâmites e recursos processuais permitidos pelo burocrático e lento sistema judiciário brasileiro.

Certamente serão percorridas todas as instâncias e, com certeza, a palavra final só virá dos tribunais superiores. Quan­do? Não se sabe. Com que resultados práticos no sentido da punição dos réus contra os quais se comprovar culpa? Também não se sabe.

O que se sabe é que duas instituições cumpriram seu papel. A imprensa, por levantar e denunciar as irregularidades. O Ministério Público, por dar continuidade formal às investigações e aos procedimentos que a liturgia do estado democrático de direito exige.

Agora é esperar. E não perder a fé.

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