Olho vivo
Lavada 1
No espaço de apenas cinco dias, Ingo Hubert, o ex-secretário da Fazenda e ex-presidente da Copel no governo Jaime Lerner, lavou a alma graças a duas decisões da Justiça a seu favor. De uma delas ele é autor: processou o ex-governador Roberto Requião por tê-lo chamado de "ladrão" em cadeia de televisão. Da outra uma ação civil pública promovida pelo Ministério Público ele era réu, acusado de improbidade quando exercia os dois cargos.
Lavada 2
Em relação à primeira, tornou-se credor, ontem, de uma indenização por danos morais de R$ 25 mil, a ser paga pela pessoa física de Requião. A decisão judicial dá prazo de 15 dias para o pagamento sob pena de penhora de bens particulares caso o crédito não seja registrado. A outra tramitou na 2.ª Vara da Fazenda Pública e pedia a condenação de Ingo em razão de prejuízos que teria dado aos cofres públicos e à Copel utilizando-se de uma terceirizada, a Tradener.
Lavada 3
Esta ação foi motivada por denúncias feitas por Requião numa "escolinha" transmitida em 2003. Ao proferir, no último dia 12, a sentença favorável a Ingo Hubert e a outros réus, a juíza Luciane Pereira Ramos diz textualmente que eles "não permitiram, facilitaram ou concorreram para que terceiro se enriqueça ilicitamente; tão pouco praticaram ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições".
O advogado Caio Brandão, que na juventude se aventurou também pelos caminhos do jornalismo, foi o primeiro presidente da Sanepar no início da gestão anterior de Roberto Requião, de quem era (ou é?) amigo. Em pouco tempo descobriu que o emprego não era bom e voltou para sua Minas Gerais, onde hoje, entre outras atividades, mantém um blog inteligente especializado em mostrar o quanto é fácil fraudar licitações públicas e em analisar as relações intestinas (quase no sentido literal) entre poder econômico, políticos e governos.
Ontem, ele postou um artigo muito apropriado para este momento de campanha doações de empresas para candidatos. Do alto de sua experiência, escreveu bastante, mas os trechos seguintes são imperdíveis para quem estiver interessado em saber um pouco mais sobre "o meio lodoso e escorregadio" do financiamento privado das campanhas:
- "A doação de campanha será sempre pequena para quem a recebe e muito grande para quem a entrega. O doador, no seu imaginário, fará uma conta simples: para cada real que doar, ele vai querer receber 100 mil de volta.
- Uma empreiteira de grande porte que doar, eventualmente, por exemplo, uns 8 milhões de reais [...] vai querer tomar o controle das maiores estatais do governo e executar a maioria das obras de grande porte a serem licitadas.
- Em se tratando de pagamento de fornecedores, as vias mais comuns de crimes eleitorais passam pelo pagamento feito a gráficas (são sempre as mesmas), fornecedores de papel, locação de veículos, fretamento de aviões ou uso de aeronaves de empresas amigas e agências de publicidade.
- Campanha, afinal, se faz com muito dinheiro e o ideal é que haja sobra. Esta, quando acontece, permite que o candidato eleito passe longo período pagando contas com dinheiro vivo e declarando, para o Imposto de Renda, que possui grandes somas de dinheiro vivo, em casa.
- [...] Em meio a essas contradições, surge uma figura peculiar às campanhas políticas: a do intermediário entre o que doa e aquele que recebe. [...] O candidato estará sempre pronto a liberar aquela figura para agir em prol das crescentes demandas da campanha. E, desta forma, grandes conglomerados serão abordados por pessoas sem credibilidade e, pior, por vários e diferentes intermediários, todos com "procuração" fidedigna do candidato e mediante a promessa de vigorosos e inauditos sortilégios durante o futuro governo.
- Terminada a eleição a conta zera e a reaproximação com o eleito se transforma num "pau de sebo". De pronto, o ex-candidato viaja para o exterior. É claro que aquele feliz doador não estará no mesmo avião.
- Na volta ao Brasil o ego do eleito pode não caber no avião. Ele se enclausura para escolher o secretariado e listar, de pronto, os titulares dos cargos mais cobiçados. Dentre os escolhidos terão preferência os políticos (ele quer se reeleger), depois os parentes (mesmo com a lei do nepotismo), depois os amigos mais íntimos e finalmente os apaniguados.
- O número do telefone do eleito foi trocado a atende um imbecil que sempre pergunta ao seu interlocutor se ele pode declinar o nome e o assunto. É nesse momento que o doador começa a perceber que a conta zerou no dia em que o candidato ganhou a eleição."
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